O presidente Lula vetou parcialmente, nesta sexta-feira, 20, o projeto de lei do Congresso Nacional que determinava a Constituição como marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Oeste confirmou a informação.
Lula sancionou parte da proposta, depois de se reunir, no Palácio da Alvorada, com os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Jorge Messias (Advocacia-Geral da União) e Sônia Guajajara (Povos Indígenas).
“Tudo que significava ataque aos povos indígenas foi vetado pelo presidente da República”, disse Padilha. “Aquilo que confrontava a Constituição foi vetado pelo presidente.”
Agora, o Parlamento vai analisar os vetos. Esses trechos podem ser restabelecidos, se o Congresso decidir.
Vetei hoje vários artigos do Projeto de Lei 2903/2023, ao lado da ministra @GuajajaraSonia e dos ministros @padilhando e @jorgemessiasagu, de acordo com a decisão do Supremo sobre o tema. Vamos dialogar e seguir trabalhando para que tenhamos, como temos hoje, segurança jurídica e… pic.twitter.com/iZqrKUytcT
— Lula (@LulaOficial) October 20, 2023
O que Lula vetou do marco temporal
A seguir, os seguintes trechos barrados:
Art. 4º São terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas brasileiros aquelas que, na data da promulgação da Constituição Federal, eram, simultaneamente:
I – habitadas por eles em caráter permanente; II – utilizadas para suas atividades produtivas; III – imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar; IV – necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
§ 1º A comprovação dos requisitos a que se refere o caput deste artigo será devidamente fundamentada e baseada em critérios objetivos.
§ 2º A ausência da comunidade indígena em 5 de outubro de 1988 na área pretendida descaracteriza o seu Avulso do PL 2903/2023 [3 de 16] 3 enquadramento no inciso I do caput deste artigo, salvo o caso de renitente esbulho devidamente comprovado.
§ 3º Para os fins desta Lei, considera-se renitente esbulho o efetivo conflito possessório, iniciado no passado e persistente até o marco demarcatório temporal da data de promulgação da Constituição Federal, materializado por circunstâncias de fato ou por controvérsia possessória judicializada.
§ 4º A cessação da posse indígena ocorrida anteriormente a 5 de outubro de 1988, independentemente da causa, inviabiliza o reconhecimento da área como tradicionalmente ocupada, salvo o disposto no § 3º deste artigo.
§ 7º As informações orais porventura reproduzidas ou mencionadas no procedimento demarcatório somente terão efeitos probatórios quando fornecidas em audiências públicas, ou registradas eletronicamente em áudio e vídeo, com a devida transcrição em vernáculo.
Art. 5º A demarcação contará obrigatoriamente com a participação dos Estados e dos Municípios em que se localize a área pretendida, bem como de todas as comunidades diretamente interessadas, franqueada a manifestação de interessados e de entidades da sociedade civil desde o início do processo administrativo demarcatório, a partir da reivindicação das comunidades indígenas.
Art. 6º Aos interessados na demarcação serão assegurados, em todas as suas fases, inclusive nos estudos preliminares, o contraditório e a ampla defesa, e será obrigatória a sua intimação desde o início do procedimento, bem como permitida a indicação de peritos auxiliares.
Art. 9º Antes de concluído o procedimento demarcatório e de indenizadas as benfeitorias de boa-fé, nos termos do § 6º do art. 231 da Constituição Federal, não haverá qualquer limitação de uso e gozo aos não indígenas que exerçam posse sobre a área, garantida a sua permanência na área objeto de demarcação. § 1º Consideram-se de boa-fé as benfeitorias realizadas pelos ocupantes até que seja concluído o procedimento demarcatório. § 2º A indenização das benfeitorias deve ocorrer após a comprovação e a avaliação realizada em vistoria do órgão federal competente.
Art. 10. Aplica-se aos antropólogos, aos peritos e a outros profissionais especializados, nomeados pelo poder público, cujos trabalhos fundamentem a demarcação, o disposto no art. 148 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).
