Você gostaria de viver para sempre? 200 anos? 250? 500? Com saúde? Essa é a questão que está sendo levantada há décadas pelo cientista, inventor e ex-engenheiro-chefe do Google Ray Kurzweil. Kurzweil acabou de lançar seu novo livro, The Singularity Is Nearer When We Merge With AI (“A singularidade fica mais próxima quando a misturamos com inteligência artificial”, numa tradução livre).
Nascido em Nova York há 76 anos, Kurzweil tem no seu currículo a participação em alguns dos maiores avanços tecnológicos dos últimos tempos — reconhecimento de fala, tecnologia da saúde, inteligência artificial e transumanismo. E ele é obcecado por longevidade. Declarou à revista Wired que hoje em dia toma 80 comprimidos por dia. Já foram 200.
O transumanismo não tem nada a ver com políticas identitárias. É uma corrente de pensamento que propõe o que em parte já está acontecendo com quase todos nós: a fusão do ser humano com a tecnologia.
Kurzweil fala não só da fusão do corpo com computadores, mas também da fusão da mente. Segundo ele, essa poderá ser uma nova etapa da civilização. Antes era calculada para iniciar lá por 2050. Mas, com a aceleração das conquistas tecnológicas, ele está vendo esse prazo se tornar cada vez mais próximo.
Quando chegaremos à AGI?
Kurzweil falou numa palestra para o TED sobre a súbita rapidez dessa evolução: “Em 1939, um computador era capaz de fazer 0,0000007 cálculo por segundo. Hoje, temos um computador do Google que faz 130 bilhões de cálculos por segundo. Recentemente, a Nvidia apresentou um chip que faz meio trilhão de operações por segundo. Há três anos, os modelos de linguagem não funcionavam muito bem. Há dois anos, começaram a funcionar”.
O grande salto deve acontecer com o estabelecimento da AGI, sigla de artificial general intelligence (“inteligência artificial geral”, em português). Refere-se a um tipo de inteligência artificial que possui a capacidade de entender, aprender e aplicar conhecimento de maneira geral, similar à inteligência humana, com versatilidade, autonomia, raciocínio, entendimento e aprendizado contínuo. Quando chegaremos ao estágio da AGI?
Kurzweil, que é especialista em previsões (algumas viraram matéria de estudos em Harvard), diz que o prazo está encurtando. “A estimativa era de cem anos. Hoje, Elon Musk diz que vai acontecer em dois anos. Não é uma opinião absurda. Outras pessoas falam em três ou quatro anos. Eu continuo achando que serão cinco anos. Mas pode acontecer antes.”
O teste de Turing
A palavra-chave usada por Kurzweil é “singularity”, ou “singularidade”. Ela se refere a um ponto hipotético no futuro em que o crescimento tecnológico se tornará tão rápido e complexo que resultará em mudanças imprevisíveis e irreversíveis na sociedade humana. Essas mudanças, por sua vez, levarão a um momento em que as máquinas inteligentes ultrapassarão a inteligência humana. Pense no impacto que a internet provocou na vida de todos. E multiplique isso muitas vezes.
Um dos marcos de um estágio superior de inteligência artificial é o teste de Turing. (O matemático inglês Alan Turing foi o protagonista do filme O Jogo da Imitação, com Benedict Cumberbatch.) O teste consiste mais ou menos no seguinte: você está num computador, conversando com alguém. Hoje, é mais ou menos fácil dizer se quem está do outro lado é um bot (ou “uma máquina”), mas um dia acharemos que é um humano que está falando conosco, mesmo quando não for. Humanos e máquinas falarão a mesma linguagem, com a mesma autenticidade. Será impossível distinguir o que é humano do que é fruto de uma inteligência artificial. E nesse momento a tecnologia terá vencido o teste de Turing. Kurzweil acredita que isso deverá acontecer em 2029.
Nanorrobôs na corrente sanguínea
Essa possibilidade naturalmente provoca algum medo. Novidades radicais assustam. Imagine como uma pessoa do século passado recebeu a notícia de que teria eletricidade na sua casa. Ou um viajante que descobriu que poderia ir a outro continente numa máquina aérea. O conceito da singularidade envolve possibilidades que hoje parecem milagres.
