Pular para o conteúdo
publicidade
Foto: Gerada por IA/Freepik/Revista Oeste
Edição 238

O Brasil diz não ao PT

O primeiro turno das eleições no Brasil prova a força do eleitorado conservador, capitaneado por Jair Bolsonaro e pelo governador Tarcísio de Freitas (SP), e joga uma pá de cal no 'lulismo'

Silvio Navarro
-

A maioria dos brasileiros escolheu prefeitos e vereadores de direita no primeiro turno das eleições municipais, ocorrido no último domingo, 6. Seja qual for o recorte, em capitais ou nas 103 cidades com densidade eleitoral — mais de 200 mil eleitores —, o resultado das urnas é claro: os candidatos que tiveram o apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro ou de líderes conservadores foram eleitos. Quem concorreu com as cores do PT e colou a imagem na do presidente Lula da Silva ficou pelo caminho ou entrou em desvantagem no segundo turno.

As afirmações acima são todas baseadas em aritmética. Aos fatos: 11 prefeitos foram eleitos ou reeleitos no primeiro turno, e 15 vão disputar a segunda rodada, no próximo dia 27. Dos que já ganharam nas capitais, nenhum é filiado ao PT ou ao Psol. Todos os outros representam o centrão, e a maioria teve o apoio de Bolsonaro. Há 52 disputas abertas no país (veja o detalhamento abaixo), e o PL, por exemplo, pode levar metade.

Do ponto de vista do xadrez partidário, que pouco importa para o pagador de impostos, mas interessa aos caciques de Brasília, cinco legendas fizeram mais de 500 prefeituras, no imenso universo de 5.568 municípios — o número de unidades formais chega a 5.570, segundo o IBGE, mas Brasília e Fernando de Noronha não têm eleições municipais. São elas: PSD, MDB, PP, União e PL. Nada aqui chega perto das ideologias que estão na prateleira da esquerda no país. 

Aliás, a conta que realmente importa, principalmente para 2026, é o eleitorado administrado. Nesse aspecto, a “esmagadora vitória” do PSD, como a imprensa tradicional diz, termina na página dois. O PSD vai controlar 9,3 milhões de eleitores. Foi a primeira vez em 20 anos que o MDB foi superado — ficou com 7 milhões até aqui. Mas e o segundo turno? Pode mudar tudo: se o MDB vencer em São Paulo, já são mais de 9 milhões de votos que estavam na mesa. Outro dado: o PL fez 6,8 milhões, mas esses números vão subir pela quantidade de candidatos que ainda estão em campo — são nove em 15 capitais; ou 23 em 52 cidades de segundo turno.

O PT conquistou 2,2 milhões de votos, mesmo tamanho do PSDB, que desapareceu no país. É até possível dizer que alguns rostos são próximos do “lulismo”, mas não do que o PT defende. Nesse caso, o melhor exemplo é Eduardo Paes (PSD), no Rio de Janeiro, que já foi filiado a seis legendas na vida e jamais se importou com partido político.

Há um caso peculiar, o de João Campos, reeleito em Recife pelo PSB. A sigla, de fato, integra o bloco de esquerda no país, mas a importância da figura de Lula na sua campanha é nula, já que ele é sucessor da tradicional linhagem de Miguel Arraes e Eduardo Campos — morto num acidente aéreo em 2014. A imagem de Lula, aliás, nem sequer foi usada na campanha.

Assim como a reeleição de Bruno Reis (UB) em Salvador não passa nem pelo PT nem pela direita. Reis era secretário de ACM Neto e virou prefeito com facilidade em 2020. A Bahia segue um mistério para os analistas políticos: o PT governa o Estado desde o pleito de 2006, mas o “carlismo” resiste na capital.

Numa reunião pós-urnas nesta semana, os dirigentes petistas lamentaram dois fiascos inesperados, em Teresina e em Goiânia. Comemorar vitórias em Juiz de Fora (MG), Contagem (MG) e Camaçari (BA) é pouco para o partido que governa o Brasil e saiu das urnas com 248 prefeituras pequenas — menos de um terço das 882 do PSD, por exemplo.

