Em 5 de novembro deste ano, cerca de 240 milhões de norte-americanos irão às urnas para escolher seu próximo presidente. Porém, apenas um número relativamente pequeno deles decidirá os rumos do país.
No sistema eleitoral norte-americano, alguns Estados têm um papel desproporcional na decisão das eleições: são os Estados-pêndulo. Como o nome sugere, eles são um pequeno grupo que oscila entre candidatos democratas e republicanos, dependendo da eleição.
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Para entender sua importância, primeiro é preciso compreender como funcionam as eleições nos Estados Unidos. Na política norte-americana, as eleições presidenciais são decididas por um sistema de votação ponderado, conhecido como colégio eleitoral, e não pelo voto popular.
Cada um dos 50 Estados dos EUA recebe um certo número de votos no Colégio Eleitoral, proporcional ao tamanho de sua população. Um candidato presidencial precisa garantir 270 eleitores para vencer. Como a maioria dos Estados vota consistentemente em um partido ou outro, um pequeno número de Estados-pêndulo pode determinar a vitória ou a derrota.
Saiba quais são os Estados-pêndulo dos EUA
Neste ano, os Estados-pêndulo mais observados são Arizona, Carolina do Norte, Geórgia, Michigan, Nevada, Pensilvânia e Wisconsin. Na eleição presidencial de 2020, esses sete Estados foram conquistados por 3 pontos porcentuais ou menos.
Uma das características principais de um Estado-pêndulo é sua inclinação política imprevisível, e, por isso, Estados dos EUA que já foram disputados podem tender a um partido ou outro.
A Flórida, por exemplo, foi considerada um Estado-pêndulo dos anos 1990 até 2020, mas agora é vista como de maioria republicana. “A Carolina do Norte não era considerada um Estado-pêndulo no início desta corrida eleitoral”, observa o professor doutor Roberto Moll Neto, que leciona história da América na Universidade Federal Fluminense (UFF).
Em virtude de seu potencial de serem conquistados por qualquer um dos candidatos, os dois partidos frequentemente dedicam uma quantidade desproporcional de tempo e recursos para ganhar nesses Estados.
Arizona
Biden alcançou a Presidência em 2020 com o apoio do Estado do Grand Canyon, que votou no Partido Democrata pela primeira vez desde a década de 1990. O Arizona faz fronteira com o México por centenas de quilômetros e, por isso, se tornou um ponto central do debate sobre imigração ilegal nos EUA.
“Os latinos são, aproximadamente, 30% da população do Estado e aproximadamente 24% dos cidadãos aptos a votar”, diz Moll.
O Arizona também foi palco de uma disputa sobre o acesso ao aborto, depois que os republicanos do Estado tentaram restabelecer uma proibição quase total de 160 anos à interrupção da gravidez. O tema se tornou ainda mais polarizador em 2022, quando a Suprema Corte anulou uma decisão histórica que dava às mulheres o “direito constitucional ao aborto”.
Carolina do Norte
As pesquisas demonstraram um maior equilíbrio na Carolina do Norte desde que Kamala Harris assumiu a campanha democrata. O Estado foi escolhido por Trump para a realização de seu primeiro comício ao ar livre, depois da tentativa de assassinato que sofreu em julho.
Trump venceu na Carolina do Norte, em 2020, por pouco mais de 70 mil votos, o que aumentou as esperanças dos democratas de que este Estado possa ser conquistado neste ano.
Desde a eleição de 2020, a Carolina do Norte ganhou quase 400 mil habitantes — a maior parte vinda de outros Estados, mas também imigrantes hispânicos. Os novos moradores são principalmente estudantes e profissionais atraídos pelo chamado “triângulo da pesquisa”, uma área que concentra universidades, startups e empresas de tecnologia.
Geórgia
O Estado dos pêssegos foi epicentro da alegação de Trump sobre a suposta fraude nas urnas em 2020, visando a anular a vitória de Biden naquele ano. O republicano alega que venceu “por 400 mil votos, pelo menos”, segundo um telefonema grampeado pela Justiça norte-americana. As falas levaram Trump a enfrentar uma de suas quatro acusações criminais.
A contagem oficial bem como as recontagens posteriores contabilizam que Biden o venceu por pouco mais de 10 mil votos. O parecer foi endossado pelo governador e pelo secretário de Estado da Geórgia, correligionários de Trump.
Um terço da população da Geórgia é afro-americana, uma das maiores proporções de negros no país, e acredita-se que esse grupo tenha sido fundamental para Biden conquistar o Estado em 2020. No entanto, vem crescendo o apoio da comunidade negra a Trump, que pode virar o jogo.