Uma das chaves para essa nova era são os nanorrobôs. Eles são menores que moléculas. Poderão ser injetados na corrente sanguínea e circular pelo nosso corpo como vigilantes da nossa saúde. Serão programados para atacar, por exemplo, células cancerosas.
Não será um ataque massivo, no sentido atual da rádio e da quimioterapia, que equivalem a um bombardeio. O tratamento por nanorrobôs será um combate corpo a corpo, com cada robô sabendo o que fazer para acabar com cada célula cancerosa. Poderá ser, a princípio, o fim do câncer. E de todas as doenças que costumam vir com o envelhecimento.
Médicos só conseguem pensar num número limitado de procedimentos para combater uma doença. Faz parte da natureza humana. Computadores quânticos ou similares poderão analisar milhões de opções ao mesmo tempo. E colocar uma grande série de opções na fila para agir com velocidade e eficiência máximas.
Ray Kurzweil definiu esse momento de ruptura, em entrevista para a revista Wired, desta forma: “Para mim, [a singularidade] acontecerá quando um ser humano for capaz não só de fazer tudo o que as outras pessoas podem fazer, mas também de criar algo novo, como curar certas formas de câncer. A IA é fundamental para fazer isso, porque você pode realmente experimentar todas as combinações possíveis de coisas que podem curar o câncer. E, em vez de perguntar qual desses bilhões de curas possíveis vamos tentar, podemos tentar todas e simulá-las em poucos dias. A singularidade é quando podemos realmente combinar esse tipo de pensamento com nosso pensamento normal, de modo que nos tornamos sobre-humanos”.
‘Não existe um teto’
Segundo Ray Kurzweil, no início da década de 2040 a nanotecnologia permitirá mudarmos nosso corpo, nos possibilitará “correr muito mais rapidamente e por maiores distâncias, nadar e respirar sob o oceano como peixes, e até mesmo ter asas”. Faltam apenas 16 anos para 2040.
O cientista falou para a Wired: “A biologia tem um monte de limitações. Muitos analistas sentem que não existe nada inevitável com relação à morte, e nós estamos aparecendo com algumas coisas para interrompê-la. Basicamente nós podemos nos livrar da morte por envelhecimento. (…) Não existe uma razão para parar aos 120. Não existe um teto. Uma vez que passemos pela singularidade, seremos capazes de inserir algumas conexões de IA dentro do nosso cérebro. Elas não estarão literalmente dentro do cérebro; ele estará conectado à nuvem”.
Esse passo culmina “na expansão direta de nosso cérebro com camadas de neurônios virtuais na nuvem”, escreveu Kurzweil em seu novo livro. “Dessa forma, vamos nos fundir com a IA e aumentar em milhões de vezes o poder computacional que a nossa biologia nos deu. Isso expandirá a nossa inteligência e consciência tão profundamente que será difícil compreender. Esse evento é o que quero dizer com singularidade.”
Seu backup na nuvem
Ray Kurzweil fala na expansão real de nossa capacidade cerebral. Alguns nanorrobôs combatem células malignas. Outros estacionam em nosso cérebro e permitem o contato direto de nossa mente com sistemas de computação na nuvem.
Isso quer dizer que faremos parte de nuvens, e nos comunicaremos com elas como nossos computadores se comunicam hoje. Você pensa, por exemplo, em como está o tempo em Singapura neste momento, e então você vê. Senta-se num restaurante e fica sabendo os resultados da rodada, porque desejou isso. Como define Ray Kurzweil, “poderemos escalar o Monte Everest, assistir a uma ópera ou fazer uma rica experiência sensorial de férias na praia para toda a família” — tudo em nossa mente.
Kurzweil compara a experiência com o uso que fazemos dos celulares agora. “Pense como se você tivesse um celular, mas no seu cérebro. Se você fizer uma pergunta, seu cérebro será capaz de ir até a nuvem para uma resposta similar à que conseguimos com nossos celulares agora. Será apenas um instante, e você não vai perceber que aconteceu.”
