O presidente Luiz Inácio Lula da Silva já não esconde de ninguém que não suporta nada em que não possa intervir. Longe do princípio republicano de preservar e garantir a supremacia do interesse público e a autonomia das instituições, o presidente parece viver sob a crença pretensiosa de se achar o ungido dos céus enviado ao Brasil, a quem tudo seria permitido. Não é, sabemos. Mas a evidência da ingerência política palaciana está nas digitais de Lula na composição da direção da Petrobras e do BNDES desde 2023, para citar apenas dois exemplos, num retrocesso da Lei das Estatais. Mas o caso atual é ainda mais estridente, quase uma obsessão lulista: reclamar contra a autonomia do Banco Central que, ao contrário do que quer Lula, é uma conquista republicana e de segurança institucional do país na condução da política monetária para preservar o valor da moeda brasileira e assegurar o controle da inflação, tão arduamente conquistados pela genialidade das equipes econômicas de Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. O Plano Real, que venceu a hiperinflação e devolveu o país à civilidade da estabilidade econômica, teve voto contra do PT. O eleitor não perdoou, e Lula perdeu duas eleições seguidas já no primeiro turno, um tranco na sua vaidade.
Talvez por isso tudo o que seja avanço definitivo e preserve a autonomia do país em relação ao modus operandi do PT, autor da maior recessão da nossa história, em 2015 e 2016, ofenda a megalomania autoritária do presidente. Desde o começo do mandato, ao perceber que sua visão atrasada e de ingerência política mesquinha teria limites em algumas instituições, Lula tem sido incapaz de se referir ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, com o devido e mínimo respeito de apenas lhe chamar pelo nome. E olha que bastavam apenas os limites da liturgia do cargo presidencial para que a educação prevalecesse.
Envolto em um governo que não consegue sair do atoleiro fiscal em que se meteu, como consequência de ideias ruins próprias e de assessores diretos que oscilam entre a omissão e a incompetência, Lula voltou a atacar Campos Neto. A taxa Selic em 10,5% ao ano, consequência de uma decisão técnica sobre os fatos e que não sucumbe ao humor presidencial, é o pano de fundo para tentar criar um bode expiatório para um presidente que não sabe o que fazer na cadeira presidencial porque não sai do papel de candidato eterno. E não se governa em cima de palanque.
Semanas atrás, escrevi aqui na Revista Oeste o artigo “Eles já não sabem o que fazem”. À época, era apenas uma análise econômica de forma e conteúdo do atual governo. O cenário se deteriorou muito de lá para cá. O caos fiscal piorou, a percepção de que o governo está perdido se espraiou, sendo já registrada nas pesquisas de opinião, e, logo na segunda semana de junho, antes de completar um ano e meio de governo, um revés político que ainda não tinha experimentado aumentou o desespero do atual ocupante do Palácio do Planalto: o senador e presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco, praticamente um governista, não resistiu ao absurdo que recebera do governo e devolveu a Medida Provisória da Compensação. Tão ruim era a proposta que ganhou o apelido de “MP do Fim do Mundo” porque gerava enorme insegurança jurídica e mudava as regras do PIS e Cofins, enfim, uma tentativa sorrateira de fazer o setor privado pagar na marra o rombo das contas públicas de Lula 3.
O Frankenstein tributário criado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, era monstruoso o suficiente para fazer receita a qualquer custo, asfixiando o setor produtivo, e feio demais na forma, visto que não fora negociado com os parlamentares. Além do que, MP tem força de lei e passa a valer na data de sua publicação. Ainda pior, a medida provisória afrontava o princípio constitucional da noventena, que garante 90 dias de prazo para mudanças na legislação de tributos. Mas a afronta não parou por aí, foi também ao Congresso que já tinha rejeitado a reoneração da folha de pagamentos. A repercussão foi desastrosa para o governo. Diante da confissão de inabilidade técnica e política, aliados no Parlamento e no mundo empresarial não pouparam duras críticas públicas.
O governo sentiu a queda, e o ego de Lula não suportou. Precisaria encontrar novamente alguém a quem culpar pelos próprios erros e resultados de sua gestão temerária que tem causado estragos na moeda, nos juros futuros, na inflação, na bolsa e nos investimentos. O presidente e criador do lulopetismo-raiz, lembre-se, nunca assume a culpa de nada. Então, o que mais lhe estaria à mão que atendesse não apenas à sua mania de superioridade como também pudesse mobilizar mais alguns gatos pingados fiéis que compartilhariam de sua megalomania de poder a qualquer custo, defendendo ideias antiquadas que atrasam o país? Criticar os juros e o Banco Central foi a “genialidade” escolhida.
