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Edição 230

Nunca lhe prometi a Floresta Amazônica — Parte 3

A Amazônia está no centro do palco da geopolítica internacional. Mas a razão não é a importância da agenda ambiental. A verdadeira razão são seus recursos naturais

Roberto Motta
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Há outra explicação para a necessidade de se criar histeria em torno das questões ambientais, especialmente no Brasil. O pacote de prescrições salvadoras dos ecodoidos inclui a instituição de uma “governança global”, na qual o Estado-Nação deve ser submetido às decisões de burocratas não eleitos que formarão uma elite encarregada de decidir os rumos do planeta.

A internacionalização forçada do debate ambiental, operada através da criação de inúmeras organizações, tratados e conferências, tenta instalar uma camada decisória superior à soberania dos Estados nacionais. Esse discurso ambientalista transnacional é o único aceito hoje em dia pela mídia. Seu objetivo declarado é legitimar a internacionalização dos “bens ambientais” do planeta, que passariam a pertencer a “toda a humanidade”, e não apenas a uma nação. A elite burocrática mundial passaria a gerir o destino ambiental do planeta com base em critérios próprios, e não mais em resposta ao poder conferido pelas populações através do voto aos seus governos. 

É evidente que essa internacionalização tem como foco a região amazônica. Não existem propostas semelhantes para o Grand Canyon, a Grande Barreira de Coral da Austrália ou as florestas canadenses. 

Estima-se que a biomassa da Amazônia armazene carbono equivalente a 15 anos de emissões mundiais de CO2. Trata-se de um gigantesco “sumidouro” de carbono — em inglês, “carbon sink”. Há quem expresse o ponto de vista generoso de que o interesse internacional pela Amazônia é apenas a preocupação em manter esse sumidouro de carbono intacto. Outros observadores, mais céticos, dizem que a preocupação ambiental é mera desculpa, uma camuflagem malfeita para interesses territoriais, comerciais e políticos. A história favorece esta última hipótese.

Estima-se que a biomassa da Amazônia armazene carbono equivalente a 15 anos de emissões mundiais de CO2 | Foto: Shutterstock

Tentativas internacionais de controlar ou absorver pedaços da Amazônia remontam à época do império colonial português. Vários desses episódios são bem explorados no livro Amazônia: A Maldição de Tordesilhas: 500 Anos de Cobiça Internacional, do ex-ministro da Defesa Aldo Rebelo. Rebelo é um político de esquerda que já chegou a pertencer aos quadros do Partido Comunista do Brasil. Apesar disso, sua postura lúcida e bem fundamentada a respeito da Amazônia contrasta com a histeria dominante. 

Os três Estados da Amazônia

A disputa territorial conhecida como Questão do Rio Pirara envolveu a propriedade de uma área situada entre o Estado de Roraima e a margem do Rio Rupunúni, na atual Guiana. Essa disputa entre Portugal (mais tarde sucedido nela pelo Brasil) e o Reino Unido aconteceu no final do século 19, e foi a única questão fronteiriça resolvida com desvantagem para o Brasil. A vitória dos interesses britânicos foi construída com a participação de duas entidades não governamentais: a Real Sociedade Geográfica (que enviou um representante para “promover estudos científicos” que eram, na verdade, atividades de mapeamento cartográfico) e a Igreja Anglicana, que despachou um missionário encarregado de catequizar os índios e alfabetizá-los em inglês para depois liderá-los em uma revolta contra as “ameaças” do governo brasileiro. Como observa Aldo Rebelo, esse é provavelmente o registro mais antigo da participação de ONGs na disputa pela Amazônia.

A agenda ecorradical contaminou setores do Estado brasileiro. Essa contaminação é visível na atuação de ministérios, secretarias, agências e empresas estatais cujo discurso, políticas e atuação estão inteiramente submetidos à pauta ultra ambientalista. Esses braços do Estado frequentemente adotam posturas irracionais que colidem com os interesses do povo brasileiro. Atuando em conjunto com os milhares de ONGs da Amazônia, esses setores estatais formam uma espécie de “governo informal submisso aos interesses internacionais”, como diz Aldo Rebelo. Ele sugere que existem na Amazônia três Estados. O primeiro é o Estado oficial, composto de prefeituras, governos estaduais e a União. O segundo Estado é o do crime organizado, principalmente o narcotráfico. O terceiro Estado é o das ONGs.

