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Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock
Edição 225

Governo de toga

Sem força no Parlamento, Lula conta com a ajuda do Supremo para impor a agenda de esquerda no 'tapetão'

Cristyan Costa
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Há três anos, um levantamento de Oeste constatou o óbvio: o Supremo Tribunal Federal (STF) atrapalhou Bolsonaro, impedindo-o de governar o país como queriam seus eleitores. De 2019 a 2021, foram 124 decisões hostis proferidas pelo tribunal, que obrigaram o presidente a dar explicações, barraram a nomeação de pessoas de confiança para cargos no topo do Poder Executivo e o mandaram até resolver, em três anos, todos os problemas do sistema carcerário brasileiro, acumulados ao longo de cinco séculos.

Na gestão Lula 3, contudo, a conduta da Corte deu um giro completo. Desde a volta do petista ao poder, que agora não tem maioria no Congresso Nacional e tampouco consegue comprá-lo como nos tempos do Mensalão e do Petrolão, o STF tem ajudado o presidente a viabilizar parte da agenda prometida na campanha eleitoral e também a se livrar de pautas aprovadas pelo Parlamento que contrariem o PT.

Ministro Dias Toffoli durante a Sessão Plenária no STF realizada no dia 13 de junho de 2024 | Foto: Andressa Anholete/SCO/STF
Ajuda na economia

Até o momento, o STF deu ao governo petista 13 vitórias relevantes no campo econômico. Uma delas saiu logo nos primeiros três meses depois da posse de Lula, quando o então ministro Ricardo Lewandowski — que deixaria o tribunal dali a poucas semanas — flexibilizou a Lei das Estatais ao acolher uma ação do PCdoB, legenda que faz parte da federação partidária do PT. Legado da Lava Jato, e criado para impedir o aparelhamento político de bancos e empresas estatais, o dispositivo tornado inconstitucional por Lewandowski dificultava indicações políticas. Em linhas gerais, ele previa uma espécie de quarentena para que integrantes de partidos pudessem ocupar cargos-chave nas companhias.

Com o mecanismo derrubado, o STF permitiu ao PT voltar ao comando das estatais. Aloizio Mercadante pôde ocupar a presidência do BNDES, o ex-senador Jean Paul Prates passou ao comando da Petrobras, e Paulo Câmara, ex-governador de Pernambuco e aliado de Lula, entrou para a chefia do Banco Nordeste. Além disso, a canetada pró-governo abriu portas para mais de cem nomeações, o que ajudou o Palácio do Planalto a negociar o apoio do centrão no Parlamento com cabides de emprego. Ainda naquele mês, Lewandowski validou um decreto de Lula contra a redução de impostos federais que Bolsonaro havia assegurado à iniciativa privada. O entendimento do juiz do STF tirou R$ 6 bilhões do empreendedor para dar aos cofres da União.

Lula obteve avanços também na Eletrobras, privatizada por Bolsonaro. No fim de 2023, Nunes Marques atendeu à Advocacia-Geral da União (AGU) e mandou o caso para “conciliação”. No processo, a AGU afirmou que, como acionista da Eletrobras, a União tem o direito de votar de forma proporcional à participação que ela detém no capital social da empresa.

Num tuíte, a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, disse que a posição do partido é pela retomada da empresa “como ela era”. Para fechar 2023, o presente de Natal veio no julgamento que tratou da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios. Os ministros suspenderam um trecho da PEC aprovada com o apoio de Bolsonaro. Com isso, Lula pôde fazer parte dos pagamentos fora do teto, e sem infringir regras fiscais, livrando-o de um eventual processo de impeachment.

O STF permitiu ao PT voltar ao comando das estatais. Aloizio Mercadante pôde ocupar a presidência do BNDES | Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Neste ano, uma das ações mais relevantes para o governo obtida na Corte saiu do gabinete do ministro Cristiano Zanin, ex-advogado de Lula e indicado por este para substituir Lewandowski. Em maio, a AGU acionou o magistrado e conseguiu suspender a desoneração da folha de pagamentos, aprovada por ampla maioria no Congresso. Antes de os 60 dias do prazo expirarem, Zanin restabeleceu o benefício fiscal a pedido do governo. Isso porque o Executivo havia conseguido um meio-termo com empresários. Dias depois, Lula admitiu que provocou o STF no intuito de forçar “o mercado a sentar à mesa e negociar”.

