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Atletas da Grã-Bretanha no desfile flutuante no Rio Sena, durante a Cerimônia de Abertura da Olimpíada de Paris 2024 (26/7/2024) | Foto: Reuters/Claudia Greco
Edição 228

Por uma Olimpíada livre da cultura woke

A maioria de nós assiste a eventos esportivos porque está interessada ​​no esporte em si

Ella Whelan, da Spiked
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Pelo jeito, não é só a habilidade esportiva que se espera que os atletas olímpicos britânicos aperfeiçoem agora. Quando voltarem da Olimpíada de Paris, que começaram na noite de 26 de julho, eles também estarão sob pressão para se tornarem ativistas políticos.

Em março, as equipes Team GB, a ParalympicsGB e o UK Sport — o órgão governamental responsável por investir nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos — anunciaram uma nova iniciativa: ChangeMakers. O projeto, patrocinado pela Loteria Nacional britânica, tem como objetivo financiar e treinar atletas que, ao voltarem para casa, “escolhem o projeto de impacto social que desejam apoiar”. Espera-se que esportistas “usem sua voz para fazer a diferença”.

Claro, não é nenhuma novidade que personalidades dos esportes usem sua fama para defender “causas sociais”. Campanhas e organizações beneficentes estão igualmente ansiosas para usar as celebridades para conseguir um pouco de publicidade. Também não é uma nova empreitada para o UK Sport, que tem uma longa lista de projetos de “assistência”.

Equipe britânica em frente à Torre Eiffel, durante a Cerimônia de Abertura dos Jogos Olímpicos de Paris 2024 (26/7/2024) | Foto: Naomi Baker/Pool via Reuters

Mas ChangeMakers tem uma diferença. Os atletas são informados de que podem escolher “projetos esportivos de base, iniciativas de saúde mental, programas ambientais — seja qual for a sua paixão”. Muitas dessas “paixões” sugeridas são abertamente políticas. Em vez de usar rostos famosos para obter um pouco de promoção simplesmente, a iniciativa ChangeMakers parece querer afirmar que é dever dos atletas se envolver com o ativismo.

Seria um problema se todos os nossos astros do esporte sacrificassem seu tempo de treino para campanhas de mídia social e aulas de relações públicas com foco em política? O jogador de futebol Marcus Rashford, que talvez seja o jovem esportista mais famoso a se envolver em política, lançou um grupo de pressão para expandir as refeições gratuitas nas escolas. O curioso é que Rashford raramente vai parar nas manchetes de maneira positiva por causa da sua verdadeira paixão — o futebol — desde que se tornou garoto-propaganda do ativismo esportivo.

Política e esportes se misturam faz tempo

Sem dúvida, o desejo de Rashford de acabar com a fome infantil é genuíno. Mas sua campanha — e a conversa que ela gera — revela uma obsessão contemporânea em transformar estrelas do esporte em referências. Sua ausência na seleção inglesa na Eurocopa 2024 e seu recente comportamento — ficar bêbado em Belfast e faltar a treinos — são um indício do que pode acontecer quando a pressão para ter um “impacto social” é colocada em alguém que poderia ter se dado melhor fazendo o que faz bem.

Marcus Rashford na partida Manchester United x Newcastle United, final da Carabao Cup, no Estádio de Wembley, em Londres (26/2/2023) | Foto: Shutterstock

Mas existe também a questão dos tipos de projetos olímpicos que serão financiados. Por exemplo, o “meio ambiente” é uma questão incrivelmente ampla e polêmica que envolve tudo, desde a emissão zero até a renaturalização. Medidas ecológicas rigorosas provocaram grandes protestos de agricultores na Europa e estão impulsionando movimentos populistas em todo o Ocidente. No entanto, é improvável que um atleta da equipe britânica enfrente muita resistência por defender essas causas.

