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Dresden, na Alemanha, em 1945, vista da torre da prefeitura, após o bombardeio dos Aliados que quase arrasou a cidade no final da Segunda Guerra Mundial | Foto: Richard Peter/Wikimedia Commons
Edição 256

Imagem da Semana: o inferno de Dresden

Há 80 anos, o intenso bombardeio dos Aliados transformou a cidade alemã em cinzas e foi um marco histórico no final da Segunda Guerra Mundial

Daniela Giorno
-

“Logo se pôde ouvir os zumbidos cada vez mais
profundos e mais fortes dos esquadrões se aproximando.
As luzes se apagaram, um estrondo nas proximidades…
Pausa para respirar, a gente se ajoelhava entre as cadeiras,
de alguns grupos vinham gemidos e choro — e nova

aproximação, nova angústia pelo medo da morte, novo
ataque. Não sei quantas vezes isso se repetiu.”
(Victor Klemperer, filósofo alemão)

No alto da Câmara Municipal de Dresden, no leste da Alemanha, a bela e resistente estátua barroca contempla o horizonte de devastação deixado pelos Aliados depois de quatro dias de um implacável ataque no coração da cidade, em fevereiro de 1945. A perfeição fotográfica registrada por Richard Peter meses depois não perdeu sua capacidade de causar inquietação.

À medida que as tropas soviéticas se aprofundavam no leste da Alemanha, a liderança Aliada se concentrava em Dresden, bem como nas cidades saxônicas vizinhas de Chemnitz e Leipzig. Foram mais de 3,9 mil toneladas de bombas lançadas pelos americanos e britânicos entre os dias 13 e 15 de fevereiro na cidade localizada às margens do Rio Elba, famosa mundialmente por sua rica arquitetura e onde basicamente só havia civis. As armas de alto poder explosivo quebraram janelas, abriram crateras nas ruas e achataram paredes. Aviões carregavam uma mistura de bombas altamente explosivas e incendiárias. O clima excepcionalmente seco junto com o vento forte transformou o ataque em uma tempestade de fogo que lambeu a cidade e incinerou dezenas de milhares de pessoas. As bombas incendiárias criaram assustadores tornados de fogo, que sugavam pessoas e carros para dentro deles. Dresden permaneceu em chamas por semanas.

O historiador Donald Miller escreveu vividamente sobre o inferno desencadeado: “Os sapatos das pessoas derreteram no asfalto quente das ruas, e o fogo se moveu tão rapidamente que muitos foram reduzidos a átomos antes que tivessem tempo de tirar os sapatos. O fogo derreteu ferro e aço, transformou pedras em pó e fez com que as árvores explodissem com o calor de sua própria resina. As pessoas que corriam do fogo podiam sentir o calor nas costas, queimando seus pulmões”.

Vista parcial do centro da cidade de Dresden destruído, do outro lado do Elba até Neustadt. No centro da imagem estão o Neumarkt e as ruínas da Frauenkirche | Foto: Wikimedia Commons
As ruínas da Frauenkirche em Dresden, na Alemanha, após o implacável bombardeio de 1945 durante a Segunda Guerra Mundial | Foto: Sovfoto/Universal Images Group/Shutterstock

Estima-se que 25 mil pessoas morreram nos quatro dias de ataque. A maior parte das vítimas eram mulheres, crianças e idosos. A Alemanha Nazista imediatamente usou o bombardeio como pretexto para atacar os Aliados. O então ministro da Propaganda, Joseph Goebbels, publicou o inflacionado número de 200 mil mortos e alegou que Dresden não tinha indústria de guerra, era apenas uma cidade de cultura.

Dresden era popularmente chamada de “Florença do Elba”, por ser considerada um centro de arte e cultura. Uma das cidades mais bonitas do mundo, por causa de sua arquitetura e tesouros artísticos. Era um importante centro industrial e de transporte. Dezenas de fábricas forneciam munições, peças de aeronaves e outros suprimentos para o esforço de guerra nazista. Tropas, tanques e artilharias atravessaram Dresden por trilhos ou estradas.