O empenho do STF em ajudar o Planalto afetou até mesmo os atuais e futuros aposentados, que terão agora seus rendimentos comprometidos sob o pretexto da União de “economizar”. Com o endosso do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a Corte mudou de ideia quanto ao cálculo popularmente chamado de “revisão da vida toda”, aprovado pelo tribunal em 2022. Os votos de Zanin e Flávio Dino foram cruciais para o resultado, que agradou Haddad. De acordo com o ministro, o STF evitou uma “meta fiscal deficitária” de R$ 480 bilhões em 2025. Resumidamente, só no campo econômico, entre janeiro de 2023 e abril deste ano, as conquistas do governo Lula no tribunal somaram R$ 1 trilhão em favor da União, conforme pesquisa do site Poder360.

O empenho do STF em ajudar o Planalto afetou até mesmo os atuais e futuros aposentados | Foto: Reprodução/Ministério da Previdência Social
Avanço da agenda política

O STF vem favorecendo não apenas a agenda econômica do PT mas também a seara política. Uma das áreas é a segurança pública. Histórico defensor do desarmamento da população, o governo petista, novamente por meio da AGU, conseguiu derrubar no Supremo três leis estaduais nesse campo, enquanto outras sete aguardam deliberação dos ministros. Dessa forma, os parlamentares do Paraná, Rio Grande do Sul e Espírito Santo acabaram desautorizados pelo STF. Enquanto nos outros dois Estados os dispositivos anulados tratavam dos CACs, no caso capixaba o STF não permitiu o porte de armas de fogo para vigilantes e seguranças que atuam em empresas públicas e privadas. À época da aprovação do mecanismo, o Espírito Santo alegou o aumento da violência para aprovar a medida na Assembleia Legislativa.

A mais recente investida pode aumentar a base do governo na Câmara. Por meio de uma ação do PSB, os ministros devem cassar o mandato de sete deputados. Caso o entendimento atual se mantenha, os atuais congressistas serão trocados pela fila de suplentes do Psol, PCdoB e PSB

A saúde é outra frente na qual o PT conseguiu ganhos. Em junho, os ministros reiteraram a constitucionalidade do Mais Médicos. Além disso, estabeleceram que a abertura de novos cursos de medicina tem de seguir as regras previstas no edital do programa. Depois dos 13 primeiros anos do PT no poder, já no governo Michel Temer, descobriu-se que a iniciativa continha uma série de irregularidades, entre elas a exploração de médicos cubanos. Em 2017, quase 200 ações na Justiça davam conta de abusos contra esses profissionais, que pediam para não voltar a Cuba, além de exigir o pagamento integral do salário. De acordo com as denúncias, um médico que recebia cerca de R$ 10 mil ficava com apenas R$ 2 mil. O restante ia para a ditadura.

Nísia Trindade, ministra da Saúde, outra frente na qual o PT conseguiu ganhos | Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

O desprezo do Executivo pelo agronegócio e pelo direito à propriedade privada, velado no programa de governo de Lula, não ficou de fora. Embora nesse caso não tenha movido ações no STF via AGU, o governo Lula apoiou indiretamente a queda do marco temporal no STF. Na ocasião do julgamento, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, deu declarações públicas endossando a decisão dos ministros. Posteriormente, quando o Congresso restabeleceu o marco, Lula vetou trechos da medida e a devolveu para o STF deliberar. Embora ainda não haja decisão concreta, é possível que os ministros façam valer o resultado do julgamento que acabou com o mecanismo.

A mais recente investida pode aumentar, ainda que em pequena quantidade, a base do governo na Câmara. Por meio de uma ação do PSB, sigla do vice-presidente Geraldo Alckmin, os ministros devem cassar o mandato de sete deputados, entre eles Sílvia Waiãpi (PL-AP). Há poucas semanas, a Corte formou maioria contra as chamadas sobras eleitorais, que possibilitam a eleição de parlamentares por votos restantes da eleição para o Legislativo. Em virtude de um pedido de destaque de André Mendonça, contudo, o placar foi zerado e será decidido no plenário físico. Dificilmente o resultado será revertido. Caso o entendimento atual se mantenha, os atuais congressistas serão trocados pela fila de suplentes do Psol, PCdoB e PSB.

