Durante seu depoimento à CPMI do 8 de Janeiro, o general Gustavo Henrique Dutra Menezes, ex-chefe do Comando Militar do Planalto, negou ter impedido o desmonte do acampamento que acontecia em frente ao quartel-general em Brasília. A oitiva do general acontece nesta quinta-feira, 14.
“Em nenhum momento impedimos a desmobilização dos acampamentos”, disse Dutra. “Trabalhamos com os órgãos de segurança pública em conjunto. O acampamento estava diminuindo, mas, sem a retirada das estruturas, a fotografia não mudava. Não houve nenhuma prisão em flagrante por parte do Exército.”
Conforme o general, o Exército não poderia atuar sem “uma ordem” nem dizer se as reivindicações dos manifestantes eram legais ou ilegais. Dutra ainda confirmou a presença de militares da reserva nos acampamentos, pois eles teriam tirado fotos.
Em relação às faixas e aos pedidos dos manifestantes para uma intervenção militar, o general explicou que tudo isso foi “impedido o tempo todo” por parte dos soldados.
O ex-chefe do Comando Militar também negou ter recebido qualquer informação do Centro e Inteligência do Exército que tratava de perfis supostamente extremistas que estavam nos acampamentos. Além disso, que o CMP não estava nos grupos de avisos da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
Contudo, explicou que, dias antes dos ataques do 8 de janeiro, havia cerca de 200 pessoas em frente ao quartel em Brasília, mas que a maioria estava em situações “vulneráveis”.
Dutra é acusado por membros da cúpula da Polícia Militar do Distrito Federal (PM-DF) — como o coronel Jorge Naime, ex-comandante do DOP-DF, e a coronel Cíntia, da PM-DF — de impedir a ação da polícia nos acampamentos.
Até mesmo o então secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Torres, relatou que a área dos acampamentos era comandada pelo Exército e que, por isso, as forças de segurança do DF não poderiam atuar, sem que a operação fosse realizada em conjunto.
À CPMI e CPI do DF, Naime explicou que disponibilizou tropas da PM e servidores do DF Legal a Dutra e que, ao entrar nos acampamentos, eles foram “achincalhados e expulsos”. “Saíram de lá falando que foram expulsos pelo Exército”, contou Naime à época.
“Não poderíamos entrar [nos acampamentos] para cumprir mandados de prisão”, disse Naime. “A própria Polícia Federal já foi expulsa. Se meus agentes fossem identificados no acampamento, não sei o que poderia acontecer.”
Chefe do Comando Militar diz que acampamento era ‘pacífico’
Dutra ainda disse à CPMI que o acampamento era pacífico e que nenhuma instituição declarou o movimento ilegal. Contudo, o depoimento de Naime contradiz a percepção do general sobre o acampamento.
Em 28 de dezembro, conforme Naime, ele se encontrou com o general Dutra. O assunto do encontro, que contou com a participação de outros órgãos de inteligência, era uma operação para desmobilizar o acampamento em frente ao quartel.
“Havia informes da Polícia Civil sobre ocorrências nos acampamentos, de vendas ilegais de ambulantes, de denúncias de abusos sexuais etc.”, disse. “Em 29 de dezembro, coloquei à disposição das Forças Armadas mais de 300 agentes para desmobilizar o conglomerado. Se eu falo para o general que consigo desmobilizar, é porque eu consigo. Era para desmobilizarmos todas as barracas de ambulantes, e a cozinha que estava alimentando os manifestantes.”
A tentativa de Naime para desmobilizar o acampamento foi frustrada. Dutra teria dito a ele que a operação não iria acontecer. “Ele até me disse que eu trouxe efetivos demais”, declarou. “Fomos impedidos e não conseguimos desmobilizar nada. A PM ficou com um descrédito muito grande. Fomos impedidos pelo Exército Brasileiro.”O general Dutra assumiu o CMP em 8 de abril de 2022.
Dutra conversou com Lula na noite do 8 de janeiro
Ao colegiado, o general explicou que, depois dos ataques na Praça dos Três Poderes, ligou para o então ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Gonçalves Dias, para pedir que a desmobilização no acampamento, determinada pelo então interventor federal, Ricardo Cappelli, fosse realizada apenas na manhã da segunda-feira 9.
“G. Dias me disse que estava com o presidente Lula e explicou que conversaria com ele”, contou Dutra. “Ele me ligou depois, dizendo que o presidente estava muito bravo”. O então ministro teria dito que, portanto, que o desmonte do acampamento aconteceria na noite do domingo 8.
“Insisti e ele passou o telefone para que eu falasse com o presidente”, continuou Dutra. “Expliquei ao presidente que, até o momento, o lamento era devido à depredação, mas que se a desmobilização acontecesse naquela noite, poderiam acontecer mortes. O presidente concordou.”
Na manhã da segunda-feira, os policiais desmobilizaram o acampamento e levaram os manifestantes presos em ônibus até a Academia da Polícia Federal.