Pular para o conteúdo
publicidade
Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura | Foto: Divulgação/FGV
Edição 181

‘O Brasil lidera o mundo em energia renovável e produção de alimentos’

Engenheiro agrônomo, ex-ministro, professor e agricultor, Roberto Rodrigues fala sobre o papel do agronegócio brasileiro no planeta

Artur Piva
-

Roberto Rodrigues, 81 anos, participou de momentos decisivos para o agronegócio brasileiro. Formado em engenharia agronômica pela Universidade de São Paulo, nasceu em Cordeirópolis, no interior do Estado, em uma família de agricultores. E é filho de Antonio José Rodrigues Filho — vice-governador paulista de 1971 a 1975, escolhido pelo presidente Médici para o cargo.

Entre as muitas colaborações, Roberto Rodrigues contribuiu com estudos para o Proálcool no Brasil, em 1974. Com admiração, cita Roberto Campos, um dos maiores liberais brasileiros. A ideologia não é um limitador. As melhores ferramentas são usadas para as missões de ensinar e ajudar o agronegócio brasileiro a crescer.

Quando Lula se tornou presidente pela primeira vez, em 2002, Roberto foi escalado para ser ministro da Agricultura. A tarefa e o simbolismo eram claros: a importância da agropecuária brasileira supera as questões ideológicas, de modo que era preciso um gestor liberal, técnico e independente para conduzir a pasta e atrair os investidores.

Assim foi feito, e ele saiu do cargo no meio do último ano do primeiro mandato do petista. Em seguida, retornou ao mercado privado e fundou o FGV Agro, o segmento dedicado ao agronegócio da Fundação Getulio Vargas — onde segue como professor emérito. Atualmente, seus dias são divididos entre reuniões de conselhos, palestras em eventos, entrevistas, debates e a fazenda da família em Guariba, no interior de São Paulo. Mesmo com cargos públicos e cadeiras em universidades renomadas, a vocação original nunca o abandonou: ele é agricultor.

Roberto Rodrigues contribuiu com estudos para o Proálcool no Brasil, em 1974 | Foto: Divulgação

Oeste entrevistou Roberto Rodrigues em seu apartamento, na cidade de São Paulo. Leia abaixo os melhores momentos.

O que o agronegócio do Brasil pode oferecer para o mundo?

O mundo está mergulhado em três coisas das quais quase ninguém escapa: segurança alimentar, energia limpa e mudanças climáticas. E o agronegócio do Brasil pode ajudar a responder a todas elas.

Qual é a importância da segurança alimentar para um governo?

Os governos precisam de uma população alimentada para se manter no poder. É uma questão para a estabilidade política e social. Há uma década, a Primavera Árabe aconteceu por falta de comida. E o governo do Sri Lanka caiu por isso no ano passado.

Como a corrida por alimentos impactou a inflação no mundo?

Quando a pandemia começou, os estoques globais de alimentos estavam baixos. Com o aumento da procura no mercado internacional, os seus preços dobraram em dólar. Isso gerou uma inflação mundial sem precedentes. Um desastre no mundo inteiro. Com o aumento dos preços dos alimentos, os produtores plantaram mais. Assim, cresceu a procura por itens como defensivos, adubos e máquinas. Mas as cadeias de produção estavam rompidas. Daí, mais inflação.

De que modo o agro do Brasil aparece como resposta às questões energética e ambiental?

O Brasil lidera o mundo em energia renovável e produção de alimentos. Por volta de 44% da nossa energia vem de matrizes renováveis, sendo 16% da biomassa do agronegócio. É etanol de cana-de-açúcar, de milho, biodiesel de soja, lenha, biometano das granjas de suínos e frangos. A agricultura brasileira entra com peso total na questão da segurança alimentar e da segurança energética mundial. E é o agro do cinturão tropical do planeta que vai resolver a questão ambiental. Essa região tem terra para abrir e precisa de tecnologia para aumentar a produção. O Brasil tem as ferramentas para isso e pode ser o grande fornecedor mundial de tecnologia e equipamentos para produção de energia, alimentos e manejo ambiental.

Por volta de 44% da nossa energia vem de matrizes renováveis, sendo 16% da biomassa do agronegócio | Foto: Shutterstock
Em que medida existe uma dependência entre Brasil e China no agronegócio?