Art. 11. Verificada a existência de justo título de propriedade ou de posse em área considerada necessária à reprodução sociocultural da comunidade indígena, a desocupação da área será indenizável, em razão do erro do Estado, nos termos do § 6º do art. 37 da Constituição Federal.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo às posses legítimas, cuja concessão pelo Estado possa ser documentalmente comprovada.
Art. 13. É vedada a ampliação de terras indígenas já demarcadas. Avulso do PL 2903/2023 [6 de 16] 6
Art. 14. Os processos administrativos de demarcação de terras indígenas ainda não concluídos serão adequados ao disposto nesta
Lei. Art. 15. É nula a demarcação que não atenda aos preceitos estabelecidos nesta Lei.
Do artigo 16, foi vetado o parágrafo 4:
§ 4º Caso, em razão da alteração dos traços culturais da comunidade indígena ou de outros fatores ocasionados pelo decurso do tempo, seja verificado que a área indígena reservada não é essencial para o cumprimento da finalidade mencionada no caput deste artigo, poderá a União:
I – retomá-la, dando-lhe outra destinação de interesse público ou social;
II – destiná-la ao Programa Nacional de Reforma Agrária, atribuindo-se os lotes preferencialmente a indígenas que tenham aptidão agrícola e assim o desejarem.
Art. 18. São consideradas áreas indígenas adquiridas as havidas pela comunidade indígena mediante qualquer forma de aquisição permitida pela legislação civil, tal como a compra e venda ou a doação. § 1º Aplica-se às áreas indígenas adquiridas o regime jurídico da propriedade privada.
§ 2º As terras de domínio indígena constituídas nos termos da Lei nº 6.001, de 19 dezembro de 1973, serão consideradas áreas indígenas adquiridas nos moldes desta Lei.
Do artigo 20, vetado parágrafo único:
Parágrafo único. A instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou ao órgão indigenista federal competente.
Art. 21. Fica assegurada a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal em área indígena, no âmbito de suas atribuições, independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou ao órgão indigenista federal competente.
Art. 22. Ao poder público é permitida a instalação em terras indígenas de equipamentos, de redes de comunicação, de estradas e de vias de transporte, além das construções necessárias à prestação de serviços públicos, especialmente os de saúde e educação.
Art. 23. O usufruto dos indígenas em terras indígenas superpostas a unidades de conservação fica sob a responsabilidade do órgão federal gestor das áreas protegidas, observada a compatibilidade do respectivo regime de proteção.
§ 1º O órgão federal gestor responderá pela administração das áreas das unidades de conservação superpostas a terras indígenas, com a participação das comunidades indígenas, que deverão ser ouvidas, considerados os seus usos, tradições e costumes, e poderá, para tanto, contar com a consultoria do órgão indigenista federal competente.
§ 2º O trânsito de visitantes e pesquisadores não indígenas deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação, nos horários e condições estipulados pelo órgão federal gestor.
Do artigo 24, vetado parágrafo 3:
§ 3º O ingresso, o trânsito e a permanência de não indígenas não podem ser objeto de cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza por parte das comunidades indígenas.
Art. 25. São vedadas a cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza ou a troca pela utilização das estradas, dos equipamentos públicos, das linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocados a serviço do público em terras indígenas.
Do artigo 26, fica o caput, mas são vetados:
§ 1º As terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico que elimine a posse direta pela comunidade indígena.
§ 2º É permitida a celebração de contratos que visem à cooperação entre indígenas e não indígenas para a realização de atividades econômicas, inclusive agrossilvipastoris, em terras indígenas, desde que:
I – os frutos da atividade gerem benefícios para toda a comunidade indígena;
II – a posse dos indígenas sobre a terra seja mantida, ainda que haja atuação conjunta de não indígenas no exercício da atividade;
III – a comunidade indígena, mediante os próprios meios de tomada de decisão, aprove a celebração contratual;
IV – os contratos sejam registrados na Funai.
Art. 27. É permitido o turismo em terras indígenas, organizado pela própria comunidade indígena, admitida a celebração de contratos para a captação de investimentos de Avulso do PL 2903/2023 [11 de 16] 11 terceiros, desde que respeitadas as condições estabelecidas no § 2º do art. 26 desta Lei.