É na Amazônia que se encontram os piores indicadores sociais. A população pobre, doente e exposta ao crime vive literalmente em cima de algumas das maiores jazidas minerais e fontes potenciais de energia do mundo. A pobreza da população da Amazônia é consequência da priorização de outros interesses, disfarçados de preocupação ambiental. Exemplo: a Noruega é grande financiadora de ONGs que trabalham para impedir a construção de novas hidrelétricas na região. Mas a Noruega tem mais usinas hidrelétricas do que o Brasil. Como diz Aldo Rebelo:

“O protetorado das ONGs, do Ministério Público, do Ibama e da Funai é exercido longe dos olhos dos brasileiros, mas suas consequências não atingem apenas a vida da população da Amazônia; elas comprometem um futuro e os direitos de todos os brasileiros.”

Aldo Rebelo, ex-ministro da Defesa, e seu livro Amazônia: A Maldição de Tordesilhas: 500 Anos de Cobiça Internacional | Foto: Divulgação
O “rodízio sinistro”

Aldo Rebelo divide as ONGs em três grupos, todos abastecidos por recursos de potências estrangeiras e representantes de seus interesses. O primeiro grupo é o das ONGs histéricas, espalhadoras de narrativas sobre a destruição da Amazônia. A pregação do apocalipse é sua fonte de recursos. O segundo grupo…

“…é o das ONGs que executam projetos e interagem com a população da região propondo uma economia santuário, de perpetuação da pobreza, do baixo consumo, da baixa emissão de carbono para tranquilidade da população rica, dos países ricos, que seguirá no seu consumo conspícuo sem que qualquer ONG a perturbe ou incomode.”

O terceiro grupo é o das ONGs científicas, que organizam projetos de pesquisas, recrutam acadêmicos em universidades e têm conexão direta com a agenda das mudanças climáticas patrocinada por corporações internacionais. Diz Aldo Rebelo:

“Na sua esfera de preocupação não estão os 30 milhões de brasileiros que vivem na Amazônia com os piores indicadores sociais, as maiores taxas de analfabetismo, mortalidade infantil e doenças infecciosas, os piores índices de serviços básicos como água tratada, energia elétrica e saneamento básico. 

Para as ONGs e seus financiadores, esses brasileiros são invisíveis, invisíveis seus traumas e padecimentos. Para as ONGs e a parcela de lideranças locais por elas cooptadas, só as castanheiras e seringueiras são eternas. Os indígenas e ribeirinhos que não aderem ao seu dinheiro e às suas teses são excluídos e discriminados.”

Segundo Aldo, essas ONGs usam como linha auxiliar de suas operações as agências e instituições do próprio Estado, entre as quais Aldo Rebelo cita o “Ministério do Meio Ambiente, o Ministério dos Povos Indígenas, o Ibama, o Ministério Público da União, os Ministérios Públicos estaduais, a Polícia Federal, a Força Nacional e, vez por outra, as Secretarias de Meio Ambiente dos próprios Estados da Amazônia.” 

A tutela exercida pelas ONGs influencia as políticas públicas da região. Assim, o próprio Estado brasileiro executa os planos das ONGs, que seguem a orientação dos interesses americanos e europeus. Desse processo participam agências como a USaid (agência americana para o desenvolvimento internacional), fundações como a Fundação Ford e a Open Society Foundations, do bilionário George Soros, e fundos bilionários, como o Fundo Amazônia.

Aldo Rebelo assim descreve o Fundo Amazônia:

“[…] a expressão mais refinada da capitulação do Estado brasileiro diante da agenda imposta ao Brasil. Criado por decreto em 2008, o Fundo tem como lema apresentado em sua página oficial na internet ‘O Brasil cuida. O mundo apoia. Todos ganham’. […] No programa do fundo não há nenhuma palavra, nenhuma referência, nenhuma preocupação com o drama social dos 30 milhões de amazônidas, com a possibilidade da elevação do padrão de vida material e espiritual desses brasileiros ou com sua aspiração ao desenvolvimento.”

