(J. R. Guzzo, publicado no jornal Gazeta do Povo em 24 de junho de 2021)
Imagine um pouco como a sua vida estaria sendo desconfortável se 25% de todos os seus colegas de trabalho — um em cada quatro, ou seja, gente que não acaba mais — ou de seus familiares, ou de seus amigos, ou de seus vizinhos, tivessem problemas com a justiça penal. Ficaria difícil para qualquer um, não é mesmo? Mas é isso, exatamente isso, o que acontece com o Senado Federal. Nada menos do que 21 senadores num total de 81, segundo levantamento recente do jornal O Estado de S. Paulo, estão enrolados com o Código Penal Brasileiro. Mais que isso, só na penitenciária.
É pior do que se pensa. Os colegas, familiares etc. etc. sempre correm algum risco de se complicarem com a justiça — pelo menos isso. Os senadores processados por atividades criminosas não correm o menor perigo de ser incomodados por ninguém; todos eles contam com a incomparável proteção das “imunidades parlamentares” para fugir da lei. Um senador, inclusive, já está condenado por crime de peculato; um outro, o recordista, responde a dezessete (17) ações penais diferentes, a começar por fraude na coleta de lixo. Vivem na mais completa paz dos justos.
Os senadores esfregam na sua cara, além disso, um detalhe especialmente insultuoso: é você quem paga, com os impostos que lhe arrancam todas as vezes que acende a luz de casa ou põe gasolina no tanque, cada tostão que eles consomem. Só de despesas pessoais — salários, benefícios, funcionários de seus gabinetes, plano médico cinco estrelas, pelo resto da vida e incluindo a família toda — cada um lhe custa cerca de 7 milhões de reais ao ano. Qual o executivo de multinacional que vale essa barbaridade? Ao todo, são 600 milhões de janeiro a janeiro — e isso não incluiu o grosso das despesas, que vão dos milhares de funcionários a alucinações como a gráfica do Senado, e que no total beiram os 5 bilhões de reais por ano. O Congresso Nacional, ao todo, está custando para lá de 11 bi.
São essas as figuras que vão apreciar — e aprovar — a nova “Lei da Improbidade” que a Câmara acaba de aprovar. Os deputados, cuja situação do ponto de vista criminal não é muito diferente, já fizeram a sua parte, é claro: o texto que aprovaram torna o combate à corrupção ainda mais difícil do que é agora. Pois é. Com a lei do jeito que está, já é praticamente impossível condenar um deputado ou senador à uma multa de 2 reais. Mas a politicalha não está satisfeita. Quer tolerância zero com qualquer tentativa de objeção à roubalheira — e é isso o que vai conseguir com a nova lei. Por que não? As quatro ações penais contra Lula foram extintas pelo Supremo Tribunal Federal, sem que os ministros examinassem uma única prova. Para completar o serviço, o STF declarou que o culpado é o juiz Sergio Moro.
Do extremo PT ao extremo governo, sem exceção, a esquerda, a direita e o centro votaram a favor da nova Lei da Impunidade. Nada se aprova com tanta facilidade e tanto entusiasmo, no Brasil de hoje, quanto leis de incentivo à ladroagem. Senadores, deputados e o resto do mundo político só têm a ganhar.
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Talvez seja importante salientar nessa reportagem que o único partido que votou totalmente contra foi o Novo. Precisamos de mais pessoas assim no congresso.
Prezado LUCAS
É verdade. Faltou mencionar a posição contrária do Partido Novo.
Observação registrada.
G.
Que desanimo bate, ao ler e refletir que temos um país tão maravilhoso, temos que conviver ou melhor viver nessa maquina cruel e assassina.
Acreditem, a questão não está na lei mas sim em quem a utiliza. A tecnocracia ocupa lugar de honra e impede que os culpados sejam punidos (o autor propõe a ação de improbidade, consegue a medida cautelar de indisponibilidade de bens ou outra que requer e abandona a celeridade e a eficiência). O processo fica décadas esperando instrução e os despachos protelatórios vão se acumulando. Por outro lado a lei como está só serve para alcançar os desafetos políticos que transformam o debate político em pendengas judiciais e que contam com a dificuldade de provar o dolo (que exige muito trabalho e técnica) e com a imperícia do titular da ação. Este via de regra desconhece o tema de direito administrativo (geralmente licitações) que lhe é levado e se satisfaz com ilações para acusar o “ímprobo”. É assim, que lá no final, o réu acaba absolvido.
O TSE que só existe por aqui não pode acabar.
Sem estrutura não se constroem uma grande América comunista.
Desanimadora esta impunidade paralamentar
Sem exceção? E o partido NOVO votou como?
Prezado Belmonte
É verdade. O Partido Novo votou contra.
Desculpe a falha.
Abs