(J.R. Guzzo, publicado no jornal Gazeta do Povo em 21 de novembro de 2022)
O Brasil se acostumou a viver na ilegalidade e não há sinais, até agora, de nenhuma reação efetiva contra isso — declarações de protesto, manifestações na frente dos quartéis, críticas aqui e ali, mas nada que mude o avanço constante do regime de exceção imposto ao país pelo Poder Judiciário. As autoridades cumprem ordens ilegais. Os Poderes Executivo e Legislativo não exercem mais suas obrigações e seus direitos. As instituições pararam de funcionar. É como no tempo do Ato Institucional No. 5. Ficou determinado pela força, na ocasião, que nenhuma decisão do Poder Executivo estava sujeita à apreciação judicial. Na ditadura de hoje nenhuma decisão do ministro Alexandre de Moraes e dos oito colegas que seguem a ele no STF está sujeita a qualquer tipo de recurso — só se pode recorrer a eles mesmos, o que obviamente não adianta nada.
A Constituição Federal e as leis brasileiras em vigor, quaisquer que sejam, são violadas diariamente pelos ministros do STF; as liberdades públicas e os direitos civis dos cidadãos foram eliminados. Deixou de funcionar, para efeitos práticos, qualquer sistema de controle aos atos do STF; e sem controle de ninguém, os nove ministros que mandam no tribunal estão governando o Brasil de hoje através de um inquérito policial, de ordens pessoais e decretos sem nenhum fundamento legal. O último episódio, numa série que está aí há quatro anos, é o bloqueio das contas bancárias de 43 empresas de transporte, por ordem do ministro Moraes. Não há legalidade alguma nessa decisão — é pura e simples violência.
Uma conta bancária não pode ser bloqueada sem um processo previsto em lei, por nenhum juiz brasileiro — nem as contas dos traficantes de droga estão fora desta determinação. A solicitação do bloqueio tem de vir do Ministério Público, obrigatoriamente — como qualquer denúncia criminal. No caso, as contas foram bloqueadas sem processo legal nenhum; foi apenas uma ordem de Alexandre de Moraes, mais nada. O Ministério Público não pediu coisa nenhuma; na verdade, sequer foi informado do bloqueio pelo ministro. Em suma: está tudo errado, mas o Banco Central apenas obedece. Está cumprindo uma ordem ilegal, e fica tudo por isso mesmo. As transportadoras não têm a quem apelar – só podem recorrer ao próprio STF, e o STF nega todo e qualquer recurso feito contra as suas decisões.
Tudo isso é aplaudido como uma ação decisiva para combater “atos antidemocráticos”. Essa é a palavra mágica do novo Ato-5; serve como justificativa para todas as decisões ilegais do STF. Serve também, cada vez mais, para designar qualquer manifestação contrária ao novo governo.