Parágrafo único. Nas terras indígenas, é vedada a qualquer pessoa estranha às comunidades indígenas a prática de caça, pesca, extrativismo ou coleta de frutos, salvo se relacionada ao turismo organizado pelos próprios indígenas, respeitada a legislação específica.
Art. 28. No caso de indígenas isolados, cabe ao Estado e à sociedade civil o absoluto respeito às suas liberdades e aos seus meios tradicionais de vida, e deve ser evitado, ao máximo, o contato com eles, salvo para prestar auxílio médico ou para intermediar ação estatal de utilidade pública.
§ 1º Todo e qualquer contato com indígenas isolados deve ser realizado por agentes estatais e intermediado pela Funai.
§ 2º São vedados o contato e a atuação com comunidades indígenas isoladas de entidades particulares, nacionais ou internacionais, salvo se contratadas pelo Estado para os fins do caput deste artigo, e, em todo caso, é obrigatória a intermediação do contato pela Funai.
Art. 29. As terras sob ocupação e posse dos grupos e das comunidades indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o disposto no inciso XVI do caput do art. 49 e no § 3º do art. 231 da Constituição Federal, bem como a renda Avulso do PL 2903/2023 [12 de 16] 12 indígena, gozam de plena isenção tributária, vedada a cobrança de quaisquer impostos, taxas ou contribuições sobre uns ou outros.
Art. 30. O art. 1º da Lei nº 11.460, de 21 de março de 2007, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 1º Fica vedado o cultivo de organismos geneticamente modificados em áreas de unidades de conservação, exceto nas Áreas de Proteção Ambiental.”
Art. 31. O caput do art. 2º da Lei nº 4.132, de 10 de setembro de 1962, passa a vigorar acrescido do seguinte inciso IX: “Art. 2º ………………………….. …………………………………………… IX – a destinação de áreas às comunidades indígenas que não se encontravam em área de ocupação tradicional em 5 de outubro de 1988, desde que necessárias à reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. ……………………………………….”(NR)
Art. 32. O inciso IX do caput do art. 2º de Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 2º ………………………….. …………………………………………… IX – garantir aos índios e comunidades indígenas, nos termos da Constituição Federal, a posse permanente das terras tradicionalmente ocupadas em 5 de outubro de 1988, reconhecendo-lhes Avulso do PL 2903/2023 [13 de 16] 13 o direito ao usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades naquelas terras existentes.
Projeto do Congresso
Em setembro, como reação ao Supremo Tribunal Federal (STF), o Senado aprovou o marco temporal que veio da Câmara dos Deputados, sem alterá-lo. Isso porque a medida teria de retornar à Casa de origem.
Além da demarcação, o texto previa a possibilidade de “contato excepcional” com povos isolados, em caso de “utilidade pública”. Possibilitaria também atividades econômicas em terras indígenas, com a contratação de terceiros, e abriria espaço para o turismo.
Decisão do STF
No mesmo dia que o Senado aprovou o texto, o STF definiu 13 critérios, após derrubar o marco temporal.