Na sequência, o “Lula raivoso”, que tem deixado aliados moderados inexplicavelmente surpresos, voltou novamente a sua verborragia inconsequente contra o presidente Roberto Campos Neto, que preside a instituição e também a reunião do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central. E nada como um dia depois do outro. Na última reunião do comitê, nesta semana, depois das falas temerárias de Lula, o Copom decidiu pela manutenção da taxa básica dos juros em 10,5% ao ano. E por unanimidade, o que significa dizer que até os quatro diretores indicados por Lula votaram para manter os juros, interrompendo o movimento de corte, uma decisão técnica que rejeitou a pressão política palaciana porque todos os diretores têm mandato garantido pela lei da autonomia do BC. A taxa básica de juros é uma das principais ferramentas para controlar a inflação, cuja meta é estabelecida — olha que coisa! — por três pessoas: os ministros Haddad e Tebet, do primeiro escalão do governo federal, e por Campos Neto. Não que Lula não tenha pensado em aumentar a meta de inflação para tentar artificialmente reduzir os juros, tendo dois votos no Conselho Monetário Nacional. Pensou, mas foi contido pelos raros sensatos ao seu redor.
Como nada melhorou sob seu comando, era preciso culpar alguém. Daí, com a ideia de confundir para tentar ganhar apoio, Lula reclamou, em entrevista à Rádio CBN, de uma homenagem que o presidente do Banco Central havia recebido, pouco tempo antes, da Assembleia Legislativa de São Paulo. A homenagem pública, transmitida ao vivo e acompanhada pela imprensa, foi seguida de um jantar que foi oferecido pelo governador Tarcísio de Freitas, na sede do governo paulista. Roberto Campos Neto tem empilhado prêmios no exterior pela gestão à frente do Bacen. Por que não receber reconhecimento interno com a mais alta condecoração da Alesp?
O sucesso alheio deve incomodar Lula. Mas neste caso há algo muito além da tecnicidade premiada das decisões de Campos Neto. Tarcísio de Freitas é nome em ascensão na política, bem avaliado na sua gestão à frente do governo de São Paulo, e é ligado ao ex-presidente Jair Bolsonaro, de quem foi um dos ministros de maior sucesso. Tarcísio e Bolsonaro não são o empecilho para melhorar as contas do governo Lula e de seus 39 ministros. O governador de São Paulo e o ex-presidente representam hoje a antítese de Lula, com gestões administrativa e fiscal bem-sucedidas, popularidade em alta e potencial eleitoral muito grande nas eleições municipais deste ano e no pleito de 2026.
Numa desabalada carreira solo, o governo apostou em forte aumento de gastos e no inchaço da máquina pública
Lula tem fome de poder. É só isso. Note que sua fixação com as eleições é tão grande que ele não se conteve na contradição de perguntar aos entrevistadores, numa ilação inconsequente porque sem provas, a quem “esse rapaz”, referindo-se ao presidente do Banco Central sem chamá-lo pelo nome, seria “submetido”, no sentido de subordinado a interesses de outros. Estranha a pergunta para quem, como o presidente Lula, indicou seu advogado pessoal para o Supremo Tribunal Federal. Aliás, o mesmo ministro que atendeu ao governo, em decisão monocrática, ao reonerar a folha de pagamentos, indo contra a segurança jurídica da Constituição e a decisão do Congresso. E, sim — nunca é demais rememorar —, Lula frequenta jantares em casas de ministros do Supremo.
No início de seu governo, ainda em 2023, Lula já havia feito Campos Neto como seu alvo, o que fez, inclusive, atrasar a queda da Selic logo nas primeiras reuniões do Copom no ano passado, encaminhada que já estava pelos bons resultados fiscais de austeridade como política de Estado, de Temer a Bolsonaro. E de crescimento econômico interno, com o Brasil atraindo investimentos privados locais e externos. Mas as críticas presidenciais descoladas do bom momento institucional e econômico do país, herdado do governo anterior, trouxeram o temor da volta de ingerência política no Banco Central e a revogação da lei da autonomia da instituição, o que só não aconteceu porque a ideia foi prontamente rechaçada pelos presidentes Lira e Pacheco, das duas Casas do Congresso.
Mas o barulho contido de um lado, no que dependia do Legislativo, não foi suficiente. Numa desabalada carreira solo, o governo apostou em forte aumento de gastos e no inchaço da máquina pública. Com isso veio o descontrole fiscal, que parece longe de solução diante da pouca aderência de Lula aos tímidos apelos por um mínimo de austeridade de sua própria equipe econômica. A mesma equipe que vive as agruras de ter liderado o fim da Lei do Teto de Gastos e criado um arcabouço fiscal em franco descrédito.
