Deltan Dallagnol*
A decisão do STF desta quinta-feira, 15, expõe uma face de um sistema de justiça criminal disfuncional: se o caso do ex-presidente Lula tivesse tramitado em Brasília, teria sido anulado também. Ou seja, o desenho do sistema brasileiro o torna um jogo de perde-perde para a sociedade. Explico:
No caso Lula, o STJ entendeu que a Justiça Federal em Curitiba deveria julgar o caso. Ou seja, se o caso tivesse tramitado em Brasília, o STJ teria anulado o caso em habeas corpus, em decisão contra a qual não caberia recurso (concessão de HC é irrecorrível).
Se isso ocorresse, em seguida, o caso tramitaria em Curitiba e seria novamente questionado nas instâncias superiores. Sabemos o que sucederia: chegando ao STF, este remeteria o caso de novo para Brasília, anulando mais uma vez a condenação.
Resumo: se correr o bicho pega; se ficar o bicho come. Não havia como desenvolver um processo que não fosse anulado, o que favorece a prescrição e a impunidade. Isso mostra que o sistema de justiça é extremamente irracional, para a frustração de quem busca justiça no país da corrupção.
Um complicador: em casos complexos, como os de corrupção e lavagem de dinheiro, os fatos são praticados usualmente em diferentes lugares. Isso permite construir argumentos que justificam a competência de diferentes locais ou mesmo diferentes ramos de justiça.
A razoabilidade de argumentos contrários sobre a “competência” (local do caso), somado ao fato de que temos três (e não duas) instâncias revisoras, sem possibilidade de recorrer contra a decisão favorável à defesa em HC, aumenta exponencialmente anulações com base na competência.
Isso mesmo. Nosso raciocínio envolveu a anulação por conta da discordância de dois tribunais. Um terceiro, o Tribunal de Apelação, poderia inserir um terceiro ciclo de anulação do processo nessa história. Veja-se que hoje houve quem cogitou que a competência é de SP e não BSB.
Essas anulações, por sua vez, aumentam exponencialmente as chances de prescrição, ou seja, de completa impunidade. O campo da disputa processual é desnivelado em favor daqueles acusados de cometer crimes, especialmente complexos.
A irracionalidade desse sistema, que privilegia a insegurança jurídica, é ampliada pelo fato de que o que assegura a justiça do julgamento não é na verdade o lugar territorial em que ele acontece, mas o embasamento da decisão nos fatos, nas provas e na lei.
Assim, o apego a argumentos técnicos sobre competência territorial, que sempre podem ser formulados em diferentes direções, gira a roda de um sistema irracional que favorece a impunidade e desfavorece a justiça.
(*Procurador da República, ex-coordenador da força-tarefa da Lava Jato do Ministério Público Federal no Paraná)
SISTEMA LAMENTAVELMENTE MONTADO PARA QUE OS ESPERTALHÕES DE PLANTÃO POSSAM SE DAR BEM NA VIDA!!!
Continua lutando, Dallagnol !
O país precisa de ti.
Parabéns, Dallagnol, pelo excelente trabalho junto à Lava Jato. Você é um procurador jovem, brilhante, e tem muito a oferecer ao nosso sofrido Brasil. Não desanime!!!
Existe num livro de ficção da área de ciências sociais e jurídicas de que um certo processo de uma certa cooperativa habitacional foi transportado de SP para Curitiba em decisão irrecorrível e com as bênçãos de diversos recursos julgados em instâncias superiores. Sei lá, mas passei aqui só para lembrar.
Nem li dalagnol!!!
Não precisamos de mais desmandos para tomar posições!!!
Obrigado pelo empenho e patriotismo.
Saúde e paz a vcs do bem!!!
Vcs nunca ficarão sozinhos frente aos fariseus!!!