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Mina de nióbio chinesa em Catalão, Goiás| Foto: ANM
Edição 119

O nióbio é nosso

Com 90% da oferta global suprida pelo Brasil, esse metal deixa as construções mais leves e baratas, além de gerar baterias para carros recarregáveis em poucos minutos

Artur Piva
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Embora a campanha “O petróleo é nosso” tenha resultado na estatização do setor em meados do século passado, a produção interna nunca foi capaz de elevar o país a uma posição de liderança no mercado internacional. Com o nióbio é diferente. A extração desse metal, que pode fazer com que as baterias de carros elétricos sejam carregadas em poucos minutos, é liderada por uma empresa nacional: a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM).

O investimento em tecnologia e a atuação discreta ao longo de quase 70 anos fizeram com que a empresa se tornasse hegemônica na oferta global. Em 2021, cerca de 90% do consumo mundial de produtos de nióbio (ligas e óxido) saiu da fábrica da CBMM em Araxá, cidade de pouco mais de 100 mil habitantes localizada a 360 quilômetros de Belo Horizonte.

Com esse componente, a indústria conseguiu grandes avanços. Além do material para as baterias, foram criadas, por exemplo, ligas de aço mais leves e resistentes. As aplicações abrangem uma extensa lista, que vai de equipamentos médicos de ponta a telescópios espaciais.

A CBMM faz a exploração por meio de uma parceria com o governo mineiro. A empresa é controlada pelo Grupo Moreira Salles, que está entre os principais acionistas do Banco Itaú Unibanco. A Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais, órgão estadual, detém os direitos de metade da mina de Araxá, motivo pelo qual fica com 25% do lucro líquido da operação. A história do mercado mundial de nióbio data do meio do século 20 e está umbilicalmente ligada à família de banqueiros do Brasil.

Extração de pirocloro nos arredores de Araxá, cidade no sul de Minas Gerais | Foto: Divulgação


Décadas de produção discreta

Em 1953, o geólogo Djalma Guimarães encontrou, em Araxá, jazidas de pirocloro, o mineral de onde se extrai o nióbio. Dois anos mais tarde, a norte-americana Molycorp fundou a CBMM. Passada uma década (em 1965), Walter Moreira Salles, fundador do Unibanco, comprou a maior parte da companhia. A empresa desenvolveu o mercado para a aplicação do metal. Em 2007, a sociedade se desfez, e família Moreira Salles ficou com o negócio. Atualmente, ela detém 70% das cotas. Os 30% restantes estão divididos em partes iguais de 15% entre dois consórcios: um chinês e outro formado por capital sul-coreano e japonês.

De acordo com Eduardo Ribeiro, que deixou o cargo de CEO da CBMM no fim de junho, até o início de 2011 a companhia pertencia completamente à família Moreira Salles. A chegada dos novos sócios “foi uma visão estratégica para buscar acionistas que pudessem nos ajudar a desenvolver o mercado”, disse o executivo, em entrevista ao jornal O Tempo.

Riqueza desconhecida

Apesar do interesse de grandes banqueiros e de um mercado de décadas, o nióbio era desconhecido por brasileiros comuns até bem pouco tempo atrás. Um dos primeiros políticos a falar do assunto foi Enéas Carneiro — famoso pelo bordão “Meu nome é Enéas” —, no começo da década de 1990. O outro foi Jair Bolsonaro, atual presidente do Brasil.

Em outubro de 2021, com mais de meio século de atraso, ocorreu a 1ª Feira Brasileira do Nióbio. Encabeçado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, o evento foi realizado em Campinas (SP), a cerca de 200 quilômetros da capital, São Paulo. O local escolhido foi o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais — vinculado à pasta. Bolsonaro e representantes da CBMM estavam lá.

O valor da tonelada do nióbio é US$ 40 mil. Para comparação, cada tonelada de minério de ferro que o Brasil exportou no ano passado saiu por US$ 200

“O Brasil tem as maiores reservas conhecidas de nióbio do mundo, é o principal país produtor, com uma produção que cresce de forma sustentada e representa 90% da oferta global”, disse, na abertura, Pedro Paulo Dias Mesquita, um dos secretários do Ministério de Minas e Energia. “Essa realidade se tornou possível a partir da união entre mineração e tecnologia e da parceria entre os setores público e privado, para a construção de centros tecnológicos excelentes.”

O Brasil tem a maior parte do nióbio disponível do planeta | Foto: Shutterstock


Mercado atual

Das vendas da CBMM, cerca de 90% vão para a indústria do aço, na forma de ferronióbio. São pequenas pedras metálicas brilhantes. Esse modelo de negócio gerou o lucro líquido de R$ 4,5 bilhões em 2021. A receita ficou em R$ 11 bilhões. O valor da tonelada do nióbio é estimado em US$ 40 mil. Para comparação, cada tonelada de minério de ferro e seus concentrados que o Brasil exportou no ano passado saiu do país ao preço médio de US$ 200. Ou seja: o nióbio beneficiado vale 200 vezes mais.

Ricardo Fonseca Lima, vice-presidente da CBMM, descreveu esse minério como um “metal que possui alta condutividade térmica, alta condutividade elétrica, alta resistência à corrosão, ao calor e ao desgaste”. Entre as propriedades, o ponto de fusão próximo a 2.500 graus Celsius — enquanto o ferro derrete a partir de 1.500 graus Celsius e a água evapora em 100 graus Celsius.

A aplicação de 100 gramas de nióbio em 1 tonelada de aço é suficiente para deixar a liga mais resistente. Desse modo, menos material é necessário, criando estruturas mais leves e baratas. A economia em dinheiro é estimada em 17%. Daí a valorização. É preciso levar em conta, entretanto, que existem outros metais que podem substituí-lo — mas com menos eficiência. Na lista estão: vanádio, molibdênio, tântalo, tungstênio e háfnio.