E se uma nadadora decidir que quer fazer uma campanha para uma organização que critica questões de gênero, como Sex Matters ou LGB Alliance? Ou, com a Olimpíada sendo realizada em Paris, o que aconteceria se um dos ginastas britânicos se inspirasse e pedisse dinheiro para iniciar uma versão britânica do movimento dos “coletes amarelos” [movimento que começou na França e se espalhou para outros países contra o aumento do imposto sobre o combustível]? Não é difícil imaginar uma longa lista de paixões genuínas e legítimas que os atletas possam ter que não se encaixariam na embalagem perfeita de relações públicas de um “projeto de impacto social” aceitável.

Ninguém acharia nada demais se nossos atletas se ajoelhassem para o Black Lives Matter. Mas, se alguém ousasse usar uma Estrela de Davi em solidariedade às vítimas do ataque de 7 de outubro do Hamas, provavelmente haveria revolta

Seria muito mais fácil se a nossa tendência fosse manter política e esporte separados. Já existem muitas personalidades dos esportes — muitas delas comentaristas — que acham que têm licença para dar palestras à nação sobre tudo, de geopolítica a guerras de gênero.

Claro, faz tempo que o esporte é palco para protestos políticos — desde a saudação do movimento negro de Tommie Smith e John Carlos em 1968 até o apoio de Jack Charlton à Greve dos Mineiros e à Liga Antinazista na década de 1980. O ativismo de hoje em dia, porém, é quase sempre uma expressão do preconceito de elite. E tende a ocorrer com a aprovação de grandes corporações patrocinadoras, grandes emissoras e órgãos de governo do esporte. Ninguém acharia nada demais se nossos atletas se ajoelhassem para o Black Lives Matter. Mas, se alguém ousasse usar uma Estrela de Davi em solidariedade às vítimas do ataque de 7 de outubro do Hamas, provavelmente haveria revolta.

Tommie Smith e John Carlos, velocistas americanos, durante a cerimônia de premiação da corrida de 200 metros nos Jogos Olímpicos mexicanos. Em protesto contra a discriminação racial, eles subiram descalços no pódio e ouviram seu hino com a cabeça curvada e o punho cerrado, com uma luva preta, na Cidade do México, México (16/10/1968) | Foto: Wikimedia Commons

Mesmo que não seja o caso, politizar os esportes pode ser injusto com os atletas. Ninguém deveria esperar que esses jovens astros do esporte, muitas vezes ingênuos, que passaram a vida toda em ginásios e academias, de repente se tornassem porta-vozes da política.

Além disso, a maioria de nós assiste a eventos esportivos porque está interessada ​​no esporte em si. Ou porque quer um pouco de escapismo. Gostamos de admirar pessoas que conseguem dar saltos altos e correr. As falas políticas são a parte menos interessante.

Os esportes poderiam ter um pouco menos de política e um pouco mais de, bom, esportes.


Ella Whelan é autora de The Case For Women’s Freedom, a publicação mais recente da série Letters on Liberty, da Academy of Ideas.

Leia também “Os universitários estão com menos interesse em sexo”

4 comentários
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Nada pior que homem invadindo o espaço feminino no esporte com essa negação chamada “trans”.

  2. Robson Oliveira Aires
    Robson Oliveira Aires

    Excelente texto. Parabéns. Endosso o que foi escrito acima. Esporte e política não deveriam se misturar. Quando vejo um esporte, por exemplo basquete, quero ver um jogo de basquete. E não discurso político de quem quer que seja.

    1. Antonio Saggese Netto
      Antonio Saggese Netto

      Você está corretíssimo.

  3. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    O problema do ativismo é que eles desejam impor na base da força ideias que não são comuns a todas as pessoas.
    Que continuar a ser livre para pensar, falar e discutir dentro de parâmetros de civilidade.
    Eu e minha esposa deixamos de ir a shows de “artistas” militantes porque os palcos foram tomados por uma militância barulhenta que não agrega nada a vida de ninguém.

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