Isso tudo tem gerado um quadro de insolvência fiscal que só aumenta com o atual governo, como já lembrado nesta coluna, produzindo um rombo de proporções pandêmicas sem pandemia. Seria impensável tal temeridade não fosse conhecida e reafirmada a insensatez do inequívoco estilo perdulário de governar de Lula. Se o governo petista fosse capaz de fazer bem sua lição de casa, nem as eventuais instabilidades da economia internacional — que não controlamos e que hoje são muito menores que o caos da covid-19 e o início da guerra na Ucrânia — seriam um problema. Por erros internos, o Brasil sai do mapa de soluções e de lugares aptos a receber investimento.
Pífio em sua gestão, o Lula 3 não tem conseguido apresentar soluções factíveis e dobra a aposta em erros de gestão e comunicação. Não por acaso, perde apoio de aliados ao criar excrescências como a MP do Fim do Mundo, que gerou um nó político difícil de desatar.
Enfim, não é o reflexo das medidas que Roberto Campos Neto acerta em tomar no Banco Central para controlar a inflação o que gera problemas para a economia do governo Lula. Os problemas do país estão no reflexo de quando o presidente e sua equipe se olham no espelho.
Leia também “A redescoberta da pólvora sobre Lula 3”
Cada vez mais evidente a excrescência desse desgoverno. Sem a ajuda divina, não sei o q será desse país, já que da nossa justiça nada podemos esperar .
A classe operária, principalmente no Nordeste que optou pelo “L”, o fez por absoluta ignorância. É perdoável em país que nunca priorizou o ensino como uma das principais ferramentas para a geração de ciência, crescimento econômico e desenvolvimento.
A turma da velha imprensa, da Faria Lima e de empresários do calibre de Rubens Ometto que tiveram a mesma infeliz ideia, certamente estavam em busca de facilidades e oportunidades.
O atual governo Dilmou e em 2025 com a mudança na presidência do BC estaremos caminhando a passos largos para a repetição da catástrofe econômica de 2015/2016.
Um presidente analfabeto e 39 ministros que não servem ao Brasil para nada. O Taxxad nunca estudou economia. Esperar o quê?
É tudo de caso pensado. Eles já sabem onde ” meter a mão” para levar vantagem, e lucrar alguma ” grana”. Vide agora o caso do “ARROZÃO” . Uma mercearia do Amapá com capital de 80 mil reais venceu uma licitação de quase 600 milhões. O Alkmin descobriu o local da cena do crime deu as mãos para o Larápio foi lá e bradou: VIVA LULA, LULA LULA. Alguém tinha alguma dúvida…???
Esse Lula esse PT esses 40 ministros esses tribunais superiores esse MP esses parlamentares de esquerda são uns excrementos da política e da administração pública brasileira
Sr. Adalberto, um reparo quanto ao título do artigo anterior: Eles sabem o que fazem.
Piotto por que a equipe da Revista Oeste sem filtro não dedica 1 hora por dia para entrevistar tucanos e celebridades (economistas, cientistas políticos, parlamentares e jornalistas da velha imprensa) que pareciam ser centro direita que fizeram o “L” ? Por exemplo FHC para nos dizer o que acha da FARSA do 8 de janeiro, do VOTO IMPRESSO que os tucanos e lideranças de quase todos os partidos defenderam em 2015, daquelas CPIs da Pandemia e do 8 de Janeiro, dos inquéritos do fim do mundo do STF e do dispendioso TSE e suas condenações e cassações de mandatos, do que confessou em seus “diários da presidência”?. Provavelmente muitos não aceitaram o convite, mas ao menos saberemos quem teme falar deste desgoverno criado por eles.
Voto impresso, inclusive, que é adotado na Espanha, Itália, Alemanha, França, Portugal, Argentina, Equador, Bélgica, e tantos outros.
Após a falcatrua de 2022, tenho acompanhado todas as eleições no mundo, e nenhuma tem alguma similaridade com as urnas eletrônicas de Luis Roberto Barroso e Alexandre de Moraes.
Excelente texto. O problema maior estar por vir com a saída de Campos Neto. Direto para o abismo.
Ele tem consciência de que não se pode abaixar os juros neste momento, mas ele é mentiroso, desonesto, faz uma política rasteira e escolhe um culpado para ludibriar os poucos brasileiros ainda desinformados.