Michigan
O Estado dos Grandes Lagos escolheu o candidato presidencial vencedor nas últimas duas eleições, tendo votado em Trump, em 2016, e em Biden, em 2020. No entanto, Michigan demonstrou independência ao liderar uma campanha nacional contra o presidente.
Durante as primárias democratas no Estado, em fevereiro, mais de 100 mil eleitores votaram em branco como forma de protesto contra o apoio militar de Biden a Israel na guerra contra o Hamas.
Michigan é o Estado com a maior proporção de árabe-americanos no país, muitos deles vindos da Palestina. Recentemente, Kamala endureceu o tom em relação a Israel, indicando um aceno a essa população. “A comunidade de eleitores árabes pode ser determinante em um pleito acirrado”, considera o docente da UFF.
Nevada
O Estado da prata vota nos democratas há várias eleições, mas há sinais de uma possível virada pelos republicanos. Segundo pesquisas elaboradas pelo instituto 538, Trump levava uma grande vantagem sobre Biden, mas essa diferença diminuiu desde que Kamala assumiu a campanha.
Ambos os candidatos lutam para conquistar a população latina do Estado. Somente os descendentes de imigrantes mexicanos representam 20% de Nevada, famoso pelos seus cassinos na cidade de Las Vegas.
Pensilvânia
Ambos os lados têm feito campanha incansavelmente no Keystone State, onde Donald Trump sobreviveu à tentativa de assassinato. O Estado foi decisivo na eleição de 2020, apoiando Biden, que nasceu no interior do Estado.
A economia é o principal foco na Pensilvânia, onde os preços dos alimentos subiram mais rápido do que em qualquer outro Estado norte-americano, segundo o provedor de inteligência de mercado Datasembly.
Wisconsin
O Estado de Wisconsin também escolheu o candidato presidencial vencedor em 2016 e 2020, com uma margem de pouco mais de 20 mil votos em ambas as vezes. O Estado do texugo tem uma forte produção agropecuária e é o maior produtor nacional de queijo e manteiga do país. Trump afirmou que, se vencer Wisconsin, vencerá “tudo”.
Historicamente, Wisconsin se destaca como o berço do “progressismo” no modelo norte-americano. Foi o primeiro Estado a adotar direitos trabalhistas, reformas econômicas, sociais e educacionais e a abolição da pena de morte.
Cinturão da ferrugem em destaque
A economia, principalmente inflação e emprego, é um tema central na Pensilvânia, em Wisconsin e Michigan. Esses Estados se localizam no chamado Rust Belt, ou cinturão da ferrugem.
Esta era a região industrial mais importante nos EUA até os anos 1970, quando as indústrias optaram por se transferir para “regiões de mão de obra mais barata, em Estados do Sul, no México e na América Central e na Ásia”, explica o professor.
Especificamente na Pensilvânia, também preocupa a queda na produção de carvão e na exploração de petróleo e seus derivados, segundo Moll, resultado “da busca por energia mais limpa, da concorrência de regiões com exploração mais barata e do crescimento de regulações ambientais e de acesso a terras indígenas”.
Tanto Harris quanto Trump têm feito campanhas intensas nos Estados-pêndulo, os sete que decidem por 50. “Não é interessante investir em Estados em que o candidato adversário está consolidado”, concluiu Moll.
Troca de Biden por Kamala Harris causou mudanças
Segundo o professor, Kamala tem conseguido mobilizar eleitores para votar no Partido Democrata melhor do que Biden. “Isso está evidente nas últimas pesquisas”, que dão uma leve vantagem a Kamala no cenário nacional e em quatro Estados-pêndulo: Michigan, Pensilvânia, Wisconsin e Nevada.
Kamala tem mais aprovação entre os eleitores jovens, mulheres e minorias raciais, “que consideravam Biden muito ligado à política tradicional e elitista do Partido Democrata”, avalia o docente.
No entanto, ainda há desconfiança desse público diante do apoio político e econômico a Israel e à Ucrânia, da falta de clareza quanto às medidas de controle de armas e, principalmente, da economia.
“Esses eleitores, embora não votem no Trump, também não sentem que Kamala Harris atende aos seus anseios”, analisa Moll. “Por isso, ela precisa mobilizar o voto, já que, nos EUA, votar não é obrigatório.”
Leia também: “Um democrata e um republicano unidos pelos EUA”, artigo de Ana Paula Henkel publicado na Edição 233 da Revista Oeste