Uma imagem colorida de Dresden em 1900 mostra uma série de monumentos que foram posteriormente destruídos pelo bombardeio | Foto: Wikimedia Commons

O bombardeio de Dresden é considerado por historiadores uma das ações mais controversas dos Aliados. Tão perto do fim da Segunda Guerra Mundial, a ação foi vista como um ato de terror e militarmente questionada. Autoridades Aliadas justificaram o ataque como estratégico, uma vez que a cidade tinha tropas estacionadas no entorno, fábricas de munição e serviria de caminho para reforços ao front do leste, contra a União Soviética. Mas nada disso foi atacado. A ação se restringiu ao centro da cidade.

Dresden não era única. Os bombardeiros aliados mataram dezenas de milhares e destruíram grandes áreas com ataques a Colônia, Hamburgo e Berlim, e às cidades japonesas de Tóquio, Hiroshima e Nagasaki.

O historiador britânico Frederick Taylor escreveu o seguinte sobre os ataques: “A destruição de Dresden tem uma qualidade epicamente trágica. Era uma cidade maravilhosamente bela e um símbolo do humanismo barroco e de tudo o que havia de melhor na Alemanha. Também continha tudo de pior da Alemanha durante o período nazista. Nesse sentido, é uma tragédia absolutamente exemplar para os horrores da guerra do século 20 e um símbolo de destruição”.

O debate sobre a campanha de bombardeio dos Aliados e sobre o ataque a Dresden continua até hoje. Churchill chegou a escrever em seu livro de memórias: “A destruição de Dresden continua sendo uma questão séria contra a conduta dos bombardeios Aliados”.

Dresden, na Alemanha, em 1945, vista da torre da prefeitura, após o bombardeio dos Aliados que quase arrasou a cidade no final da Segunda Guerra Mundial | Foto: Richard Peter/Wikimedia Commons
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Daniela Giorno é diretora de arte de Oeste e, a cada edição, seleciona uma imagem relevante na semana. São fotografias esteticamente interessantes, clássicas ou que simplesmente merecem ser vistas, revistas ou conhecidas.

Leia também “A Revolução da Dignidade”

4 comentários
  1. Manfredo Rosa
    Manfredo Rosa

    Morei em Dresden 6 meses no ano de 2015. (Escrevi um livro sobre esta encantadora cidade e região). Já voltei outras vezes. A cidade está toda reconstruída, na minha opinião, mais bonita que antes. É de se admirar tudo, em especial o que os arquitetos projetaram para o reerguimente da Frauenkirche e a praça contigua, a Neumarket.

  2. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Giorno, Oeste deve ter muito orgulho de você. Te amo

  3. Marcelo DANTON Silva
    Marcelo DANTON Silva

    Que isso sirva de lição para os Conservadores!
    A guerra rasga, dilacera, desvícera sem dó ou piedade…E VENCERÁ quem faz isso com mais intensidade, perpetrando pavor no adversário.
    É exatamente isso que a esquerda está fazendo com os conservadores no Brasil, certos de que amanhã serão perdoados por tudo que fizeram nesses 6 anos. Quando vocês da direita perdoam esses tipos de ação dessa esquerda eles vencem amanhã, pois as pessoas tem medo e esse medo as fazem se aliarem aos mais ferozes..
    SEM ANISTIA aos fraudadores das eleições de 2022… não se deixem ludibriar por aquele homens de saia preta, invocando Jesus e piedade para com nossos algozes….eles contam justamente com isso para no futuro, mais uma vez, RASGAR, DILACERAR, DESVÍCERAR o contraditório e as PESSOAS que ousarem a tentar.
    Um tribunal de Nurembergue tem de ser instalado nos EUA e de lá…obliteração total da teia de aranha do Partido DEMOCRATA construída desde Bill Clinton e Obama.
    Lembrando do caso Walter Gate de Richard NIXON….ELE TINHA RAZÃO….o Partido DEMÔNIOCRATA tem de ser acompanhado de pertinho, pois são o Mal Absoluto,

    1. Marcelo DANTON Silva
      Marcelo DANTON Silva

      WATER GATE

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