Em 1911, bem abaixo do solo, numa mina encravada nas montanhas e vales em South Pittston, no nordeste da Pensilvânia, nos Estados Unidos, crianças limpavam e separavam manualmente as impurezas do carvão antracito. Mais de 13 mil meninos com idade entre 8 e 12 anos trabalhavam numa jornada de 10 a 12 horas por dia, seis dias por semana, de maneira insalubre e penosa. Eles eram os Breaker Boys — ou Meninos Britadores.
De 1890 a 1910, o número de crianças americanas assalariadas saltou de 1,5 milhão para 2 milhões. Foi nessa época que o fotógrafo e sociólogo Lewis Wickes Hine começou a investigar e reunir evidências sobre trabalho escravo infantil em vários tipos de indústrias. Hine também é conhecido por seus retratos profundamente empáticos de imigrantes em Ellis Island, e por seu registro documental de trabalhadores da construção civil no Empire State Building. Tornou-se fotógrafo investigativo do National Child Labor Committee em 1908 e capturou, com grande risco para sua própria segurança, imagens dos operários infantis invisíveis com longas e perigosas jornadas na virada do século.
O fotógrafo passou a usar uma série de disfarces para registrar tudo o que via, de inspetores de incêndio a vendedores de Bíblia. Ele clicou crianças em frigoríficos, em indústrias têxteis, em fábricas de conservas, nas ruas trabalhando como engraxates, vendedores ambulantes e jornaleiros. O trabalho de Hine não se propôs a reproduzir velhos estereótipos da época, nem a criar um espetáculo do “estrangeiro” ou do “exótico”. Ele teve o cuidado de documentar cada fotografia com fatos e números precisos, tudo com muito respeito e dignidade. A foto intitulada Breaker Boys aconteceu justamente durante a visita de Hine à mina Ewen Breaker, da Pennsylvania Coal Co., no dia 16 de janeiro de 1911. É um dos mais marcantes registros históricos da exploração de menores.
Na época, muitos consideravam o trabalho bom para as crianças, desde que elas desenvolvessem habilidades úteis e não fossem excessivamente exploradas. As famílias imigrantes, em particular, dependiam da renda obtida com essa mão de obra. Mas as imagens e reportagens detalhadas de Hine expuseram o abuso generalizado. O trabalho em fábricas e minas mantinha as crianças fora da escola e colocava sua saúde em risco. Havia exposição a altas temperaturas e fumaça tóxica. O rugido incessante do maquinário usado nas minas causava perda de audição, e muitos tinham os dedos e as mãos cortados por rochas afiadas e irregulares.
O registro documental de Hine foi importante para o início da abolição do trabalho infantil nos Estados Unidos. A partir de então, a legislação americana começou a combater um sistema que tinha pouca consideração pela saúde ou segurança das crianças. Em 1916, o Congresso aprovou a Lei Keating-Owen, que estabeleceu os seguintes padrões de trabalho infantil: idade mínima de 14 anos para trabalhadores na indústria e de 16 anos para trabalhadores na mineração; jornada máxima de trabalho diário de oito horas; proibição de trabalho noturno para trabalhadores menores de 16 anos; e uma prova documental de idade. Infelizmente, essa lei foi posteriormente considerada inconstitucional, com base no fato de o poder do Congresso de regular o comércio interestadual não se estender às condições de trabalho. A ação efetiva contra o trabalho infantil teve que esperar pelo New Deal. Os reformadores, no entanto, tiveram sucesso em forçar a legislação em nível estadual, com a proibição do trabalho infantil e a definição do máximo de horas. Em 1920, o número de crianças trabalhadoras foi reduzido para quase metade do que era em 1910.
Daniela Giorno é diretora de arte de Oeste e, a cada edição, seleciona uma imagem relevante na semana. São fotografias esteticamente interessantes, clássicas ou que simplesmente merecem ser vistas, revistas ou conhecidas.
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Fotos impactantes, tristemente icônicas… Parabéns pela matéria.