Aldo Rebelo descreve ainda um “rodízio sinistro” através do qual os principais executivos das ONGs são nomeados para chefiar agências do Estado onde trabalharão para transferir as funções das agências para as ONGs, para as quais, finda a missão, retornarão. É exatamente como o economista Thomas Sowell descreve a relação entre agências reguladoras e as empresas “reguladas” por elas.

A Amazônia no centro do palco

Aldo Rebelo conclui com um depoimento dramático:

“Por onde ando e andei na Amazônia as histórias se repetem. Em Belém, Macapá, Manaus, Porto Velho, Boa Vista, Rio Branco […] sempre a mesma presença, sempre a mesma aliança, sempre as mesmas vítimas. ONGs, Ministério Público, Ibama, Força Nacional, Polícia Federal de um lado, de outro ribeirinhos, garimpeiros, indígenas rebeldes às orientações das ONGs, fazendeiros, comerciantes, amazônidas tentando sobreviver em conflito e confronto com o poder internacional representado pelas ONGs associadas a uma parcela do aparato do Estado brasileiro.”

E mais:

“Os executivos das ONGs e da elite do Estado estão plenamente convencidos da supremacia de suas ideias neomalthusianas diante dos habitantes da Amazônia, indígenas, caboclos, ribeirinhos, fazendeiros, comerciantes.”

Atividades criminosas e desmatamento ilegal sempre serão ameaças. Mas os números desmentem a narrativa da destruição apocalíptica da floresta

A narrativa que boa parte da diplomacia americana e europeia espalha pelo mundo, com a ajuda das ONGs e de políticos brasileiros da esquerda radical, é que o país tem sido negligente em adotar medidas eficazes para impedir a destruição da floresta. Essa narrativa é aceita como verdade absoluta e repercutida pela mídia nacional e internacional sem qualquer questionamento.

Mas ela não encontra amparo na realidade.

Atividades criminosas e desmatamento ilegal sempre serão ameaças. Mas os números desmentem a narrativa da destruição apocalíptica da floresta. Por exemplo, o Estado do Amazonas, o maior da Região Norte, tem 1.571.000 quilômetros quadrados. Desse total, 95% estão cobertos por vegetação nativa. Essa área de florestas é maior do que os territórios somados da França, Alemanha, Itália, Inglaterra, Dinamarca, Holanda, Suíça e Bélgica. O Código Florestal Brasileiro determina que 80% de cada propriedade na região amazônica deve ser mantida intacta, sem qualquer uso. Dados do Embrapa mostram que o bioma da Amazônia tem 86% de sua área coberta com vegetação nativa.

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Floresta Amazônica | Foto: TV Brasil/Reprodução

A Amazônia está no centro do palco da geopolítica internacional. Mas a razão não é a importância da agenda ambiental. A verdadeira razão são seus recursos naturais, incluindo biodiversidade, jazidas minerais e potencial energético. 

Como diz Aldo Rebelo, os estrangeiros não estão interessados no bem do Brasil. 

O que eles querem são os bens do Brasil.

Leia também “Nunca lhe prometi a Floresta Amazônica — Parte 2”

5 comentários
  1. Valesca Frois Nassif
    Valesca Frois Nassif

    Excelente artigo , Motta! Parabéns !

  2. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Corruptos não têm soberania nem patriotismo

  3. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    Motta, seus artigos sobre a Amazônia são esclarecedores.
    A última vez que estive na região foi em 2017 e o flagelo da população local salta aos olhos.
    Aldo Rebelo tem um conhecimento e uma lucidez sobre a região amazônica que pouquíssimos brasileiros possuem.
    Os discursos da esquerda radical e selvagem é somente discurso e nunca trouxeram qualquer benefício aos moradores da região.
    São carentes de tudo: principalmente saúde, educação e segurança que como o próprio artigo mencionou, hoje o crime organizado estabeleceu suas rotas do tráfico na região.

  4. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Essa turba estrangeira quer os bens do Brasil mesmo. Com a conivência de personagens como Marina Silva, que tem como método discutir os problemas da Amazônia tomando cafezinho em Paris.

  5. Robson Oliveira Aires
    Robson Oliveira Aires

    Excelente artigo. Parabéns. Faço minhas as palavras de Aldo Rebelo: “os estrangeiros não estão interessados no bem do Brasil. O que eles querem são os bens do Brasil”.

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