Pinceladas intensas e cores vívidas ilustram as obras do artista Eduardo Lima, 45 anos. É por meio dessas características que o ex-frentista de posto de combustível retrata a essência do Nordeste brasileiro. A paisagem campestre, a literatura de cordel e o artesanato em madeira e palha podem ser vistos — e sentidos — através dos quadros do pintor nascido na cidade de Capim Grosso, localizada a 240 quilômetros de Salvador (BA).
“Sou apaixonado pelos artistas brasileiros que retratam nossas raízes”, disse Lima. “Gosto da Tarsila do Amaral, do Candido Portinari e do Aldemir Martins. Eles sempre chamaram a minha atenção, porque tratavam de algo próximo a mim. É mais fácil compreender Portinari retratando o povo nordestino que observar a Monalisa, de Leonardo da Vinci, com cenário escuro e frio.”
A paixão pela arte é antiga. Quando pequeno, aos 12 anos, Lima gostava de ir à escola para participar das atividades artísticas. Enquanto a maioria dos meninos jogava futebol, o futuro pintor desenhava. Nas férias, o capim-grossense acompanhava o pai no trabalho. O patriarca da família era proprietário de uma olaria, em que fabricava telhas, tijolos e outros objetos de barro. “Nesse período, apaixonei-me ainda mais pela arte”, lembra.
O primeiro obstáculo na carreira do pequeno artista surgiria cedo: a pobreza. Papelões e folhetos de propagandas partidárias foram suas primeiras telas, enquanto carvões e gessos foram as primeiras tintas.
A saída: trabalhar
A necessidade financeira e a paixão pela arte motivaram Lima, na época com 18 anos, a procurar um emprego. As contas poderiam ser pagas, e as tintas e as telas profissionais poderiam ser adquiridas.
Um posto de combustível lhe ofereceu a vaga de frentista. Ele aceitou a oferta. “Usava as horas vagas para pintar”, disse Lima. “Trabalhávamos dia sim, dia não. Quando havia folga, desenhava e pintava. A ideia era apenas enfeitar as paredes da minha casa com os quadros.”
Espia, Bixin! Hoje é o dia conhecido popularmente como sexta-feira santa e o dia correspondente no calendário judaico a 14 de Nisã. Após a refeição pascal, Cristo institui a celebração ou Memorial da sua morte. Essas foram algumas das obras que pintei retratando❤️ pic.twitter.com/0yPNsImw2T
— Eduardo Lima (@eduardolimaart) April 15, 2022
E surgiu o segundo obstáculo. Isso porque os estabelecimentos de Capim Grosso não vendiam nenhum material semelhante ao usado por pintores. “Para comprar as tintas e as telas, precisávamos viajar até a cidade de Feira de Santana, localizada a 160 quilômetros de distância”, explicou. “Mas conseguimos.”
Superados os problemas, Lima pôde se dedicar à dupla jornada de trabalho — como frentista e artista. Um de seus quadros foi exposto nas paredes do mercadinho da esposa, Aparecida Rodrigues, 47. Era apenas para decoração, mas um cliente pediu para comprá-lo. O casal aceitou.
Lima pintou outro quadro e o colocou no mesmo lugar daquele que havia sido vendido. E outro cliente quis comprá-lo. O resto é história.
Missão: desbravar o sertão nordestino
Os quadros expostos no mercadinho de Aparecida fizeram sucesso. “Quando os amigos me visitavam, elogiavam as obras e queriam comprá-las”, afirmou Lima. “Isso começou a me motivar.”
Depois de nove anos, em 2004, o pintor decidiu largar o emprego como frentista. Ele queria viver da arte. “Eu poderia ser meu próprio patrão, trabalharia com pinturas”, observou. “Pedi as contas, usei o dinheiro para comprar um carro velho, enchi o porta-malas de quadros e fui desbravar o sertão nordestino — acompanhado de minha esposa.”
De lá para cá, Lima passou a exibir os quadros em praças públicas. A aventura durou até 2019, quando a pandemia de coronavírus ceifou vidas e paralisou as atividades pelo mundo.
‘O supérfluo fica para depois’
Em razão das medidas restritivas, as exposições se tornaram escassas. Mas a internet funcionou a todo vapor e Lima encontrou uma saída: “Criamos nossas contas nas redes sociais e passamos a divulgar nosso trabalho”, explicou. “O pico foi durante a pandemia, por incrível que pareça. Fiquei tenso, porque todos os setores da economia pararam. Algumas pessoas encaram a arte como algo supérfluo. Pensei: ‘Bom, meu trabalho vai ficar para depois’. As pessoas prefeririam alimentos e remédios. Fiquei desesperado.”
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Os brasileiros não abriram mão da beleza, mesmo diante dos horrores impostos pela maior crise sanitária da era moderna. Influenciadores digitais passaram a acompanhar o trabalho do artista baiano. Como resultado, Lima viu o número de seguidores no Instagram e no Twitter crescer exponencialmente.
“Invadiram meu WhatsApp”, brinca o pintor. “De 2020 para cá, houve um boom. Nessa época, criamos o projeto Raízes do Sertão Nordestino. A ideia era levar minhas obras para todas as capitais do Brasil. Escolhemos primeiramente o Distrito Federal, depois seguimos para Salvador, São Paulo e Rio de Janeiro.”
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Durante a exposição em Brasília, os representantes da Galeria Canning House London, em Londres, viram as obras de Lima e o convidaram para expor os quadros na Inglaterra. “Em 7 de maio, fui parar na capital britânica!”, celebrou o artista. “Fiquei dez dias acompanhando a amostra. Foi um sucesso. Por isso, o pessoal estendeu o convite. Irei a Paris daqui a quatro meses.”
De volta ao Brasil, Lima disse que pretende levar a cultura nordestina para outros países europeus. “Através das tintas e dos pincéis, vou mostrar meu trabalho para o mundo”, afirmou.
Parabéns ao artista Eduardo Lima e que sirva de estímulo para tantos outros que temos!