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Incêndio na Floresta Amazônica, em Apuí, no Amazonas (8/8/2024) | Foto: Adriano Machado/Reuters
Edição 232

Lula chamuscado queima a imagem do Brasil

Qual é o custo para a economia do país sob um governo que não se preparou para os períodos de seca, é incapaz de preservar suas florestas e de garantir segurança aos produtores rurais?

Adalberto Piotto
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Anos atrás, a mídia engajada e grupos de artistas e acadêmicos pouco afeitos aos fatos davam sustentação a uma narrativa de Lula de que o governo Bolsonaro tinha problemas internacionais que gerariam, na tese manipuladora do lulopetismo, problemas econômicos ao Brasil. Na deletéria campanha pelo mundo, em que definiam o país como “pária internacional”, cabia de tudo: suposto negacionismo na pandemia e das mudanças climáticas, incêndios na Amazônia e reclamações do comportamento do ex-presidente. Lula e seus aliados na imprensa, na Academia e até em órgãos internacionais, aqui e lá fora, davam fôlego aos argumentos que viriam a cair com os fatos.

O tempo passou e o Brasil foi um dos líderes na recuperação pós-pandemia, um dos principais destinos do investimento internacional, e se abria ao mundo de vez com uma candidatura sólida a fazer parte da OCDE, o clubão dos países desenvolvidos que exige índices socioeconômicos e de responsabilidade governamental avançados para aceitar um novo membro. Em 2021, o PIB recuperou as perdas da pandemia e cresceu novamente em 2022, apesar da escassez de produtos e do custo do petróleo pelo conflito na Ucrânia. Sob Lula, os gastos públicos explodiriam a responsabilidade fiscal, a diplomacia perderia seu respeito, o aventado “pária internacional” finalmente ganharia um lugar no Palácio do Planalto e seríamos vítimas de um mosquito conhecido desde os anos 1980.

Que no governo Bolsonaro declarações do presidente e algumas ações poderiam ter sido evitadas por autocontenção em nome da sensatez, não há dúvida. Barulho em excesso não permite conversa. Mas a crítica de opositores foi desconectada e baseada em mero jogo da baixa política que só nos gerou perda de tempo interna, além de passar uma mensagem errada ao mundo. Por que tanta gente deu espaço a isso é algo que merece estudo.

Hoje, o momento do atual governo queima a credibilidade do país com fatos inegáveis. Literalmente, queimadas ardem pelas florestas e campos produtivos do país, a gestão ambiental é pífia e a diplomacia errática dobra a aposta em escolhas sem lastro nos valores nacionais que expõem o Brasil ao ridículo e do lado errado da história contemporânea. No ambiente doméstico, a gestão de Lula 3 é incapaz de enfrentar a epidemia de dengue, uma doença conhecida desde os anos 1980 e combatida com prevenção e fumacê, além do clima de antidemocracia e de supressão de direitos e de garantias individuais que gera insegurança jurídica no país e traz de volta o clima de ditadura, seja pela imprópria parceria com o Supremo Tribunal Federal, seja pelo descontrole das contas públicas.

O SUS priorizou a vacinação para jovens de 10 a 14 anos em 1,9 mil municípios com alta prevalência de dengue
Aedes aegypti, mosquito transmissor da dengue | Foto: Jcomp/Freepik

Aos números, porque eles são imbatíveis.

Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), divulgados pelo jornal digital Poder360, mostram que neste ano, até o dia 26 de agosto, foram registrados quase 110 mil queimadas no país. Isso significa 76% de aumento em relação ao ano passado. O segundo e o terceiro colocados da série histórica de queimadas vêm também dos governos de Lula: 130 mil incêndios em 2005 e 127 mil em 2010. A maior parte em áreas como a Amazônia e o Pantanal. Quase um ano e oito meses de governo Lula 3 e ele e sua ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, não conseguem dar resposta aos brasileiros num dos temas mais estridentes da crítica internacional que, para espanto da coerência, está silente agora, justamente em meio a uma das piores crises de inação do governo.

Desconectados, no último fim de semana Lula e Marina estavam no palanque do candidato à prefeitura de São Paulo Guilherme Boulos (Psol), enquanto o governador do Estado, Tarcísio de Freitas, geria um gabinete de crise para rapidamente mitigar os efeitos dos 3.452 focos de incêndio pelo interior do Estado. O prejuízo é estimado em mais de R$ 1 bilhão em prejuízos, a maior parte ao agronegócio, que teve canaviais dizimados pelo fogo. Muitos dos incêndios foram criminosos. E dois números que deveriam martelar a cabeça do presidente: metade da produção de etanol vem de São Paulo. Da produção nacional de açúcar, mais de 60%. O etanol nos tanques dos carros garante o Brasil como um dos menores emissores de carbono na atmosfera. O açúcar vai na veia do superávit da balança comercial do país.

