Hoje é pacífica a percepção de que Thomas Sowell é o comentarista político liberal-conservador mais eloquente e profundo ainda em atuação. Com uma mistura de sabedoria que somente o acúmulo dos anos e as experiências no debate público podem dar, aliada à profundidade intelectual que pouquíssimos ousariam contestar, temos, ao final, um dos escritores mais agudos e perspicazes na arte de analisar o mundo contemporâneo e a evolução dos erros políticos das ideologias do século XX.
No Brasil, o livro mais recente do liberal negro do Harlem, A Busca da Justiça Cósmica, é, na realidade, de 1999. Lendo-o podemos claramente compreender o que pode se denominar como “genialidade analítica” quando tratamos de política. Já em 1999, Sowell identificou o erro central da ideologia “progressista”, isto é: o anseio pelo controle total da vida dos indivíduos em busca de uma igualdade cada dia mais utópica.
Segundo Sowell, a esquerda, ao modernizar suas pautas, ao mesmo tempo que se afastava do núcleo duro do marxismo histórico, sindical, aproximou-se, cada vez mais, de um igualitarismo utópico. Ao abandonar, num primeiro instante, as ações revolucionárias autoritárias, a esquerda moderna se engajou de forma acentuada em uma proposta de reconstrução psicológica da sociedade por meio da tomada cultural dos costumes populares e da moral pública.
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Assim sendo, o que de forma substancial Sowell já havia percebido em A Busca da Justiça Cósmica é que a esquerda apenas tinha mudado o foco do controle social. Se antes o fazia por meio da ação policialesca do Estado, agora ela buscava fazê-lo por meio da dominância da moral pública, mas principalmente via mainstream.
A ideia era de gerar uma reconstrução ideológica dos costumes sociais — por meio de muita retórica e distorções da realidade — a fim de que as pautas de esquerda encontrassem pouca ou nenhuma resistência popular. No fim, a esquerda continuava em sua missão primeva, em sua tara política de controlar as ações e psiques dos indivíduos com o intuito de construir o seu reino ideológico.
Uma utopia enxergada por Sowell
O fim, o propósito desse controle mental, moral e jurídico das posturas e ações dos indivíduos, está numa concepção completamente transloucada de igualdade. Sowell percebe que o núcleo do “progressismo” esquerdista se enraíza na concepção tola de uma espécie de “igualdade cósmica”. Isto é, uma igualdade plena, irrestrita, segundo a qual cada indivíduo é adequado e/ou pré-moldado a fim de que se alinhe a uma realidade que não macule e nem ofenda ninguém individualmente ou em suas partições sociais.
Nem mesmo os padrões biológicos são regras a serem seguidas, afirma o identitarismo em suas diversas e incontáveis expressões
Trata-se de uma utopia ao estilo Thomas More. A sacada, no entanto, não é vender a igualdade nesses moldes utópicos e claramente irrealizáveis, pois, obviamente, uma igualdade forçada nesse nível sufocaria de antemão qualquer autonomia, liberdade e, até mesmo, a arte e a percepção estética identitarista, já que o identitarismo se faz justamente na concepção do rompimento de paradigmas, no ser completamente desalinhado e inconformista por natureza. Nem mesmo os padrões biológicos são regras a serem seguidas, afirma o identitarismo em suas diversas e incontáveis expressões.
Mas é aí que está a perversidade dessa ideia. Ao mesmo tempo que o “progressismo” dá suporte e até amplia o discurso inconformista, revolucionário e transgressivo ante as regras tradicionais da sociedade, ele cria novas regras sociais ainda mais restritivas e duras. A própria ideia identitarista de transgressão e inconformidade se torna a nova moral doutrinal da sociedade, moral essa que não aceita dissidentes nem contestações. A nova ortodoxia, por fim, torna-se o próprio “progressismo”.
Imagina-se então, com essa nova liturgia social absorvida e digerida pela sociedade, uma busca engajada pelo ideal da igualdade suprema, reino utópico onde supõe-se não haver mais discriminações prévias, desigualdades gestoras de pobreza e misérias — sejam materiais ou psicológicas.
Nesse reino ainda, a mínima autonomia e diferença meritocrática seria vista como transgressão e desalinhamento ante a doutrina igualitarista — ou seja, uma ditadura como quaisquer outras do século XX, só que com um marketing mais ajustado e filosoficamente fofa. Por fim, a conclusão da análise da teoria igualitarista do “progressismo” é que, apesar de se fazer na transgressão da moral ocidental tradicional, o faz não para a libertação dos indivíduos, das minorias ante as estafantes regras e tradições preconceituosas do Ocidente capitalista, o faz antes para que eles próprios criem novos dogmas e padrões igualmente ortodoxos. Não é por libertação ou igualdade, ao final, é por controle, poder de dominância. Como sempre, Maquiavel estava certo.
O alerta em A Busca da Justiça Cósmica
O alerta de Sowell em A Busca da Justiça Cósmica trata não só do duplo padrão da narrativa “progressista”, das falácias usadas para explicar a desigualdade social e a pobreza, ou até mesmo do perigo que jaz em apostar em ideologias de gabinete — ainda que todas essas leituras e análises se encontrem no livro.
Sowell nos mostra como a realidade de fato problemática da liberdade individual é infinitamente preferível ante à opção do controle externo das ações dos indivíduos
O que o autor realmente destaca é como a busca por essa igualdade cósmica pelo “progressismo” acaba matando quaisquer rastros de individualidade e autonomia humana, massificando o homem em uma percepção completamente limitada de mundo, tirando de sua verve humana aquilo que é de mais natural: a capacidade ímpar de gerenciar a própria existência apesar das irreparáveis aporias que a liberdade traz em sua própria constituição. Por fim, Sowell nos mostra como a realidade de fato problemática da liberdade individual é infinitamente preferível ante à opção do controle externo das ações dos indivíduos, da massificação compulsória da autonomia humana por meio de uma ideologia autoritária.
Em 171 páginas, divididas didaticamente em quatro grandes capítulos, Thomas Sowell, de forma brilhante, consegue desmontar peça por peça a narrativa sedutora do “estado de bem-estar social” que muitos, da ONU ao PSOL, defendem com gana e ferocidade política. Desnuda com rara felicidade o mal real que está por detrás das faces benignas da tolerância woke e do igualitarismo “progressista“. A Busca da Justiça Cósmica é um livro que vale a pena ser lido como antídoto. Escrito em 1999, mas tão atual que parece ter saído das penas do liberal americano ontem à tarde.
Ou seja, Olavo sempre teve razão.
SE, POR MALDIÇÃO, A HUMANIDADE CHEGAR À IGUALDADE ABSOLUTA E IRRESTRITA CHEGARÁ TAMBÉM À
IMBECILIDADE ABSOLUTA, À PAZ DOS CEMITÉRIOS!
Excelente texto que vale muito mais do que a grande maioria das infindáveis discussões infrutíferas que nos rondam incansavelmente por aí.
Deu certo depois da segunda publicaram a primeira.
A natureza já concluiu que errou nessa nova espécie chamada humana. Só que deixou sua destruição a cargo dela mesma e, irá assistir de camarote o surgimento de um novo experimento, torcendo para que desta vez dê certo.
Igualdade Suprema, seria renunciar a inteligencia e aceitar um mundo de trevas.
Mais esta para publicarem a primeira.
Excelente análise.
Continuem também a divulgar pessoas e livros como desse artigo.
Parabéns!