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Foto: Valeri Vatel/Shutterstock
Edição 168

Todas as grandes verdades começam como blasfêmias 

Brendan O’Neill apresenta seu novo livro, A Heretic's Manifesto

Brendan O'Neill, da Spiked
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“Logo viveremos num mundo em que as pessoas vão perseguir a heresia de dizer que um triângulo é uma figura de três lados”, escreveu G. K. Chesterton. Estamos nesse mundo agora. Vejamos a fúria da multidão de gênero queer que confrontou Kathleen Stock na Universidade de Oxford na semana passada. Stock é uma demônia aos olhos deles, uma proferidora de blasfêmias letais. A heresia? Chamar um homem de homem. Ela afirma que seres humanos com cromossomos XY e pênis são homens. É por isso — o equivalente biológico de dizer que um triângulo é uma coisa de três lados — que a caça às bruxas da cultura woke exige que ela seja banida da vida pública. 

E não são só pessoas ingênuas de 19 anos que se enfurecem diante da blasfêmia da biologia. Em todo o mundo ocidental o establishment está rebatizando a verdade como heresia. Chame alguns homens de “ele”, e você será acusado do pecado de “errar o gênero”. Afirme que apenas as mulheres têm colo do útero — como fez Rosie Duffield, membro do Partido Trabalhista no Parlamento Britânico —, e você será chamada de bruxa. Fale a verdade sobre o passado de uma pessoa — que Caitlyn Jenner era Bruce, um corredor; que Elliot Page era Ellen, uma atriz —, e você será acusado de usar o “nome morto”, uma das piores heresias. 

Kathleen Stock, escritora britânica | Foto: Reprodução/Redes Sociais

As elites estão liderando essa turba que trata fatos como heresias. “É algo que não deve ser dito”, afirmou Keir Starmer sobre a declaração “apenas mulheres têm colo do útero”. Kamala Harris mandou uma carta efusiva para Dylan Mulvaney com felicitações sobre “levar uma vida autêntica” como uma garota — uma inverdade delirante que teria chocado todas as gerações antes da nossa. A CNN criou caso ao desafiar a “pós-verdade” de Donald Trump. Quem consegue esquecer o anúncio que apresentava uma maçã e os dizeres: “Isto é uma maçã. Algumas pessoas podem tentar dizer que é uma banana… mas não é. Isto é uma maçã”. No entanto, a emissora critica J. K. Rowling por dizer que homens não são mulheres. “É importante [para nós reconhecer] com muita clareza que mulheres trans são mulheres”, afirmou a CNN. E se aquela maçã se identificar como uma banana? 

Estamos vivendo um momento extraordinário. Em que os poderes instituídos punem não apenas a expressão de algumas crenças e ideias, mas também a expressão do fato em si. Antes eles prendiam comunistas ou distribuidores de literatura obscena. Agora perseguem pessoas que afirmam que o colo do útero é um órgão feminino. “Onde você está no seu pensamento precisa de muito esclarecimento e muita leitura”, afirmou um policial britânico para uma mulher cujo crime verbal foi colar adesivos em sua porta da frente questionando a ideia de que mulheres trans são mulheres. Precisamos falar sobre isso. Precisamos falar sobre como chegamos a uma situação em que o braço armado do Estado repreende e censura pessoas que dão voz à verdade comprovável e mensurável. 

Rosie Duffield, membro do Parlamento britânico | Foto: Divulgação

No meu novo livro, A Heretic’s Manifesto: Essays on the Unsayable (“O manifesto de um herege: ensaios sobre o indizível”, numa tradução livre), trato desse novo autoritarismo cultural. Argumento que estamos vivendo sob uma classe dominante cuja aspiração é a forma mais pura de tirania: o direito de definir a realidade em si. Essa elite da pós-verdade insiste em nos fazer duvidar das evidências dos nossos próprios olhos e da luz da nossa razão e, em vez disso, aceitar sua verdade como “a” verdade. É uma elite que tem a audácia de denunciar a desinformação na campanha do Brexit enquanto propõe a mentira de que homens podem engravidar. “O que dizemos que é real é real”, afirmam esses tiranos culturais. Uma maçã é sempre uma maçã, mas um homem nem sempre é um homem, e ai de quem hesitar. 

Livro A Heretic’s Manifesto: Essays on the Unsayable, de Brendan O’Neill | Foto: Reprodução/Redes Sociais

Estamos sendo manipulados dia e noite. Vemos um homem, e dizem que é uma mulher — literal e legalmente uma mulher. Vemos um sujeito de barba, e dizem que é uma lésbica. “Vamos deixá-la se juntar às outras lésbicas”, dizem, e é tudo mentira. Vemos uma mulher grávida na capa da revista Glamour deste mês, e dizem se tratar de um “homem grávido”. A verdade — que só mulheres engravidam, que nenhum homem nunca engravidou nem vai engravidar — é cruelmente anulada. Ela é queimada na fogueira da ideologia. As ilusões das elites têm mais peso que a própria verdade — esse é o grau de arrogância desse novo autoritarismo, o quanto nossos governantes estão determinados a recriar a realidade à imagem e semelhança de suas opiniões veementes. 