Isso quer dizer que todos os nossos pensamentos, sentimentos, conhecimentos, informações poderão ter um backup, como temos de nossos documentos e fotos hoje. (Tudo isso, é claro, deverá depender da sua autorização.) Uma vida inteira poderá ser guardada na nuvem. Todos os dados que passaram pelo cérebro de uma pessoa, preservados em bytes.
A vida sem utopias
Esse backup poderia ser conectado a uma plataforma de inteligência artificial com a sua cara. E, quando você partisse, seu cérebro de alguma forma continuaria a “pensar”. Seus descendentes teriam uma espécie de cover seu para terem uma ideia de como você era. E isso também significa, de certa forma, uma vida eterna.
Sim, tudo pode dar errado. Todo o sistema de aposentadoria entraria em colapso com as pessoas vivendo por 250 anos. Esses avanços podem virar terríveis armas de guerra e provocar o fim do mundo etc. O mesmo potencial estará nas mãos de bandidos, terroristas e ditadores corruptos. Tudo pode, ainda, simplesmente não ter a chance de se concretizar num mundo que flerta todos os dias com o apocalipse.
O terreno de Ray Kurzweil é o da utopia pessoal, individual, em busca de uma vida melhor. E de riqueza mais profunda em nossas experiências
Mas a humanidade não evolui se os pessimistas estabelecerem as trevas da desesperança. Jules Verne escreveu sobre submarinos, viagens à Lua e robôs funcionais em pleno século 19. Deixou a imaginação correr solta, pois não evoluímos com a mente encarcerada pelo medo. “A mente é como um paraquedas”, disse uma vez o compositor Frank Zappa. “Só funciona se estiver aberta.”
Sem utopias, nossa experiência na Terra não tem sentido. Não estamos aqui falando de utopias coletivas e políticas, que geralmente terminam em catástrofe. O terreno de Ray Kurzweil é o da utopia pessoal, individual, em busca de uma vida melhor. E de riqueza mais profunda em nossas experiências.
Onze dimensões
O cientista visionário esbanjou otimismo num evento do TED em abril deste ano: “Nós teremos um monte de recursos. Quando chegarmos à década de 2030, nanobots vão conectar nosso cérebro com as nuvens da mesma forma que seu celular faz. Até 2045, vão expandir a inteligência 1 milhão de vezes. Esta é a singularidade. Seremos mais engraçados. Mais sexy, mais espertos, mais criativos, livres de limitações biológicas. Seremos capazes de escolher nossa aparência. Seremos capazes de fazer coisas que não podemos fazer hoje, como visualizar objetos em 11 dimensões. Poderemos falar em todas as línguas. Nós seremos capazes de expandir a consciência de maneira que mal podemos imaginar hoje. Vamos experimentar uma maior riqueza cultural com nossos anos extras de vida”.
Utópico? Provavelmente. Otimista? Sem dúvida. Ray Kurzweil reconhece que existem muitos perigos nesse caminho. Mas não fica paralisado pelas possibilidades ruins. Pensa no melhor que pode acontecer. Pois, se todos pensarem no pior, não teremos a menor chance.
Leia também “Do telefone de discar ao WhatsApp”
Muito interessante o artigo, embora discorde de muitas coisas, pois acredito nas verdades bíblicas.. Mas acho esse tipo de assunto bem legal para se refletir.
Isso seria terrível para a humanidade. Já pensou LULA governando com o PT mais 40 anos este pais ?
Legal a reportagem da vida eterna , fugir um pouco da política , variedades nos assuntos .
Legal a reportagem da vida eterna , fugir um pouco da política , variedades nos assuntos .
Desejo ver mais reportagem como esta, muito legal sobre a tecnologia , fugir um pouco da política .
Interessante.
