A Associação Brasileira de Marketing Rural e Agro (ABMRA) quer transformar a forma como a população enxerga o agronegócio, conectando a cidade ao campo. A estratégia é mostrar as facilidades que a agropecuária entrega para a vida cotidiana e estabelecer uma conexão entre o produtor rural e o consumidor final.
“A missão é fazer do agro uma paixão nacional, como são o futebol e o Carnaval”, explicou Ricardo Nicodemos, 55 anos, presidente da ABMRA. Ao lado de uma equipe de especialistas, o publicitário organizou um plano de ação baseado em muita pesquisa de opinião de mercado.
O resultado é o projeto Marca Agro do Brasil. A iniciativa nasce com o apoio de algumas instituições tradicionais, que fazem parte de seu conselho. Entre elas, a Associação Brasileira do Agronegócio; o Centro de Inteligência da Carne, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa); e a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil.
Oeste conversou com Nicodemos para entender o que o brasileiro médio sabe sobre a lida no campo e qual o caminho proposto para despertar admiração por esse segmento. Confira os principais trechos da entrevista.
Por que o agronegócio precisa se comunicar melhor?
Percepções. Quem tem uma percepção equivocada passa a considerá-la uma realidade. Comunicar-se é importante para mostrar a verdade e para criar uma conexão. E também para contar a sua própria versão da história. Em terceiro, para ter a admiração da população. É quase inimaginável que um ramo tão importante não seja visto dessa forma. É preciso valorizar o trabalho do produtor rural, daquela família que produz o alimento, além de fornecer centenas de matérias-primas que abastecem as indústrias, sejam elas de calçados, roupas, livros etc. Tudo isso vem do agro. E a população não tem a obrigação de saber essas coisas, ainda mais se eu não comunico bem esses fatos.
A população conhece a participação do setor na vida cotidiana?
Ainda não. Fizemos um levantamento com diversos segmentos da população, e num determinado momento desse diagnóstico nós conversamos com mães e crianças. Perguntamos a elas de onde vinha o leite que a pessoa tem em casa e de onde vem a batata frita. Invariavelmente, a resposta era: “Do supermercado”. Com um pouco de insistência, os entrevistados chegavam até a indústria. Muito raramente, o produtor rural apareceu na história. Eles não ligam o leite à ordenha de uma vaca, realizada por uma família que acordou às 4 horas da manhã para fazer esse trabalho. A mesma coisa acontece com a batata, que não vem simplesmente da indústria. Alguém teve de plantá-la e regá-la, antes de chegar, por exemplo, aos fast-foods.
Como o McDonald’s, por exemplo, se insere no agronegócio?
Todas as redes de fast-food, como o McDonald’s, são linhas de montagem da agropecuária. Elas não existem sem a produção rural. Não há indústria de alimentos sem a agricultura e a pecuária.
De quem é a missão de mostrar isso para a população?
Precisamos reunir toda a cadeia produtiva do agronegócio nessa missão — da produção da matéria-prima, no campo, à indústria de transformação. Ela é ampla, tem início nos institutos de pesquisa, como a Embrapa e as universidades. Na sequência, está a indústria de insumos, que fabrica, por exemplo, os tratores, as ferramentas e os adubos. Depois, existem as revendas, como as casas agropecuárias, que fazem esses produtos chegarem até o campo. Aí, chegamos ao produtor: tudo o que acontece dentro da porteira — agricultura e pecuária. Em seguida, o que acontece fora da porteira: as cooperativas e as indústrias transformadoras, com vários itens que usamos diariamente, como alimentos, roupas, calçados, energia e papel. A partir daí, existem os distribuidores — das lojas aos shoppings centers. Todos os agentes que vão até o consumidor têm todo o interesse de fazer com que o agronegócio seja valorizado.
Qual é a maior mentira contada sobre a produção agrícola atualmente?
Que ela não é sustentável. A produção rural é, sim, sustentável e caminha cada vez mais nesse sentido. Temos muita coisa para fazer, mas já avançamos bastante. Para se ter noção, quando questionados sobre o assunto, 87% dos produtores rurais responderam que têm consciência e preocupação com sustentabilidade. Existem também outras desinformações que precisam ser desmentidas.
“A verdade é que o Brasil é uma das nações com menos uso de defensivos por metro quadrado e tonelada produzida e uma das menores quantidades de resíduos químicos nos alimentos”
Qual outra desinformação você destacaria?
Um exemplo é a questão dos defensivos agrícolas. Esse é um caso mais elaborado. Não é mentira que o Brasil é um dos maiores consumidores desses produtos no mundo. Porém, esse é apenas um pequeno pedaço da verdade, que visto assim prejudica a imagem desse ramo. A história completa é que o Brasil está nessa lista porque é o único país que tem três safras no mesmo espaço, no mesmo ano, pratica a agricultura em área tropical (o que aumenta o surgimento de pragas) e, ainda assim, tem um dos menores usos desses mesmos defensivos por metro quadrado e por tonelada produzida. Os alimentos nacionais estão entre aqueles com o menor resíduo químico.
Como combater essa desinformação?
Contando a história completa e na ordem certa: ‘O Brasil é uma das nações com menos uso de defensivos por metro quadrado e tonelada produzida e uma das menores quantidades de resíduos químicos nos alimentos. No país, são feitas três safras por ano em áreas de clima tropical, o que propicia o surgimento de pragas. Por isso, em volume total, estamos entre os maiores consumidores de defensivos no mundo. Essa sequência muda a percepção.
De modo geral, os brasileiros enxergam o agronegócio como algo positivo?
