Modelo de gestão da Maranata permite que seus recursos sejam usados em ações sociais, missões evangelísticas e projetos ambientais
Esta é uma palavra fiel: se alguém deseja o ministério pastoral, excelente obra deseja.” 1 Timóteo 3:1
Imagine uma denominação evangélica em que os pastores são voluntários. Isso mesmo: não recebem um centavo por levar a mensagem de Deus aos fiéis. É assim que funciona a Igreja Cristã Maranata (ICM), fundada em 1968 no município de Vila Velha, no Espírito Santo. Mas não para aí. A ICM não cobra dízimo nem oferta dos membros durante os cultos — prática que se tornou comum em igrejas neopentecostais.
Esse modelo de gestão permite à Maranata usar seus recursos em ações sociais, missões evangelísticas e projetos ambientais. Ainda possibilita que a ICM construa templos em todo o país, das regiões mais ricas às mais pobres, com as mesmas características arquitetônicas.
A ICM adota essas práticas como experiência de fé. Ao mesmo tempo, não critica as igrejas que cobram ofertas e dízimos. Cada uma tem sua missão e seus propósitos. Essa é a experiência da Maranata.
Hoje, mais de 5 mil pastores estão vinculados à Maranata. E todos têm um ofício, através do qual mantêm suas famílias e contribuem para a manutenção da ICM. O pastor Josias Júnior, 55 anos, é um exemplo disso. Há 11 anos, o publicitário de formação é uma das principais vozes da igreja. “Sou um caso raro na Maranata”, conta. “Sou funcionário da igreja, mas em virtude de minha formação profissional. Costumo explicar assim: das 8 às 18 horas, trabalho na ICM. A partir dali, viro voluntário e desempenho o papel de pastor.”
Alexandre Melo Brasil, 61 anos, segue na mesma linha. Ele afirma que é pastor por obra divina, mas advogado previdenciário de profissão. “Nunca dependi da Maranata para absolutamente nada”, ressalta. “Ao contrário: os pastores são contribuintes da igreja. Meu dízimo é parte do trabalho que desempenho na minha profissão. O fato de termos um ofício não enfraquece nosso trabalho na igreja.” Minutos antes de explicar seu papel na ICM, o mineiro de Caratinga (MG) estava em uma reunião com fiéis do Uzbequistão. “Oramos, pregamos, fizemos cultos”, revela. “Com tradutor, claro, porque não falo uzbeque. Quando terminarmos esta ligação, voltarei ao trabalho. Tenho petições a fazer. À noite, irei ao hospital visitar um doente. Nossa vida é assim.”
Na ICM, o desenvolvimento dos pastores ocorre ao longo dos anos. Os postulantes não precisam ser formados em teologia, mas têm de vivenciar as experiências comuns da Maranata. É a partir daí que o membro percebe o chamado divino. Há diversos serviços a serem prestados à igreja, em que o fiel amadurece e aprende a lidar com o rebanho.
Kezia Nunes, pós-doutora em educação pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), explica que a ICM escolhe seus pastores por vocação. “É um chamado do Senhor”, diz a voluntária do grupo Organização e Método, que fornece orientações para as famílias com base nos ensinamentos bíblicos e nas ciências humanas. “Todos na Maranata trabalham de forma voluntária. Isso não nos destitui de uma formação complementar, de uma exigência técnica. Os membros se formam a partir da dinâmica das relações da ICM.” A pós-doutora em educação lembra que conheceu outras denominações evangélicas, mas sentiu desconforto ao saber que os pastores recebiam salário e que havia cobrança de dízimo nos cultos. “Isso não existe na Maranata”, salienta Kezia. “É um trabalho fortemente interessado em ajudar.”
Quando chega à Maranata, nenhum fiel ouve conversas sobre dízimo nem oferta. A contribuição ocorre naturalmente, através da disposição individual das pessoas. O processo é o mesmo para todos os membros — tanto para obreiros quanto para diáconos e pastores.