Hoje, existe uma nova divisão em andamento no mundo que vai colocar em bancas antagônicas o Ocidente e a China. Do lado ocidental, há muita riqueza e poder, mas faltam liderança e estratégia. Ao passo que os chineses têm uma estratégia muito clara para proeminência econômica e política global. Esse cenário coloca o Brasil em uma posição ambígua.

De que maneira a posição brasileira se torna ambígua?

O Brasil é um país do Ocidente e depende da China. Mas também é verdade que os chineses dependem de nós. A relação é mútua: um país precisa do outro. Porém, é um tema de circunstância. Os chineses podem expandir a produção em outros continentes nos próximos dez anos, assim como fizemos aqui nas últimas décadas. Então, essa condição cria a necessidade de ampliarmos o leque de mercados no mundo todo, para reduzir a nossa dependência.

O que o governo brasileiro deve fazer nesse caso?

Precisamos de uma estratégia, e o ponto mais importante é fazer acordos comerciais. O presidente Lula esteve na China com uma grande delegação. Havia uma forte esperança de que ele voltasse com um acordo comercial, o que não aconteceu. Precisamos desses tratados para garantir mercado. A agricultura nacional pode chegar a 500 milhões de toneladas de grãos, bem mais que a colheita atual. Mas é preciso ter para quem vender.

Presidente da China Xi Jinping dá as boas-vindas a Lula | Foto: Ricardo Stuckert/PR/Agência Brasil
O setor de agroenergia pode trabalhar em sinergia com o setor de alimentos para viabilizar essa produção?

Quando o Proálcool começou, em 1974, houve uma grande reação da Academia. Falava-se que a cana ia atrapalhar os alimentos, que faltariam, por exemplo, arroz e feijão. Aconteceu o contrário. Os canaviais cresceram em áreas que não tinham modernidade em gestão. Isso levou tecnologia e desenvolvimento à produção rural dessas regiões. Assim, à medida que os canaviais aumentaram, cresceu mais ainda a produção de carnes e grãos. Essa complementação continuará acontecendo. Hoje temos álcool de milho, e nem por isso falta milho para as criações de galinhas e frangos. Houve a complementação, em vez da competição predatória.

Quais são as principais vantagens da agroenergia para o Brasil?

A agroenergia é uma vocação e uma tendência regional. Os modelos de energia vão se consolidar dependendo da matriz e dos insumos que os países tiverem. O carro elétrico, por exemplo, não é algo tão interessante para o Brasil. Temos o etanol, que é uma solução verde. Agora, na Europa, talvez eles prefiram continuar importando petróleo — mas não sabemos até quando. Contudo, a matriz energética brasileira hoje é tão melhor que é um exemplo aos países tropicais. A África pode fazer agroenergia também. O Brasil tem a oportunidade de ser o grande exportador de tecnologia para a construção de usinas de agroenergia, de adaptação de motores de carros para agrocombustíveis, de variedades adaptadas de cana, de legislação etc. Tudo que aprendemos a duras penas nos últimos 50 anos pode ser exportado e vale muito. Podemos liderar o mundo na matriz energética.

Por que o biodiesel ainda não decolou no Brasil?

Combustível é um tema sensível ao governo em qualquer lugar do mundo. Nós tivemos um problema com a Dilma Rousseff, que decidiu combater a inflação controlando os preços dos combustíveis. Com isso, a Petrobras perdeu muito valor e levou junto a agroenergia. A gasolina era vendida por valores abaixo do preço de compra lá fora, e o etanol não conseguiu acompanhar. A mesma coisa acontece com o biodiesel em relação ao diesel. Foi um desastre para o setor de bioenergia; muita gente quebrou. Isso não pode ser repetido no atual governo.

O etanol é uma solução verde | Foto: Shutterstock

Leia também “O assassino poderia ser o seu vizinho”

1 comentário
  1. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Não concordo com Roberto Rodrigues quando ele fala que o Brasil depende da China. O Brasil não depende da China, só se sobrevive com alimentos, então se a China não comprar todos os outros países compram, só é ajustar o preço e quando fala em mudanças climáticas, isso é uma mentira da Nova Ordem Mundial e quando fala nesse Lula, esse Lula é um zero pra qualquer assunto, até porque tá aí na fraude

Anterior:
Imagem da Semana: colheita de flores aquáticas
Próximo:
‘Não sou mais índia porque não estou nua?’
Newsletter

Seja o primeiro a saber sobre notícias, acontecimentos e eventos semanais no seu e-mail.