Nas capitais, a esperança do PT é a carona na chapa de Guilherme Boulos (Psol) — Marta Suplicy é a vice. Restam cidades mais complicadas para o PT, como Cuiabá, Natal, Fortaleza e Porto Alegre. Nas duas últimas, para avançar, os petistas vão precisar dos votos do instável PDT: do novo brizolismo no Sul, e dos irmãos Ciro e Cid Gomes no Ceará — dupla que perdeu até no seu reduto de Sobral.

Com mais de 9 milhões de votos, a capital paulista é a eleição que mais importa para todas as correntes políticas. A matemática joga contra Boulos: o que decidirá o pleito será o 1,7 milhão de votos de Pablo Marçal (PRTB). Foi a corrida mais apertada de que se tem notícia, desde a redemocratização, decidida por margem inferior a 100 mil votos.

Pablo Marçal brigou palmo a palmo com Ricardo Nunes (MDB) pelo eleitorado de direita e pelo abraço de Jair Bolsonaro. A menos que a cidade embarque num transe ideológico, não é crível que o esquerdista fature. A equação é simples: Marçal acusou Boulos, por exemplo, de ser usuário de drogas e invadir propriedade privada. Por que seu eleitor votaria nele agora?

Fora das capitais, a derrota do PT em algumas praças também foi amarga, como em Araraquara (SP), cidade de Edinho Silva, que administrou o município quatro vezes, Guarulhos (SP), Franco da Rocha (SP), Uberlândia (MG) e no ABC paulista: São Bernardo do Campo, Santo André e São Caetano. Edinho Silva contava com a vitória para suceder Gleisi Hoffmann no comando do PT. Em Osasco (SP), o ex-presidente estadual e líder do partido, Emídio de Souza, teve 15% dos votos — cidade que já governou duas vezes.

No caso de São Bernardo, berço da sigla, dois ministros tiraram férias para fazer campanha: Luiz Marinho (Trabalho), ex-prefeito, e Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário), cujo irmão, Luiz Fernando, era o candidato. Não deu. O partido ainda levou um susto e tentará reverter o estrago no segundo turno em Mauá (SP) e Diadema (SP) — Filippi Júnior foi prefeito três vezes e tesoureiro do PT.

Lula enfraquecido

O tombo eleitoral da esquerda ocorre num momento de indiscutível derrocada da imagem de Lula. O petista não cumpriu mais agendas públicas fora de auditórios e abandonou as transmissões pela internet por falta de público — o jornalista que o acompanhava no microfone, Marcos Uchôa, ex-Rede Globo, deu no pé. Um ano e dez meses depois de voltar ao poder, o governo não anunciou nenhum projeto concreto — nem um tijolo inaugural do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), como Dilma Rousseff fazia no passado —, os ministros não sabem como contornar o recorde de queimadas, a dengue cruzou o inverno e não foi embora, e a segurança pública acumula números sofríveis. Junte-se à lista as crises diplomáticas em que Lula e seu chanceler informal, Celso Amorim, meteram o Brasil pelo mundo, do Oriente Médio à Rússia e à Venezuela. Pior: tudo indica que, se o petista não conseguir algum negócio com os futuros presidentes da Câmara e do Senado, tampouco vai aprovar projetos até 2026, e o revés de quem mandará no Orçamento é certeiro.

Muitas reuniões do governo Lula foram publicadas com atraso | Foto: José Cruz/Agência Brasil
Muitas reuniões do governo Lula foram publicadas com atraso | Foto: José Cruz/Agência Brasil

Se em algum momento alguém pensou que, depois de reabilitado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e escolhido presidente, Lula pavimentaria um caminho para a esquerda no país, deu errado. Tanto que, no auge da campanha, jogou a toalha e viajou para o México. Os dirigentes petistas disseram que ele pretende ir a Belém, no Círio de Nazaré, apoiar Igor Normando (MDB), aliado da família Barbalho. Também deve aparecer em Porto Alegre, ao lado de Maria do Rosário, em Diadema e em Fortaleza. 

“Gostaríamos de ter tido o presidente por muito mais tempo, mas ele é presidente da República. Ele tem o país para tocar, e pegou a questão das queimadas e enchentes, os problemas todos, além das agendas internacionais”, lamentou Gleisi Hoffmann, presidente do PT. “Nunca tivemos grandes expectativas para esse processo eleitoral de 2024.”