O pastor Josias Júnior esclarece a diferença entre dízimo e oferta. “Normalmente, o membro da igreja tem consciência de que deve ser dizimista, participar”, diz. “Isso é histórico dentro do Evangelho, da Bíblia. Sob o ponto de vista social, há uma explicação clara sobre o dízimo: qualquer associação, clube ou condomínio pede uma contribuição para, em troca, oferecer benefícios à comunidade.” O dízimo é usado de várias formas, como no socorro aos famintos, aos desabrigados e às vítimas de enchentes. A ICM desenvolve também um trabalho de educação com jovens vulneráveis, para integrá-los à fé cristã e afastá-los da criminalidade.
Ser dizimista da Maranata não é fácil. A igreja permite que apenas seus membros façam doações. Para se tornar membro, o indivíduo tem de frequentar os Maanains, conhecer as doutrinas e participar dos estudos bíblicos. Esse processo é finalizado com o batismo.
Andréia Talma, 37 anos, acredita que o modelo de administração da Maranata aproxima a igreja dos fiéis. “A ICM não tem o hábito de fazer ofertas em culto, passar sacolinha”, diz. “Não cobrar dízimo é positivo. Os fiéis podem discretamente procurar os diáconos e fazer uma oferta. Ninguém se sente na obrigação de ofertar em público. Às vezes, as pessoas simplesmente não têm dinheiro, estão desempregadas. É um constrangimento.”
A Maranata não trata de assuntos financeiros nos encontros nem nos seminários. Tampouco faz campanhas para levantamento de recursos. “Os cultos são exclusivamente para o alimento espiritual, para o renovo da experiência de salvação dos membros, para um encontro com Deus e a possibilidade de adorá-lo”, justifica a ICM. “Ao mesmo tempo, a Maranata não critica nem se posiciona contra outras denominações que adotam outros modelos de administração.”
O pastor Diniz Cypreste de Azevedo, 61 anos, recorre à Bíblia para explicar o posicionamento da Maranata. Nela, o apóstolo Paulo afirma que o obreiro é digno do seu salário. Mas diz também que, para não ser um fardo às pessoas, decidiu fabricar tendas e vendê-las. “Não é errado receber salário como pastor, mas nos baseamos em Paulo”, observa. “O trabalho dos pastores é uma oferta a Deus. Um fiel está no grupo de louvor, enquanto o outro é instrumentista. Há ainda quem trabalhe como diácono. Tem quem desenvolva trabalhos sociais.”
A infraestrutura do Maanaim
O Maanaim Domingos Martins, localizado às margens da BR-262, na Região Serrana do Espírito Santo, possui uma estrutura para a coleta de água de chuva. Esse sistema tem 12,3 mil metros quadrados e distribui-se em telhados e calhas, que podem ser utilizados para o aproveitamento da água. Para o consumo humano, há captação de água através da perfuração de poços. O líquido é bombeado para um complexo sistema de reservatórios, entre reservatórios de fibra e de alvenaria. A quantidade de água captada pelos voluntários é suficiente para abastecer os fiéis durante os eventos.
Existem 20 alojamentos coletivos e chalés no Maanaim. A ICM tem uma equipe voluntária de dez pessoas, entre médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem. A unidade possui oito leitos, que englobam atendimento médico inicial e assistência médica complexa. Há também duas salas para atendimento odontológico. O Maanaim tem dois auditórios, com capacidade para 2 mil pessoas, nos quais realizam-se treinamentos e capacitação dos voluntários.
O local abriga dez lanchonetes para atendimento ao público. Também possui dois grandes refeitórios, capazes de receber 1,5 mil pessoas. A quantidade de refeições é calculada pelo número de fiéis inscritos nos seminários e nos encontros. Para um evento com mais de 2 mil pessoas, por exemplo, a ICM prepara 570 quilos de carne, 180 quilos de arroz, 120 quilos de feijão e 180 quilos de verduras e legumes. Alimentos como repolho, alface, salsa e cebolinha vêm das hortas plantadas no próprio Maanaim. E as sobras das refeições vão para a compostagem, num sistema com base em biogás.
Um sofisticado circuito de monitoramento, com mais de 60 câmeras, alcança todas as dependências do Maanaim. Em caso de ocorrência criminosa, a equipe de segurança aciona os agentes de segurança pública.