No rescaldo da incompetência federal, fica a pergunta: qual é o custo para a economia do país sob um governo que não se preparou para os períodos de seca, é incapaz de preservar suas florestas e de garantir segurança aos produtores rurais de áreas estratégicas para a questão ambiental e econômica? Lembre-se que os efeitos de fenômenos como El Niño e La Niña eram previstos, assim como a estiagem severa. Antes de assumir, Lula recebeu do Congresso uma emenda fura-teto de R$ 145 bilhões, que poderiam ter sido usados em planejamento de prevenção ao fogo. Não foram. Marina e o próprio presidente preferem culpar Bolsonaro. Se a desculpa um dia colou, não cola mais.

Longe da pandemia de um vírus desconhecido que assolou a humanidade por quase dois anos e que fechou a economia do planeta, o governo Lula não consegue controlar uma epidemia interna de dengue que aflige o país até no inverno

Na diplomacia, Lula chamusca a imagem do Brasil. Depois de declarações desastrosas após o ataque terrorista do Hamas que matou e sequestrou centenas de israelenses dentro do próprio país, conseguiu ser persona non grata em Israel, país de tradicionais relações de amizade com os brasileiros e que fornece sistemas eletrônicos estratégicos aos aviões da Embraer. A falsa equivalência entre Rússia e Ucrânia, numa guerra em que os russos invadiram o país vizinho num crime contra a humanidade, chocou a comunidade internacional, que viu o Brasil se distanciar de seu tradicional equilíbrio e sensatez nas relações internacionais. A cena em que Lula fingiu ler um documento para evitar cumprimentar o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky na reunião do G7, em maio do ano passado, em Hiroshima, no Japão, é historicamente vergonhosa.

Mesmo no continente latino-americano, Lula 3 reduz o tamanho do Brasil. Preso à ideologia de esquerda que atrasa a região há décadas, o presidente não consegue condenar a ditadura e o golpe eleitoral de Nicolás Maduro, na Venezuela, ou o regime do sanguinário ditador nicaraguense Daniel Ortega. Não bastasse o mundo civilizado e democrático olhar com ressalvas a diplomacia de Lula, ambos os amigos ditadores fizeram críticas públicas ao presidente brasileiro, que parece perdido e isolado.

Lula quer uma ditadura alinhada ao 'Sul Global', afirma Estadão
O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, é recebido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no Palácio do Planalto | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Na saúde, longe da pandemia de um vírus desconhecido que assolou a humanidade por quase dois anos e que fechou a economia do planeta, o governo Lula não consegue controlar uma epidemia interna de dengue que aflige o país até no inverno. Já são mais de 5 mil mortes e mais de 6,5 milhões de casos. Segundo a OMS, 82% dos casos de dengue do mundo são no Brasil. Um estudo da Federação das Indústrias de Minas Gerais, feito em março, revelou que o descontrole do mosquito Aedes aegypti deve gerar perdas de mais de R$ 20 bilhões na economia brasileira, além da irrecuperável perda de vidas. Governos cuidam de pessoas e preservam a economia. Deveriam, ao menos. Mas Lula, o presidente, foi vacinado numa clínica particular.

A insegurança jurídica é tema recorrente nesta coluna, seja pelas decisões do STF, que impôs retroatividade de cobrança de impostos mesmo em decisões já proferidas em última instância, seja pelo tipo de governo que recorre à Corte suprema quando perde no jogo democrático com o Congresso. O caso da desoneração da folha de pagamentos foi dos mais afrontosos. Uma liminar do ministro Cristiano Zanin “revogou” uma decisão de 513 deputados e 81 senadores. Mesmo com a precária solução encontrada recentemente, como explicar isso a um investidor estrangeiro ou segurar o brasileiro aqui?

Nesta semana, um alento. A contratação com carteira assinada trouxe saldo positivo de 188 mil novas vagas em julho. Um pouco abaixo das expectativas, menos que junho, mas 32% superior ao mesmo mês do ano passado. Enfim, o dado é bom. O setor que mais gerou empregos foi o de serviços, justamente o que será mais prejudicado com o aumento de impostos previsto no projeto de reforma tributária apoiado pelo governo federal. A reforma ainda tramita no Congresso e já prevê quase 28% de IVA, a segunda mais alta do mundo. O Brasil respira, o governo sufoca.