A cada dez brasileiros, sete têm uma atitude positiva em relação ao setor. Isso significa que as pessoas estão com um pensamento bom sobre o assunto. A maioria olha o agro como um grande gerador de riquezas para o país e um motivo de orgulho para o brasileiro. Além disso, eles consideram o segmento inovador, apesar de não saberem dizer como. Mas eu tenho os outros três com propensão a boicotar e falar mal. O mais alarmante é que 51% deste grupo têm entre 15 e 29 anos. São jovens. Essa porção acha o setor retrógrado, atrasado, sem inovação. Ou seja, existe uma grande missão: mostrar toda a tecnologia embarcada, como os tratores com cockpit que mais parecem de espaçonaves, com pura tecnologia de mecatrônica e design.
Quais fatores levam a essa hostilidade?
Nosso estudo mostrou alguns desses fatores. O primeiro é o desconhecimento. O setor não leva a informação para criar o ambiente de conhecimento. O segundo fator são as distâncias físicas e sociais. Nem todo mundo tem um amigo ou parente que trabalha no campo, isso é o afastamento social. O físico é que existe muita gente que não conhece a produção rural, nunca visitou um sítio ou passou férias em um hotel-fazenda. Esse público se torna vulnerável ao consumo de informações sem critérios.
Qual a resposta que a ABMRA pode dar para mudar isso?
Depois de fazermos um levantamento sobre as percepções que o brasileiro tem do agronegócio, desenhamos o projeto Marca Agro do Brasil, um plano de trabalho que também envolve campanhas. Nosso objetivo é transformar o setor em uma paixão nacional, como o futebol e o Carnaval são hoje. É um projeto multidisciplinar para atuar em várias frentes, começando pela pré-escola. Queremos mostrar para todas as faixas etárias o que é o agronegócio do Brasil. Se precisar, vamos fazer até dancinhas em plataformas digitais para a informação chegar a quem precisa.
Por que começar pela pré-escola?
O produtor é um herói sem capa que passa 365 dias por ano trabalhando para gerar alimento ou matéria-prima. Se a gente não mostrar que alguém ordenha a vaca, a criança vai continuar achando que o leite vem da indústria. Precisamos mudar isso, para despertar o orgulho pelo agronegócio.
Como falar com as crianças?
No projeto, há um grupo de profissionais especialistas em metodologias de ensino trabalhando para isso. Vamos entregar à criança a mesma informação levada ao adulto, mas com linguagens diferentes, adequadas para aquela faixa etária.
Esse projeto vai abarcar também o exterior?
O brasileiro ainda não sabe que ele pode ser o grande responsável pela segurança alimentar do planeta. Isso mostra que primeiro nós temos de fazer a lição de casa. É nisso que estamos focados, o que demora de cinco anos a uma década. Queremos chegar a 95% da população com uma atitude positiva pelos produtores rurais, os grandes astros. Temos de mostrar a imagem deles como nos filmes norte-americanos, vistos com admiração.
Quando é o pontapé inicial do projeto Marca Agro do Brasil?
Passamos pela fase de diagnóstico. Ela começou em 2021 e fechou em 2022, com a execução da pesquisa “Percepções sobre o agro, o que pensa o brasileiro”. Depois, teve início o trabalho de planejamento, em que criamos a Marca Agro do Brasil. Agora, implantamos dez conselhos. Entre eles, o de especialistas, em que estão nomes conhecidos, como o de Roberto Rodrigues, ministro da Agricultura entre 2003 e 2006; Xico Graziano; José Luiz Tejon; e Marcos Fava Neves. Também temos os conselhos de associações e de cientistas. Buscamos o que existe de melhor no setor, são cerca de cem pessoas trabalhando.
De onde virá a verba para bancar todo o projeto?
Da iniciativa privada. De toda a cadeia produtiva do agronegócio. Desde aquelas empresas que produzem os insumos, passando pelos produtores rurais, até as indústrias de transformação, como as de alimentos e papel, e o segmento de distribuição. Todos eles têm interesse em promover a boa imagem do agronegócio. Nosso cronograma é que em julho tenhamos o projeto pronto para a captação de recurso.
Qual é a grande verdade ainda não contada sobre a produção rural que estará no projeto?
Que o agronegócio faz nossa vida melhor. Ele fornece alimentos e as facilidades do nosso dia a dia. O campo nos fornece matéria-prima para roupas, calçados, cosméticos, energia limpa e muitas outras coisas. Sem o setor, não teríamos nem o pneu para o carro.
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Muito bom. Que seja sucesso esta iniciativa.
Ótima iniciativa. Nasci na roça, vivi lá até meus 10 anos e ainda tenho tios e primos na lida do campo.
Dias atrás li aqui mesmo na Oeste que o país fica preocupado com o agro enquanto esquece a área de tecnologia.
Essa pessoa precisa de esclarecimentos urgente. Sem o desenvolvimento de tecnologias o país não teria saído de importador de alimentos até a década de 70 para 50 anos depois se transformar em um dos maiores exportadores do mundo.
O nível de desinformação é assustador. Um grande contingente de jovens de 15-29 anos não sabe o que é EMBRAPA e pior muitos nunca ouviram falar nesta autarquia que transformou o agro brasileiro em potência mundial.
Parabéns pela excelente matéria. Só um asno não consideraria esse tema tão sublime e importante, e tem viu…
Maravilhoso artigo! Parabéns pelo projeto! Sucesso!!
Parabéns pela iniciativa. Já faz tempo que um trabalho desses se faz necessário. Embora o Brasil tenha sua origem na agricultura e pecuária, a sociedade brasileira realmente desconhece os benefícios que este segmento traz para o ser humano. Dentre os entraves para que os benefícios que este segmento produtivo traz para a sociedade sejam mais conhecidos, são as campanhas difamatórias dos grupelhos ideológicos promovem em vários segmentos, tanto educacional, cultural e artístico.