Consumo global

Em 1975, o mercado global de ferronióbio não chegava a 4 mil toneladas. No ano de 2021, aproximadamente 120 mil toneladas dessa liga foram consumidas no planeta. No ranking de uso, a China aparece em primeiro lugar, com 35 mil toneladas. O top cinco também é composto de União Europeia (22 mil toneladas), Estados Unidos (15 mil toneladas), Japão (9 mil toneladas) e Coreia do Sul (8 mil toneladas).

Com 400 clientes espalhados em mais de 50 países, a CBMM afirma ter capacidade para produzir 150 mil toneladas de ferronióbio. A operação de extração em Araxá, nos moldes atuais de consumo, consegue suprir a demanda mundial por 100 anos, segundo a companhia.

Futuro próximo

A Toshiba firmou uma parceria com a CBMM e a Volkswagen, a fim de criar baterias com óxido de nióbio para veículos elétricos — um material que tem alto grau pureza e parece uma areia fina. Os testes já começaram na unidade da montadora em Resende (RJ). O antigo CEO da mineradora garante que, em 2023, os ônibus da Volks com essa tecnologia vão circular em Araxá.

Graças ao componente com nióbio, o tempo de carregamento das baterias pode cair de horas para minutos. “Estamos falando de veículos de passageiros de carga total de seis a oito minutos versus horas hoje”, comentou Ribeiro. A empresa projeta que cerca de 35% de suas vendas virão do mercado de baterias em 2030.

Com a aproximação da Toshiba, também foi possível uma colaboração com a unidade brasileira da chinesa Horwin, fabricante de motocicletas. Juntas, as três pretendem colocar o modelo CR6 nas ruas brasileiras em 2024. O veículo tem 6.200 watts de potência de motor, 150 quilômetros de autonomia e bateria de lítio com nióbio com tempo para carregamento de dez minutos e capacidade para 20 mil recargas. São 3 milhões de quilômetros com a mesma bateria.

Para atender a todos esses projetos, a CBMM prevê investir R$ 1,2 bilhão na construção de uma nova fábrica em Araxá. O local será dedicado à produção do óxido de nióbio. Outras duas unidades estão nos planos da empresa. Os investimentos feitos até 2030 devem somar R$ 9 bilhões.

“Nosso foco são produtos de nióbio, usando a reserva de minério de longo prazo da empresa”, explicou Ribeiro, ao jornal Valor Econômico, citando a estratégia de agregar valor. A empresa quer ampliar a produção de óxidos em 50 mil toneladas.

Reservas de nióbio no Brasil e no mundo

Cerca de 98% das reservas conhecidas de nióbio do planeta estão no Brasil. Elas somam 840 milhões de toneladas. Delas, 75% estão em Minas Gerais, 21% no Amazonas e 3% em Goiás, de acordo com o Serviço Geológico do Brasil.

Existe também uma promessa: estima-se que, em São Gabriel da Cachoeira, Estado do Amazonas, exista um depósito com mais de 2 bilhões de toneladas de nióbio. Se confirmado, ele está sob terras indígenas e em área de reserva florestal.

Além da CBMM

No setor brasileiro de extração e beneficiamento de nióbio, também atuam outras duas empresas. A chinesa CMOC, segunda maior, detém 8% da produção mundial, com as operações de extração ocorrendo na mina de Catalão (GO). Na terceira posição, a peruana Tabocas Mineração explora a jazida em Presidente Figueiredo (AM).

Definitivamente, o nióbio é brasileiro.

Leia também “Um país fora dos trilhos — Parte 2” 

9 comentários
  1. Jenielson Sousa Lopes
    Jenielson Sousa Lopes

    Bolsonaro tem razão

  2. Lourival Nascimento
    Lourival Nascimento

    E o Luladrão querendo ” compartilhar com o mundo “, seja lá o que essa joça queira dizer, o que temos. Se buscarem na História, verão a atuação SISTEMÁTICA do CIMI da CNBB, a mesma CNBB que convidou o abortista esquerdista, desculpem a redundância, um tal de Chico Alencar para uma boquinha, uma vez que foi enxotado da vida pública pelos eleitores.

  3. Gil Moura Neto
    Gil Moura Neto

    artigo muito bem redigido
    Um enorme potencial para o Brasil
    E a riqueza da Amazonia ….Não é por acaso que temos milhares de ONGs lá trabalhando …

  4. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    O sub-solo do Brasil pertence a nação, vamos botar o exército nas fronteiras do Amazonas

  5. Paulo Ferreira
    Paulo Ferreira

    Fiz os cálculos, corrijam se estiver errado: se confirmar as reservas de 2bi de toneladas, temos aí, a 40.000 doletas cada uma, um total de U$ 800 trilhões a faturar. Confere?

  6. Jorge Apolonio Martins
    Jorge Apolonio Martins

    Uh, uh, uh… o nióbio é nosso!

  7. Silas Veloso
    Silas Veloso

    Muito bom!

  8. Ragnar
    Ragnar

    O país que dominar a tecnologia das baterias de recarga rápida e ainda for produtor do mineral, certamente dominará a matriz energética dos transportes.

    Vale a pena investir nisso.

  9. Jota Dabliu
    Jota Dabliu

    Detalhe curioso sobre a campanha do ‘petróleo é nosso’: Getúlio era contra a criação de uma empresa estatal para explorar o petróleo, mas devido à pressão de Afonso Arinos, da UDN, o monstro acabou gerado.

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