Que a revolução da informática se insere entre as grandes transformações da história humana, disso não resta dúvida. Isso tem estimulado o surgimento de muitos “Nostradamus”, que sabem tirar vantagens marketeiras de previsões que sacodem o público. É o caso do Ray Kurzweil. Ele sabe fazer o papel de animador nesse tipo de espetáculo midiático. E aquilo que chamam de IA aparece agora como a panaceia da vez. Só que de nada adianta montes e montes de cálculos por segundo quando se trata de inteligência, pois o pensamento é uma ação consciente da mente para muito além de operações meramente formais, como é o caso do algoritmo, procedimento estritamente mecânico e regrado. Sempre que experimento os softwares de “inteligência artificial” para “criar arte”, minha afirmação acima é respaldada. Na última vez que dei a estes softwares a chance de provar sua “inteligência”, eu pedi uma imagem futurista da cidade paraibana de Catolé do Rocha, situada no alto sertão da Paraíba, em estilo renascentista. Caso fosse pedido a um verdadeiro artista, essa encomenda certamente teria na preciosa pintura do italiano Piero della Francesca, “A cidade ideal”, de 1470, um modelo perfeito – perspectiva paralela com ponto de fuga central, característico da estilística visual da época, mostrando um cenário idealizado de uma típica cidade italiana. Mas o que recebi de encomenda foi uma paisagem marinha, com gaivotas e tudo, com edifícios que pareciam chupados das obras de Moebius e Syd Mead. Ridículo! A não ser que o objetivo fosse aquele dos repentistas nordestinos, que há décadas dizem em suas cantorias que um dia o sertão vai virar mar! Mas justiça seja feita: a imagem foi entregue em 57 segundos! Ora! Quem é mesmo que está ligando para fuleragens como originalidade e inteligência, não é?!
O caminho para a paz e felicidade é a quietude. “Aquietai-vos e sabeis que Eu sou Deus! “ Medite profundamente e encontrarás Deus. Viva Kryia Yoga!
O negócio é tão dimencional que eu continuo nas nuvens da atmosfera. Vou consultar alguém do PT para esclarecimento, quem sabe Fátima Bezerra ou Vicentinho ou Chico Vigilante ou Quá Quá. Mas Quá Quá quier o nome? Ah lembrei, SINGULARIDADE. Já temos um, que é Lula
Parece muito com aquele filme Matrix. Onde as pessoas vivem em um transe mental, escravos das máquinas. Trabalho com tecnologia, mas é muito poder para entregar nas mãos de um ser humano ou de uma máquina.
Quanta bobagem. Revista Oeste defendendo transumanismo?
Não. Mas te explicando sobre ele.
Foi exatamente o que pensei. Se todas as previsões deste cientista se concretizarem, ficaremos todos loucos, viajando sem sair do lugar, só no mundo virtual (muitos já estão assim, quase loucos com o excesso de informação), conversaremos com com robôs e as relações interpessoais acabarão e pior, viveremos 250 anos uma vida fria e como máquina.
Cruz credo.
A “árvore do conhecimento do bem e do mal” continua firme e forte.
Há uma obra dele que trata das previsões para um futuro imerso em tecnologias denominada: A Era das Máquinas Espirituais. Embora aprecie o talento desse cientista e escrito, criador do primeiro sintetizadore de voz, tenho minhas restrições por falar certas “bobagens”, quando pensa que o ser humano não passa de um sistema bioeletroquimico, passível de ser reconstruído através de simples equações matemáticas.
Não discuto a possibilidade de um clone digital, com base no volume de dados de cada individuo disponíveis nas redes sociais; porém esse clone será uma mera reprodução do passado de um individuo, visto que sua criatividade será uma mera representação de seu repositório em big data de seu passado!
falta saber o que é inteligência, ainda compartilho as idéias de Roger Penrose, e IA de hoje é apenas propaganda enganosa, só temos computadores com capacidades imensas de memória e rapidez, e capazes de simular frases copiadas e modificadas da net (que por sinal mostra bem o viés esquerdopata que domina o ocidente)…nenhum teste que fiz do ChatGPT e do copilot mostrou sinal de inteligência (mas são ótimas máquinas de pedir desculpas assim que você aponta seus erros, alguns ridículos como mostrar uma fórmula correta para um problema e depois colocar números e dar a resposta errada somente para concordar com o que eu disse que era a resposta certa, e que não era…para ficar num exemplo simples…
Que medo!
Desconhecendo o propósito da sua existência, o homem está sempre tentando ser igual a Deus. Alguém já disse, há dois mil anos: “Considerando-se sábios, tornaram-se loucos”.