- A demarcação consiste em procedimento declaratório do direito originário territorial a posse das terras ocupadas tradicionalmente por comunidade indígena;
- A posse tradicional indígena distinta da posse civil, consistindo na ocupação das terras habitadas em caráter permanente pelos indígenas, das utilizadas para as suas atividades produtivas, das imprescindíveis a preservação dos recursos ambientais necessários, ao seu bem-estar e das necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições, nos termos do parágrafo I do art. 231 do texto Constitucional;
- A proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam independe da existência de marco temporal em 5 de outubro de 1988 ou da configuração do remitente esbulho como conflito físico, controvérsia judicial persistente a data da promulgação da constituição;
- Existindo ocupação tradicional indígena, o remitente esbulho contemporâneo a promulgação da constituição federal aplica-se o regime indenizatório relativo às benfeitorias úteis e necessárias previstas ao parágrafo 6º do art. 231 da CF/88;
- Ausente ocupação tradicional indígena ao tempo da promulgação da CF, o remitente esbulho na data da promulgação da Constituição são válidos e eficazes, produzindo todos os seus efeitos, os atos e negócios jurídicos perfeitos e a coisa julgada relativos a justo título e posse de boa-fé das terras de ocupação tradicional indígena, assistindo ao particular direito a justa e prévia indenização das benfeitorias necessárias e úteis pela União. E quando inviável o reassentamento dos particulares, caberá a eles indenização pela União, com direito de regresso em face do ente federativo que titulou a área, correspondente ao valor da terra nua, paga em dinheiro ou em títulos da dívida agrária, se for de interesse do beneficiário e processados em autos apartados do procedimento de demarcação, com o pagamento imediato da parte incontroversa garantido o direito de retenção até o pagamento do valor incontroverso, permitido a autocomposição e o regime do art. 37, parágrafo 6º da CF;
- Descabe indenização em casos já pacificados decorrentes de terras indígenas já reconhecidas e declaradas em procedimentos demarcatórios, ressalvados os casos judicializados em andamento;
- É dever da União efetivar o procedimento demarcatório de terras indígenas, sendo admitida a formação de áreas reservadas somente diante da absoluta impossibilidade de concretização da ordem constitucional demarcação, devendo ser ouvida em todo caso a comunidade indígena, buscando, se necessário, a autocomposição entre os respectivos entes federativos para identificação das terras necessárias à formação das áreas reservadas, tendo sempre em vista a busca do interesse publico e a paz social, bem como a proporcional compensação as comunidades indígenas (art. 16.4 da OIT);
- O redimensionamento de terá indígena é vedado em caso de descumprimento dos elementos contidos no art. 231 da CF por meio de procedimento demarcatório até o prazo de cinco anos da demarcação anterior, sendo necessário comprovar grave e insanável erro na condução do procedimento administrativo ou na definição dos limites da terra indígenas, ressalvadas as ações judiciais em curso e os pedidos de revisão já instaurados até a data da conclusão desse julgamento;
- O laudo antropológico é um dos elementos fundamentais para demonstração da tradicionalidade de ocupação comunidade indígena determinada de acordo com os seus usos, costumes e tradições e observado o devido processo administrativo;
- As terras de ocupação tradicional indígena são de posse permanente da comunidade, cabendo aos indígenas o usufruto exclusivo das riquezas dos solos, dos rios e lagos nela existentes;
- As terras de ocupação tradicional indígena na qualidade de terras públicas são inalienáveis, indisponíveis e os direitos sobre elas imprescritíveis;
- A ocupação tradicional das terras indígenas é compatível com a tutela constitucional do meio ambiente, sendo assegurados os exercícios das atividades dos povos indígenas;
- Os povos indígenas possuem capacidade civil e postulatória, sendo partes legítimas nos processos em que discutir seus interesses, sem prejuízo nos termos da lei, da legitimidade concorrente da Funai e da intervenção do MP como fiscal da lei.
Com votações que possuem critérios distintos, do Judiciário e do Legislativo, abre-se um impasse na sociedade brasileira. “A Constituição Federal (CF) de 1988 é clara ao prever a competência do Poder Legislativo para ‘criar e editar leis’, conforme os artigos 48, 59, 60 e 61 pertencentes ao Título IV — Capítulo I (organização do Poder Legislativo)”, constatou Vera Chemim, advogada constitucionalista e mestre em Direito público administrativo pela FGV.
Segundo Vera, a despeito da previsão constitucional, o STF finalizou o julgamento de um Recurso Extraordinário, declarando a inconstitucionalidade do marco, por meio da fixação de uma tese de Repercussão Geral, ao mesmo tempo em que o Legislativo aprovou uma lei que vai de encontro à decisão da Corte. “Não há nenhuma dúvida de que a nova lei será objeto de judicialização e o STF vai corroborar a sua inconstitucionalidade, uma vez que o tema foi tardiamente disciplinado pelo Poder Legislativo”, afirmou a jurista.
Nada que o pinga não resolva com alguns milhões em emendas parlamentares.
TODOS farinha podre no mesmo saco!
Agora queremos ver até onde vai a “valentia” deste congresso.
Esperamos que um bate papo de pé de ouvido, não venha a “amolecer”esses senhores….
Ddd
O congresso tem que reagir a esse m…
Vergonha. #foralula