(J.R. Guzzo, publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 11 de dezembro de 2022)
O anúncio dos nomes dos ministros que vão formar o governo Lula deveria lembrar, em circunstâncias normais, a formação de uma equipe de trabalho. Não está sendo assim. Parece, muito mais, uma partilha de bens arrecadados — os trilhões de reais, na soma total, dos recursos que estarão à disposição de Lula, do PT e do vasto bonde formado em volta deles a partir de 1º de janeiro de 2023, e por pelo menos quatro anos.
É dinheiro que não acaba mais. Foi-se o tempo em que o Brasil era um paiseco indigente, desses que vivem pedindo esmola ao FMI ou aos “banqueiros internacionais”, e onde o governo não consegue comprar um rolo de esparadrapo. Hoje, só de impostos federais, são R$ 2 trilhões — é o que foi arrecadado em 2022.
Some-se a isso os caixas hoje bilionários das empresas estatais, que nunca tiveram tanto lucro como nos últimos quatro anos, mais reservas internacionais em divisas que estão acima de US$ 320 bi, mais isso e mais aquilo — e dá para se ter uma ideia do que vale, hoje, ter a chave do Erário deste país. É muito compreensível, ao mesmo tempo, o monumental esforço que foi feito para se chegar a ela.
Um mês e meio depois das eleições, o governo Lula não apresentou a mais remota ideia do que poderia ser um plano de governo; também não disse nada durante a campanha eleitoral. No máximo, aqui e ali, foram expostos desejos vagos de adotar “políticas sociais”, de investir na “educação”, na “saúde” e na “cultura” ou de fazer do Brasil “um país feliz”.
Fala-se em índio, e em Ministério do Índio. Não há o menor risco de nada disso resultar em algum benefício real para a população. Lula e o seu entorno, do seu lado, não têm nenhum interesse sério nessas coisas — o olho de todo mundo está fixado neste imenso pernil que daqui a pouco vai para mesa.
“Políticas sociais”, etc., são apenas a senha para se entrar no sistema onde aquela montanha toda de dinheiro está à espera das canetas que vão determinar quem leva quanto, onde e como. A fome é tanta que nem os trilhões que estão aí foram suficientes. O primeiro ato concreto de Lula, assim que o TSE declarou que ele ganhara as eleições, foi exigir mais dinheiro — nem chegou a entrar no Palácio do Planalto, mas já arrancou do pagador de impostos (é ele que paga, sempre; nunca é “o Congresso”) R$ 170 bilhões para gastar a mais do que a lei permite. Imagine-se, então, depois que o seu governo começar.
Tudo isso, mais a determinação de destruir todos os mecanismos que foram postos em funcionamento para estabilizar a economia, passa hoje por virtude. É “capacidade de articulação política”, dizem.
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