Dias atrás, Lula disse que não é um gestor, é político. Não surpreendeu ninguém. Mas políticos podem escolher entre ser estadistas ou populistas inconsequentes.

Fato é que o desejo que mais se ouve de investidores e empresários é um só: “Se o governo de Lula não atrapalhar, já está bom”. Sabendo que quatro anos demoram, mas passam, a economia ativa se concentra no arco da tecnologia de ponta, do agronegócio e conectado às cadeias globais, onde o poder público joga junto, desembaraça e apoia. Justamente os Estados onde os governadores da oposição são predominantes, no Sudeste, no Sul e no Centro-Oeste.

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10 comentários
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Tive um parente que faleceu esta semana, após se internar devido a fumaça. Vieram outras complicações e ele não resistiu.

  2. Daniel BG
    Daniel BG

    Grande texto Piotto.
    Se soubéssemos em fins da década de 70 e início de 80 a trajetória que estava começando a seguir o país, Lula teria sumido junto com o PT, PCdoB, Psol e demais trastes que se firmaram sob as asas tucanas e herdeiros do varguismo.
    A ineficiência dos socialistas desemboca num governo de tutelas para um povo incapaz.
    É esta a nossa essência?

  3. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    O Brasil vive um tirania no Judiciário, uma conivência no Legislativo e um perdulário no Executivo.
    É impossível esse país dar certo com esse panorama político institucional.

  4. Djalmir Caparroz Salas
    Djalmir Caparroz Salas

    Boa noite.Penso que existem informações sobre a dengue que estão meio esquecidas debaixo do “tapete”.Ela existe já há bastante tempo e era chamada de doença ou febre quebra ossos.A doença é causada por 4 tipos de vírus e o ser humano fica imune a cada tipo apenas depois que “pegou” cada um deles,foi infectado e desenvolveu ou não a doença.Portanto,salvo engano e até onde me lembro,cada um de nós pode ter dengue até 4 vezes porque depois de ficar doente e se recuperar,nosso organismo criará imunidade ao vírus pelo qual foi infectado e causou a doença.As pessoas que nascem estão indefesas,não têm imunidade contra o vírus,então,sempre teremos pessoas susceptíveis de ficarem doentes por dengue,a não ser que se descubra vacina para cada um dos tipos do vírus causador da dengue e que imunizem as pessoas contra todos eles. Enquanto isso não acontece,só a eliminação dos criadouros do mosquito (atitude que deve ter total participação do povo e a fiscalização das autoridades epidemiológicas e sanitárias para que a sociedade/comunidade cumpra seu papel de cidadãos) e a fumigação com venenos (responsabilidade das vigilâncias epidemiológica e sanitária) que eliminem os mosquitos,são as medidas capazes de controlar a disseminação e manutenção da doença.Não pensem que estou defendendo o governo atual,muito pelo contrário (penso que este mal vai acabar se o povo brasileiro de bem se levantar e reagir,saindo às ruas protestando contra todas esses absurdos que estão cometendo,não podemos ficar quietos) apenas estou querendo passar informações técnicas com as quais trabalhei até há alguns anos atrás até me aposentar.Se existem informações novas,me desculpem por postar informações desatualizadas. BRASIL ACIMA DE TUDO, DEUS ACIMA DE TODOS

  5. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Estamos voltando ao primitivismo na mão desses tiranos ladrões. Numa era onde o homem está cada vez mais avançando para o cosmo. A velocidade da luz está sendo alcançanda, o homem já é metade homem e metade máquina através da inteligência artificial

  6. Brian
    Brian

    Resumindo, Brasil: corrupção e destruição!

  7. NILSON OCTÁVIO
    NILSON OCTÁVIO

    Bela retrospectiva! São aspectos da vida nacional que devem, infelizmente, ser lembrados. Governo perdulário, incompetente técnica e politicamente. Um desastre.

  8. Bruno Araujo Barbaresco
    Bruno Araujo Barbaresco

    É assim que eles agem. Ninguém se lembra do caso da disseminação da vassoura de bruxa nas plantações de cacau na Bahia? Parece que até deputados e vereadores do PT e voluntários de esquerda atuaram na contaminação das plantações. Centenas de produtores falidos e milhares de desempregados foi o resultado da disseminação dessa praga. Nunca mais ouvi falar desse caso. Será que foi mentira? Será que foi acaso mesmo?

  9. Gladis Eleonor Migliavacca Ballardin
    Gladis Eleonor Migliavacca Ballardin

    Muito bom seu comentário Pioto. 👏👏

  10. Gladis Eleonor Migliavacca Ballardin
    Gladis Eleonor Migliavacca Ballardin

    Muito bom seu comentário Pioto. 👏👏

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