A jovem Jéssica Vitória Canedo, de 22 anos, perdeu a vida na última sexta-feira 22 em Minas Gerais. Ela se suicidou depois de se tornar alvo de difamação da página Choquei. Com a vida pela frente, não viu alternativa, nem esperança, envolvida no lado escuro das redes sociais.
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O portal divulgou imagens de supostos diálogos amorosos entre ela e o humorista Whindersson Nunes. Não adiantou ela insistir, em desespero, pedindo que os posts fossem retirados e realçando que eles não traziam a verdade.
Situações como essa configuram crime daqueles que divulgam informações inverídicas, conforme afirma a advogada Tamara Segal, atuante em Direito Digital pós-graduada na Legale em processo civil e com curso na área de Tecnologia da Informação (TI).
“A primeira infração cometida é de natureza constitucional e ela diz respeito à dignidade da pessoa humana”, afirma a especialista, sobre a conduta de páginas como o Choquei e Garoto do Blog, que divulgaram as informações sobre Jéssica.
“Ao propagar toda sorte de fofocas sem nenhum fundamento e que, se sabe, afetarão a honra objetiva e subjetiva do indivíduo, o propagador está dando um tapa no mais precioso princípio constitucional da nação brasileira, o respeito à pessoa humana.”
Sob a ótica do Direito Penal, Segal afirma que existiram os crimes de injúria (art. 140) e de difamação (art. 139).
“Isso porque certamente as partes envolvidas se sentiram ofendidas e o fatos inverídicos foram propagados, o intuito foi o de difamar os envolvidos”, afirma a advogada.
“E sequer os responsáveis foram cuidadosos o suficiente para praticar o necessário jornalismo investigativo e ir atrás da verdade dos fatos.”
Em relação à defesa da regulamentação, no momento, ela considera que “infelizmente, as punições para estes tipos de crime são brandas.” Mas existem, ainda que em uma velocidade menor do que na esfera cível.
Ela citou como exemplo recente a decisão judicial do Tribunal de Justiça paulista contra o jornalista e influencer Breno Altman. Ela considerou a atitude da Justiça “excelente.”
Altman, que posta mensagens de cunho antissionista e vistos como ofensivos a Israel, teve suas páginas desmonetizadas.
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A justificativa foram práticas consideradas reincidentes de propagação de ódio.
“Vale lembrar que a Justiça tem o poder de determinar a exclusão de postagens sob pena de multa”, observa a jurista.
Ela considera que os tribunais superiores têm uma importante função em manter o valor das multas em um patamar alto.
“Estas multas chegam aos milhões de reais, mas encontram certa resistência nos tribunais superiores que costumam reduzi-las.”
Desembolsar quantias altas, segundo a especialista, uma maneira eficiente de diminuir a disseminação dessas informações deturpadas.
No momento atual, as cifras neste meio têm prevalecido em função do trabalho de agências de marketing de influenciadores.
Elas monopolizam a informação das redes sociais, por terem sob contratos um conjunto de personalidades e portais que atraem os principais anunciantes do país.
Nesta rede, a distribuição do conteúdo produzido por seus influenciadores é feita em forma de pirâmide.
O sucesso do casting permite que a agência promova as mesmas campanhas em diferentes lugares; um processo que retroalimenta a sua relevância, capaz de viralizar marcas, assuntos e influenciadores.
Altos valores de multas, portanto, seriam importantes para intimidar esse mercado bilionário, diz Segal.
“É a velha história. No bolso dói mais, portanto é necessário educar estes influencers na base do dinheiro.”
Velocidade das informações
Como exemplo do poder dessas informações, a advogada apresentou um estudo, do professor Geraldo Henrique Neto, especialista em Ciência da Computação.
No levantamento, Neto concluiu que a velocidade de informações publicadas no Facebook atinge 1,6 bilhão de pessoas por mês. No WhatsApp, o alcance é de 1 bilhão. No Messenger, chega a 900 milhões, enquanto no Instagram, a 400 milhões de pessoas.
“O poder de alcance das notícias é gigantesco”, alerta Segal, que acrescenta.
“Daí a necessidade de se agir com cautela e responsabilidade a cada vez que se posta alguma coisa e evitar a exposição da vida pessoal e principalmente sentimental, tópicos que mais agradam os desprovidos de senso crítico.”
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Para a advogada, esses desprovidos de senso crítico são muitos em um momento em que as redes sociais acomodaram o ímpeto de pensamento das pessoas. Segal só vê uma solução: as pessoas deixarem o comodismo de lado.
“Ao ler uma notícia, o internauta deve buscar todas as fontes possíveis para checar sua veracidade.”
Porque, os “desavisados” que compartilham as notícias difamatórias também têm responsabilidade.
“Alerto para o fato de que quem propaga fake news que geram consequências como a trágica morte desta moça, pode responder em juízo junto com aquele deu início à propagação.”