Em primeiro lugar, o elogio: a roteirista/diretora de A Substância (2024), Coralie Fargeat tem estilo. Ela não depende de diálogos. A cena, logo no início, contando a história de Elizabeth (Demi Moore) através de sua estrela na calçada da fama de Hollywood é uma grande sacada visual. O filme está cheio de vinhetas muito bem sacadas. Um acidente de carro impressiona pelo realismo.
Mas Substância pretende ser um filme “de mensagem”, e aí revela toda a sua artificialidade. A mensagem: para satisfazer os desejos eróticos dos homens, as mulheres não aceitam o envelhecimento e se degradam até se transformarem em monstros. Todos os personagens masculinos do filme são perfeitos cretinos, e nenhum é pior que o produtor Harvey (Dennis Quaid), uma caricatura de cafajeste levado ao extremo do grotesco.
Elizabeth é uma atriz em decadência que tem um programa de fitness numa emissora de TV. Harvey a demite por estar “muito velha”, aos 50 anos. A atriz decide experimentar a misteriosa substância do título e se divide em duas – ela mesma e uma versão jovem chamada Sue (Margaret Qualley). Quando uma está em ação, a outra “apaga”. Claro que não podia dar certo.

O filme mostra a luta entre as duas personalidades, e a transformação de Elizabeth em um monstro indescritível. É um festival de seringas penetrando na coluna vertebral, feridas purulentas, peles em degeneração, imensas cicatrizes, sangue aos litros, pedaços de corpo caindo etc. A propria diretora reconheceu que uma de suas inspirações foi o filme A Mosca, dirigido por David Cronenberg em 1986. Cronenberg é um especialista em degenerações corporais. Mas em A Mosca torcemos pelo personagem de Jeff Goldblum, que se torna um monstro triste, vítima de uma tragédia.
Os personagens de A Substância são todos caricaturas vazias num ambiente de degradação. Demi Moore faz todo o possível para mostrar seu talento, mas não existe um envolvimento com a personagem. Os corpos nus das atrizes principais são explorados de forma quase pornográfica, mas o carimbo de “feminista” libera a diretora para fazer o que quiser e levar a longa produção (com 2 horas e 21 minutos) a um final grandioso sem qualquer lógica. O fato do filme ter sido indicado a cinco Oscars revela o estado em que se encontra essa premiação.