(Artigo de J. R. Guzzo publicada no jornal Gazeta do Povo em 8 de agosto de 2022)
O público brasileiro é alertado, o tempo todo, sobre os perigos, os danos e as ameaças para a democracia que podem ser causados pelo “discurso do ódio”. Para a oposição, as classes intelectuais e os vigilantes da “justiça eleitoral”, naturalmente, só o presidente da República, os seus familiares e a nebulosa que descrevem como os “bolsonaristas” são capazes, organicamente, de odiar. Apenas eles, assim, devem ser fiscalizados pelas forças democráticas, ou quem quer que se apresente com essa qualificação; a ideia é de que a chapa eleitoral do presidente Jair Bolsonaro seja cassada se ele praticar o delito de ódio. Esse crime não existe nas leis brasileiras, mas e daí? A lei também diz que só o Ministério Público pode fazer investigações e levar acusações à justiça, mas o ministro Alexandre de Moraes comanda há três anos, com equipe própria, um inquérito policial para punir “atos antidemocráticos”; em sua condição de futuro presidente do Tribunal Superior Eleitoral ele até já ameaçou de prisão quem entrar em sua lista negra.
Um dos problemas disso tudo são os fatos que se podem observar no mundo das realidades. Não foi possível à polícia da democracia, até agora, flagrar o presidente da República cometendo algum ato de ódio; em compensação, nunca um personagem da vida pública brasileira foi tão odiado quanto ele. Ficamos, com isso, numa situação esquisita. Bolsonaro é monitorado dia e noite por suspeitas de odiar alguém ou alguma coisa. Mas os seus inimigos vão ficando cada vez mais agressivos nas demonstrações de ódio contra ele, seus parceiros de política e mesmo os seus simples eleitores — e ninguém na “justiça eleitoral”, ou coisa que o valha, acha que possa haver algo de errado com isso. O último surto de raiva em estado puro veio de mais um jornalista de oposição — o cidadão disse num vídeo que é preciso queimar o presidente, fisicamente, tocar fogo no Palácio do Planalto e destruir, ao que se presume pelos termos da sua sentença de condenação, também quem vota nele.
Isso não seria raiva de primeira categoria? Se não é isso, então o que poderia ser? Ou: o que mais o sujeito precisa fazer para ser qualificado na categoria de discursador de ódio? Mas as autoridades eleitorais e o “campo progressista” não veem nada de mal num negócio desses; aí, pelo que dá para entender, trata-se de “liberdade de expressão”. O ministro Moraes e o STF acham que o “mau uso” do direito de livre manifestação é um dos piores problemas que o Brasil tem hoje. Mas, em seu entendimento, só a “direita” é capaz de fazer isso — e só ela vem sendo punida, presa e “desmonetizada” por praticar a liberdade errada. Se a pregação da violência física e de outras barbaridades vem da esquerda e vai contra Bolsonaro, não há problema nenhum. Nem o Ministério Público, nem a Polícia Federal, nem o Judiciário mexeram uma palha até agora para apurar nada do que existe a respeito.
Não é por falta de oportunidade. O filme de um cineasta conhecido mostra o presidente da República jogado no chão, com uma faixa verde e amarela no peito, coberto de sangue; presume-se que ele foi assassinado durante uma passeata de motocicletas. Em outro vídeo, um grupo de pessoas joga futebol com a cabeça de Bolsonaro, roubada de um túmulo. Um comentarista político escreveu num jornal de São Paulo um artigo com o seguinte título: “Por que torço para que Bolsonaro morra”. Que tal? Não existe ódio em nada disso? É claro que existe. O que não existe no Brasil de hoje é imparcialidade da Justiça para acompanhar o processo eleitoral.
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