A pergunta mais repetida que me fazem nestes dias é: “Como vai ser o relacionamento de Trump com o Brasil?”. Ressalvo que não tenho bola de cristal, muito menos capacidade de prever decisões que vão decorrer do que o presidente americano ainda vai descobrir. Mas sabemos que a toda ação corresponde uma reação. Antes de ações do Estado brasileiro, pesam ações ad hominem. Lula afirmou que a volta de Trump seria o nazismo e o fascismo com outra cara. A primeira-dama do Brasil, usando a língua inglesa, num evento público, jogou num dos agora mais próximos auxiliares de Trump um “fuck you, Musk“. Além disso, Elon Musk já foi alvo da Suprema Corte brasileira, e o significativo episódio, sem dúvida, vai se somar aos outros. Lula, presidindo o Brics, quer substituir o dólar, é amigo da ditadura iraniana, fecha os olhos para o golpe de Maduro e conduz, com Celso Amorim, política externa afinada com a China e a Rússia. Como o republicano Nixon alertou, “para onde se inclina o Brasil, vai inclinar-se a América Latina”. Óbvio que o poderoso vizinho do norte vai preferir dar força à Argentina de Milei.
No discurso de posse, Trump poderia estar se dirigindo aos brasileiros. Eu me senti vestindo a carapuça muitas vezes. E já no início, quando ele anunciou que começava uma era de ouro, em contraposição ao fim de tempos de declínio. Sacudiu-me como brasileiro, porque parecemos masoquistas, que temos prazer com a decadência, o descumprimento das leis, o lixo, o crime, a mentira, o aplauso a espertalhões. Trump quer voltar aos tempos de construção da América grande, de ocupar o meio-oeste e conquistar o oeste, por patriotas que venceram desafios formidáveis; aqui, estamos em tempo de condenar patriotas, de condenar os que conquistaram o centro-oeste e os que tentam ocupar o norte sempre cobiçado por estrangeiros.
Trump recordou que tentaram tolher-lhe a liberdade de concorrer à Presidência e até tirar-lhe a vida, com o tiro que era para a cabeça mas feriu a orelha. Poderia estar se comparando a Bolsonaro e à faca que quis tirar-lhe a candidatura e à “inelegibilidade”, que hoje tem o mesmo objetivo. Disse Trump que no seu governo vai prevalecer o mérito, e não a cor da pele ou a genitália. No Brasil, seria difícil. Aqui, o “quem indica” é muito forte — e cor da pele e genitália são argumentos para ganhar direitos. Trump anunciou que cartéis serão considerados como terrorismo estrangeiro — aqui, os cartéis do crime estão cada vez mais entrelaçados com a política e o Estado nacionais. Também vai combater o crime aumentando o poder da polícia; quando Bolsonaro fez isso, as estatísticas de crimes violentos despencaram; mas hoje, por aqui, estimula-se o crime, esvaziando poder da polícia e constrangendo os policiais, enquanto se inverte: o assaltante é a vítima; a sociedade, a culpada. “Não vamos esquecer a Constituição e nosso Deus” — disse Trump. Por terras brasileiras, isso até que valeu e rendeu frutos, mas hoje até os que juraram defender a Constituição a esquecem — e o nome de Deus só é lembrado para demagogia. O “macho e fêmea os criou”, do Gênesis 1:27, é negado pelo atual governo brasileiro.
Quando Trump prometeu retomar o Canal, porque fora dado ao Panamá mas os chineses são quem o estão administrando, lembrei-me das instalações da Petrobras na Bolívia, que foram ocupadas militarmente por Evo Morales, com zero reação do governo Lula. Trump vai combater a inflação do dólar contendo o excesso de gastos do governo — no mesmo dia, Lula, com uma multidão de ministros em torno de mesa gigantesca, prometia baratear os alimentos da magra mesa do trabalhador; mas não contém o excesso de gastos com seu próprio governo, nem o inchaço da dívida pública, que paga altos juros para ser sustentada — num custo que se derrama sobre todos. Para taxar menos os americanos, Trump vai taxar mais quem vende para os americanos, principalmente os chineses. Por aqui, os chineses ampliam presença, e o governo tenta enquadrar no Imposto de Renda os informais do setor mais baixo da renda.
A liberdade de expressão é a joia da coroa do governo Trump. “Jamais o governo vai perseguir seus opositores” — disse Trump. Aqui, criticar é crime, segundo o governo e alguns jornalistas. Trump sabe que a ambição impulsiona uma nação; no Brasil, os empreendedores, os de iniciativa, são criticados pela inveja ideológica. Gente que condena (e queima) bandeirantes de ontem hoje faz o mesmo com os novos bandeirantes da Amazônia. Trump saúda os pioneiros do passado e lança os do futuro, com proposta de chegar a Marte. Aqui, não conseguimos fazer uma pequena linha de trem-bala. Fomos colonizados pelos mesmos europeus, africanos e asiáticos. Por que os Estados Unidos são os primeiros no mundo, e nós, o eterno “país do futuro”? Eles têm maior número de Prêmios Nobel, e nós, nenhum; festejamos Macunaíma.
Trump começou indultando os invasores do Capitólio — e os brasileiros se lembraram dos idosos, das donas de casa, das mães, dos manifestantes que estão pagando até hoje pela denúncia sobre um imaginário golpe de Estado sem armas. Também derrubou toda censura. Nossa Constituição proíbe censura, mas estamos envolvidos por todo tipo de cerceamento arbitrário da liberdade de expressão. O alvo são as redes sociais, comandadas por americanos que estavam festejando no dia 20 a entrada de um ciclo de liberdades. Trump tem bom conhecimento do Brasil, inclusive levado por parlamentares americanos, sem contar os de descendência latino-americana que estão no seu governo. Certamente vai pautar suas relações com o Brasil pelo que conhece do governo brasileiro. O presidente do Brasil já pediu ajuda à presidente do México e falou em parceria. Trump deve saber que Lula é capaz de dizer algo num dia e em outro dizer o contrário. Como fazer parceria com alguém que ele considera a nova cara nazifascista?
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Eleito com a maior margem de votos dos eleitores e dos delegados dos partidos Trump tem uma enorme responsabilidade com o povo norte americano.
Isso posto escolherá a dedo suas relações comerciais e diplomáticas e nesta seara o Brasil perde tudo.
Que os ventos atuais da América do Norte, reverberem na América do Sul.
Aguardando o primeiro atrito de Lula contra os EUA.
Parabéns. Maravilhoso artigo.
Primoroso seu artigo.
Bato palmas pra você.
Louvo sua lucidez.
Acho que Trump não considera Lula confiável. Ele sabe que foi chamado de nazi-fascista meses atrás e vem, agora, com uma cartinha de bajulação deslavada, dizendo-se amigo. É impossível aliar-se com quem se alia com Maduro, Noriega, Irã, Angola, Cuba. Com quem foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Com quem esteve envolvido nos maiores escândalos de corrupção nos últimos vinte anos ocorridos no Brasil. Com quem não honra as promessas de campanha e não respeita a responsabilidade fiscal. Trump está disposto a aliar-se com o outro Brasil. O Brasil com aqueles que realmente trabalham. Com aqueles que lutam por liberdades de opinião, de crítica e querem distância do Estado. Com os que têm iniciativas e geram empregos. Com os que respeitam o teto de gastas e expurgam a maquina estatal parasita.