Desde 7 de outubro, o mundo ficou pequeno para Maurice Shnaider, de 67 anos. Nascido no Peru, ele mora em Nova York e toda a sua família direta vive em Israel. Não importa onde esteja, sua vida agora se resume àqueles poucos quilômetros que separam a Faixa de Gaza do kibutz Nir Oz, onde ocorreu a maior tragédia de sua vida.
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Os terroristas do Hamas assassinaram sua irmã Margit, de 63 anos, e o marido dela Yossi, de 67. A relação de Margit com Maurice era de proximidade. Conversavam, riam, trocavam confidências até. O brutal assassinato deixou nele um vazio muito grande, conforme contou a Oeste.
“Não é a mesma coisa do que perder um pai, uma mãe, já idosos, que morrem de causas naturais e que nos deixam recordações boas”, compara ele. “Perder uma irmã dessa forma é uma dor indescritível, fica um buraco difícil de ser preenchido, um sentimento de perda repentina, violenta, injusta, sem explicação.”
Mas, mesmo esvaziado, ele teve de encontrar forças para, também pela irmã, se engajar na campanha que clama pela volta dos reféns, entre eles quatro membros da família Bibas: Shiri — filha de Margit –, o marido, Yarden, e os pequenos Ariel, de 4 anos, e Kfir, um bebê que foi levado aos 10 meses, cuja feição doce comoveu boa parte do mundo.
Em dezembro, Maurice, que é casado e tem três filhos, esteve no Brasil, com outros familiares de reféns, na busca de apoio para a sua causa. Foram dias difíceis, de palestras, perguntas, conjecturas.
O que mudou desde então?
Naquele momento, ele repetia que tinha esperanças e implorava para que houvesse maior pressão da comunidade internacional.
Hoje, diz ele, o peso daqueles dias ainda reverberam. Se surtiram efeito, ainda não foi visto. A situação no momento mudou, segundo ele, para pior.
“O que mudou desde então? Apenas reduziram o número de reféns vivos”, desabafa ele.
Maurice conta que, há pouco mais de uma semana, esteve na sede das Organizações das Nações Unidas (ONU). E, frente a frente com o secretário-geral, Antonio Guterres, lhe fez a mesma pergunta, com uma cobrança.
“Disse a ele, olhando nos olhos: o que mudou desde então, o que foi feito, que tipo de ações vocês tomaram?” Maurice, então, suspira e ele mesmo repete, com um tom de lamentação, as palavras que ouviu de Guterres.
“‘Eu entendo sua dor’, me disse ele”, conta Maurice, que prossegue. “Então Guterres foi direto: ‘Não posso fazer nada. Eu compreendo a dor de vocês, mas isso é parte do meu trabalho. O resto não tenho mais o que fazer'”. Maurice, então, dá outro suspiro. “Como um secretário-geral da ONU pode falar isso? Quais as condições de continuar com ele?”
Enquanto sua eficiência era questionada, Guterres discursou, nesta terça-feira, 24, na Assembleia-Geral da ONU, quando, em crítica a Israel, alertou para que o Líbano não se torne uma nova Gaza.
Dificuldades financeiras
Depois das viagens, Maurice iniciou, em agosto, outra vertente de sua campanha. Ele abriu um fundo para ajudar os sobrinhos em Israel, que estão sem dinheiro por se dedicarem o tempo inteiro à campanha pela volta dos reféns.
“Eles dedicam suas vidas a centenas de entrevistas com a mídia, manifestações, viagens e muito mais, ficando afastados de suas casas e famílias”, ressalta Maurice, no pedido.
“Por essas razões, um deles perdeu grande parte do trabalho e outro perdeu o emprego completamente, com quase nenhuma renda durante esses dez meses, ambos acumulando dívidas.”
A situação dos parentes se deteriorou nos últimos tempos, revela Maurice.
“Eles precisam dos fundos para pagar contas das quais estão atrasados, incluindo, mas não se limitando a, hipotecas de casas, impostos sobre propriedades, pagamentos de juros, despesas com alimentos, roupas e material escolar para todos os seus filhos.”
Em meio à intensificação da guerra contra o Hezbollah, Maurice conta que o país inteiro está abalado. A guerra está no norte e no sul. Mas a dor, neste momento, não tem fronteiras. Está presente em todos os lugares, nos bares, nos ônibus, nas sinagogas, nas escolas. Às vezes, ao som de bombardeios.
“Toda a minha família direta vive em Israel, e fui até lá”, afirma ele. “A felicidade deles não é mais a mesma. Eles se esforçam para dizer que vivem uma vida normal, mas não é verdade. Todas as famílias em Israel estão vivendo assim agora, não como gostariam.”
O que Maurice quer dizer, em outras palavras, é que, neste momento, todo o país se sente também refém. “Sim, acho que é isso”, completa.