Durante o julgamento que descriminalizou o porte de maconha para uso pessoal — apoiado publicamente por integrantes do primeiro escalão de Lula —, o ministro Luiz Fux soltou um grito preso há muito tempo na garganta de milhões de brasileiros. “Nós não somos juízes eleitos”, constatou o único ministro do STF que é magistrado de carreira. “O Brasil não tem governo de juízes, e é por isso que se afirma e se critica, com vozes intensas, o denominado ativismo judicial.” Ainda segundo Fux, “quando se acusa o Judiciário de se introjetar nas searas dos demais Poderes, isso para o Judiciário é uma preocupação cara e muito expressiva”.

“Nós assistimos cotidianamente ao Poder Judiciário sendo listado a decidir questões para as quais não dispõe de capacidade institucional”, afirmou Fux. Ele disse o óbvio: é o que diz a Constituição em vigor, mas seus colegas de toga fingem esquecer.

Leia também “Tempos de treva”

15 comentários
  1. Davis Gomes da Silva
    Davis Gomes da Silva

    O STF é um lixo! O povo tem que prender todos estes vagabundos

  2. Davis Gomes da Silva
    Davis Gomes da Silva

    O STF é um lixo! O povo tem que prender todos estes vagabundos

  3. Antonio Carlos Neves
    Antonio Carlos Neves

    Crystian, excelente artigo, mas eu dispensaria o elogio ao ministro FUX que é contraditório quando acompanha o relator Moraes nas ilegais e incompetentes julgamentos dos “réus” da farsa do 8 de janeiro. Em teu último parágrafo você ressalta a fala de Fux ” Nós assistimos cotidianamente o Poder Judiciário sendo listado a decidir questões para as quais não dispõe de capacidade INSTITUCIONAL”.
    Afinal, essa fala de Fux não caberia nesse julgamento em última instância da JUSTIÇA, de patriotas sem antecedentes criminais que sempre foram pacíficos, a penalidades superiores às de criminosos corruptos, traficantes, estupradores, sequestradores e assassinos que detidos em flagrante são julgados em 4 instâncias até transitado em julgado para serem presos pelos crimes cometidos?.
    Pois é, Fux vem acompanhando as penas que Moraes propõe de até 17 anos para brasileiros decentes, unicamente revoltados com o que ocorreu em nosso pais em 2022 com o aval do TSE e STF.

  4. Valesca Frois Nassif
    Valesca Frois Nassif

    Excelente artigo! Pena que escancare nossa trágica situação : estamos em uma armadilha da qual não conseguimos escapar. Angustiante ! Desesperador !

  5. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    Por omissão do Presidente do Senado – Rodrigo Pacheco – estamos na pior ditadura que existe, a ditatura do judiciário representada pelo consórcio PT/STF/TSE.

  6. Brian
    Brian

    E tudo por culpa de um único brasileiro: Rodrigo Pacheco.

  7. Liliane Maria Lemos De Paula Martins
    Liliane Maria Lemos De Paula Martins

    Brilhante texto, Cristyan. E revoltante saber que não temos para onde correr.

  8. Alair Batista Pinto
    Alair Batista Pinto

    Gracias

  9. Francisco José Coelho de Morais
    Francisco José Coelho de Morais

    #STFGolpista

  10. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    É uma quadrilha, que age sem pudor contra os interesses da sociedade brasileira.

  11. Ivan Sérgio de Paula lima
    Ivan Sérgio de Paula lima

    Parabéns pelo texto! Muito bom tê-lo como articulista na Oeste!

  12. Marcelo Gurgel
    Marcelo Gurgel

    Lamentável

  13. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Esse supremo tem que ir pra cadeia, isso é um covil de criminosos, a favor de um governo ladrão narcotraficante genocida terrorista

  14. MNJM
    MNJM

    Cristyan parabéns pela matéria. STF é uma Instituição política, descondenaram Lula, o elegeram e agora atuam para proteger e ajudar o governo. O PGR foi indicado por Gilmar Mendes e apoiado por Moraes, todos fazem parte de uma “turma” , como disse Barroso em palco da UNE “derrotamos o bolsonarismo”.
    Essa é a Suprema Corte do país, grande parte da sociedade reprova as ações dos togados políticos além de perseguição aos opositores do atual governo. Vergonhoso..

  15. MC75
    MC75

    O stfede faz parte do problema, jamais da solução! É o “braço legal” do crime organizado que hoje “governa o país. O ladrão de 9 dedos é o narcopresidente, e o careca e o Dino, assim como o resto da camarilha instalada na corte, o suporte que os bandidos precisam.

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