Chega a ser cômica uma visita ao site do PT, por exemplo, indicando Gleisi Hoffmann e a tesoureira da agremiação, Gleide Andrade, como importantes cabos eleitorais em Curitiba e Belo Horizonte. Por onde elas passaram, o PT naufragou (veja abaixo). 

O documento da executiva do PT divulgado nesta semana, sobre as eleições, retrata um partido parado no tempo. A sigla atribuiu o atoleiro eleitoral à Operação Lava Jato e falou em “golpe” contra Dilma Rousseff. “O período histórico inaugurado com a farsa da Lava Jato e o golpe contra a presidenta Dilma abriu as portas para a extrema direita aliada ao neoliberalismo mais selvagem, que seguem ameaçando o país e o sistema democrático.”

Notas publicadas no site do PT entre os dias 4 e 5 de outubro de 2024 | Foto: Reprodução/Site PT

Bolsonaro e Tarcísio

Ao contrário de Lula, o ex-presidente Jair Bolsonaro percorreu o país desde a virada do semestre para ajudar seus aliados. Alguns casos são emblemáticos: o jovem deputado André Fernandes (PL) era considerado carta fora do baralho eleitoral em Fortaleza, reduto de esquerda, e chegou ao segundo turno. O mesmo ocorreu em Goiânia, com Fred Rodrigues (PL) na dianteira contra Mabel (UB) na próxima etapa. Ou ainda Bruno Engler (PL) em Belo Horizonte. Às vésperas da eleição, aliás, Bolsonaro gravou um vídeo ao lado de Cristina Graeml (PMB), a maior surpresa da eleição, que decidirá o pleito em Curitiba contra o PSD.

O governador Tarcísio de Freitas também sai vitorioso. O Republicanos conseguiu mais do que o dobro de prefeituras — de 213 para 436. E a esquerda sumiu do mapa no maior Estado da federação: o PT ganhou só em três lugares (Matão, Santa Lúcia e Lucianópolis). O que isso significa? Governar 88 mil pessoas num universo de 44 milhões de habitantes — ou número inferior ao desempenho do vereador campeão de votos na capital. Se não reverter o quadro onde ainda concorre (Mauá, Diadema e Sumaré), o PT vai registrar seu pior desempenho da história em São Paulo. Para o Psol, a única chance é a capital.

O grande triunfo de Tarcísio, contudo, foi levar Ricardo Nunes ao segundo turno. O prefeito paulistano era um desconhecido do eleitorado, filiado ao MDB, partido que sobrevive há décadas na garupa de quem está no poder. Nunes tampouco teve o apoio vigoroso de Bolsonaro — algo que deve mudar nos próximos dias. Apesar das mágoas em São Paulo, a tendência é que a direita se reúna contra a esquerda na reta final da eleição, como ocorreu em 2022.

Restam ainda mais de 50 disputas até o final do mês. Fazer previsões não combina com fatos. Mas é inequívoco que o estrago para a esquerda já aconteceu, a menos que Guilherme Boulos vença em São Paulo — é a única saída. A imagem de Lula e o voto na legenda do PT ficaram no passado, mesmo com todo o empenho das Cortes superiores de Brasília e da imprensa tradicional. A população decidiu: a direita é inevitável.

Tarcisio vota em São Paulo
Tarcísio de Freitas vota em São Paulo | Foto: Divulgação

Leia também “Parlamentar de toga”

14 comentários
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Os desvios de dinheiro público, na Refinaria de Abreu e Lima, nas obras da Copa do Mundo 14, inclusive com arena no meio do nada, e tantos outros, ainda servirão para bancar campanha de muitas gerações da família do Eduardo Campos. São uns canalhas!

  2. Maq C0
    Maq C0

    A Bahia, no caso a Capital Salvador não é nenhum mistério. O Bruno Reis é nada mais que um marionette do ACM Neto. O ACM foi muito amigo do atual presidente do país e do Fidel Castro.
    O Fidel foi somente “almoçar” na casa do ACM “porque gostava muito da comida baiana”.
    Eis o ACM que foi inimigo do Carlos Lacerda, não se dava bem com Geisel mas se dava bem com Figueredo, inclusive com JK.
    Sempre achei que o que falta na Oeste é um jornalista nordestino.
    O que aconteceu durante a Pandemia na Bahia não deveria ter sido omitido pela imprensa. Tudo premeditava o que iria acontecer nas eleições de 2022. E a UB se alinhou com o Estado. E a Bahia não ter tido um candidato da direita pois centrão não é direita, foi culpa do João Roma líder do PL no Estado. O João Roma que foi da DEM e que a mente dele nunca saiu da mesma. A BA é toda vermelha.