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Logan Brown, ‘homem trans grávido’, na capa da revista Glamour UK | Foto: Twitter/GlamourMagUK

O British Medical Journal chamou os autores da Declaração de Great Barrington de “mercadores da dúvida”, como se duvidar fosse uma coisa ruim, como se a dúvida na verdade não fosse a pedra fundamental do Iluminismo

A manipulação está em toda parte. Vemos uma sociedade industrial que goza de uma expectativa de vida mais alta, viu a pobreza reduzida e nos proporcionou as melhores proteções contra os caprichos mais violentos da natureza, e dizem que é uma “catástrofe climática”, o prenúncio da morte de bilhões de pessoas. Nós vemos, e amamos, os muitos avanços em igualdade racial que nos foram proporcionados pelo século 20, e dizem que a supremacia branca está pior do que nunca. Assistimos aos atos de violência islâmicos e ficamos preocupados, e chamam de “terrorismo motivado pela fé”, como se fossem atos anônimos, que não pertencem a ninguém e não significam nada. Diga “islâmicos”, e você será tachado de fóbico e herege.

Os novos caçadores de heresias empregam diversas táticas de demonização. Essa acusação de “fobia” é uma delas. Desviar das verdades que afirmam que o Islã é a religião perfeita, que é possível mudar de sexo e que o casamento homossexual é moralmente igual ao casamento heterossexual, e você será condenado como islamofóbico, transfóbico, homofóbico. “Negacionista” é outro sinal colocado no peito dos hereges modernos. Questione o alarmismo da mudança climática, e você se tornará um negacionista do clima. Aqueles que se incomodaram com o lockdown foram chamados de “negacionistas da covid”. Um observador chegou a associar os céticos do lockdown a demônios do inferno. “Como o Inferno de Dante, o negacionismo da covid-19 está estruturado em círculos concêntricos. O British Medical Journal chamou os autores da Declaração de Great Barrington de “mercadores da dúvida”, como se duvidar fosse uma coisa ruim, como se a dúvida na verdade não fosse a pedra fundamental do Iluminismo. “Se realmente busca a verdade, é necessário que pelo menos uma vez na vida você duvide, ao máximo, de todas as coisas”, afirmou Descartes. Descartes, o negacionista. 

Casa do Parlamento e Ponte de Westminster vazias em Londres, durante o lockdown | Foto: Shutterstock/Marton Kerek

Então, há alguns dias, em uma matéria de jornal sobre um estudo emblemático da Universidade Johns Hopkins, vemos a manchete: “O lockdown beneficia ‘uma parcela mínima se comparado aos custos’”. Isso estava claro para nós em 2020, mas fomos demonizados por nos manifestar. Essa é a infração mais cruel — ao constranger e silenciar os dissidentes, nossas descobertas de verdades novas e reais são adiadas. Nesse caso, o fato de que paralisar a sociedade, a educação, as liberdades civis e o comércio global provavelmente teria consequências devastadoras. Precisamos começar a nos manifestar. Começar a dizer as coisas que sabemos serem verdade. Seremos condenados como blasfemos, mas tudo bem. Como disse George Bernard Shaw, “todas as grandes verdades começam como blasfêmias”. Chega de manipulação, chega de policiamento de ideias, chega de punir quem fala a verdade. Hereges, uni-vos. 


Brendan O’Neill é reporter-chefe de política da Spiked e apresentador do podcast da Spiked. Seu novo livro, A Heretic’s Manifesto: Essays on the Unsayable, está à venda na Amazon.
Brendan está no Instagram: @burntoakboy

Leia também “O medo da liberdade de expressão”

6 comentários
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    O lockdown foi defendido em grande parte pela elite mesquinha, com sua renda garantida em meio a pipocas e Netflix.

  2. Marcelo Gurgel
    Marcelo Gurgel

    Ótimo texto

    1. Vanessa Días da Silva
      Vanessa Días da Silva

      O experimento com terapia genética é um exemplo dessa nova verdade. Chamaram esse veneno de vacina e quererem obrigar as pessoas a acreditar

  3. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    Querem implantar na marra um novo período de inquisição como o existente na idade média e moderna até o ano de 1789 quando a igreja católica punia com morte na fogueira aqueles que contrariassem seus dogmas e “verdades”.
    Vivemos tempos absurdos e uma nova inquisição está em gestação, só não sei se no útero de alguma mulher ou de um homem que se identifica como mulher.
    Só falta a fogueira e os algozes para atear fogo.

  4. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Quando pensamos que evoluímos, entramos no surrealismo

  5. Andre mendonça
    Andre mendonça

    👏👏👏👏👏👏👏
    A nova inquisição está aí, contra a razão e a realidade. Muito pior que a de Torquemada, que em princípio era contra ideias abstratas (fé), e não fatos concretos (colo de úteros! Etc).

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