  3. Giovani Santos Quintana
    Giovani Santos Quintana

    Bolsonaro não apoia a Cristina Graeml
    em Curitiba, o apoio oficial é para o Pimentel que venceu o primeiro turno.

  4. Oswaldo Galvão Carvalho
    Oswaldo Galvão Carvalho

    o PT sempre serviu unica e exclusivamente aos propósitos do Llulladrão / Llullarápio.
    é um partido de um dono só, pois mais ninguém será o seu herdeiro. Sim, herdeiro dessa “coisa” atrasada, enganosa, pérfida, desastrosa, funesta, infeliz e catrastrófica.
    o dia em que desaparecer esse câncer da política brasileira, o PT será enterrado junto.
    o desavergonhado Llulladrão / Llullarápio é o câncer e o judiciário a metástase.
    é só esperar para ver.

  5. Amaury G Feitosa
    Amaury G Feitosa

    Tanto os ditadores cínicos fizeram que o povo começa a dar o troco .. lixo nestes canalhas que infelicitam a nação .. em 2026 os manés terminam sua doce vingança.. xau ladrões !!!

  6. MARCELO DANIEL STROEYMEYTE
    MARCELO DANIEL STROEYMEYTE

    Sim.mas não conseguimos enfraquecer o Centrao de Kassab. Melhoramos mas ainda estamos jo fundo do poço. Só paramos de cavar.

  7. MARCELO DANIEL STROEYMEYTE
    MARCELO DANIEL STROEYMEYTE

    Sim.mas não conseguimos enfraquecer o Centrao de Kassab. Melhoramos mas ainda estamos jo fundo do poço. Só paramos de cavar.

  8. MARCELO DANIEL STROEYMEYTE
    MARCELO DANIEL STROEYMEYTE

    Sim.mas não conseguimos enfraquecer o Centrao de Kassab. Melhoramos mas ainda estamos jo fundo do poço. Só paramos de cavar.

  9. MNJM
    MNJM

    Parabéns Silvio excelente texto . Queremos o voto impresso, o povo brasileiro é conservador em sua grande maioria.
    Moraes siuspenndeu o X fez o diabo, mas o PT foi detonado pelo povo. O governo é um desastre, estão enterrando o país e a tendência é piorar.
    Quanto ao resultado das eleições ” perdeu Mané “

  10. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    As análises são boas, mas o que interessa ao povo é escrutínio público. As eleições da França é um bom exemplo

  11. Marcelo Miranda Guimarães
    Marcelo Miranda Guimarães

    PT = Perda Total.
    Presidente funcionalmente analfabeto, equipe corrupta e incompetente, sem apoio popular. Ganham apenas na base do 171, mas há cada vez menos bobos para cair nessa.

  12. Maria de Lourdes De Mendonça Arruda
    Maria de Lourdes De Mendonça Arruda

    Não confio no Kassab e quem está mandando é ele.

  13. Brian
    Brian

    Faltam agora generais de direita, imprensa de direita, judiciário de direita, stf de direita, OAB de direita e o MP de direita. Sem isto rumo à Coreia do Norte. Venezuela já ficou para trás.

  14. Célio Antônio Carvalho
    Célio Antônio Carvalho

    Se deixar o POVO decidir com a sua vontade não há nada, ninguém que segure.
    Estão colocadas as cartas nas mesas.
    Alguém terá alguma dúvida para as próximas eleições de 2026?
    Contra fatos, não têm pesquisas e nem tribunais que alterem legitimamente um pleito.
    O recado foi claro, direto, está dado. Não aceitamos isso que está aí.
    Ou vão continuar com idiotices? Chega, basta. Quem não apresentou nada até hoje só pode tirar um ZERO bem avaliado pela população que se cansou.

Anterior:
‘A mulher chega à delegacia de mãos dadas com a morte’
Próximo:
Carta ao Leitor — Edição 238
Newsletter

Seja o primeiro a saber sobre notícias, acontecimentos e eventos semanais no seu e-mail.