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Foto: Shutterstock
Edição 258

Carta ao Leitor — Edição 258

A abolição sumária das leis está entre os destaques desta edição

Revista Oeste
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Criada em 2002 pelo Supremo Tribunal Federal, a TV Justiça atravessou dez anos com a audiência reduzida a um traço. A plateia era formada quase exclusivamente por jornalistas e advogados interessados em uma ou outra audiência de maior relevância. Na primeira década do século, raríssimos brasileiros sabiam de cor o nome de mais de três integrantes da Corte.

Então começou o julgamento do escândalo do Mensalão — e tudo mudou. Aqueles nove homens e duas mulheres cobertos por uma toga preta se tornaram celebridades. O relator do processo, Joaquim Barbosa, por exemplo, chegou a ser incluído entre os prováveis candidatos à Presidência com chances reais de vitória. 

Com os avanços da Lava Jato, a operação concentrou as atenções do país até chegar aos arredores das sedes do Judiciário e do Legislativo. Em abril de 2019, a revista Crusoé publicou uma reportagem com o título “O amigo do amigo de meu pai”. Baseada em documentos obtidos pela Lava Jato, uma das revelações era especialmente delicada: o empreiteiro Marcelo Odebrecht se referia ao ministro Dias Toffoli, então presidente do STF, pelo codinome “amigo do amigo de meu pai” em comunicações internas da empresa.

A contraofensiva foi imediata. Alexandre de Moraes ordenou a retirada do ar da reportagem alegando que o conteúdo era contaminado por “fake news” e representava um claro abuso da liberdade de expressão. Também determinou que os responsáveis pela publicação prestassem depoimento à Polícia Federal em até 72 horas.

A partir daí, o país começou a viver o que J.R. Guzzo, na reportagem de capa desta edição, qualifica de “uma situação de crescente anarquia legal”. Ministros que antes criticavam com ferocidade a Lava Jato — responsabilizada por “prisões preventivas prolongadas”, “conduções coercitivas sem justificativa legal” e “delações premiadas questionáveis” — passaram a empregar contra os envolvidos nas manifestações de 8 de janeiro de 2023 os mesmos métodos que antes condenavam .

Com uma agravante: ao contrário do que ocorreu em todas as fases da Lava Jato, o devido processo legal deixou de existir. Foram abolidos o acesso aos autos, a ampla defesa, a presunção de inocência e a razoabilidade das penas, fora o resto.

Nas sentenças que absolvem culpados e condenam inocentes, a Corte não se limitou a abolir o crime de corrupção previsto no Código Penal. Também criou um crime imaginário: usar um batom para reproduzir numa estátua uma frase dita meses antes por um dos ministros do STF. Pena para a infração: 17 anos de cadeia. “Se o ministro do STF pode fazer o que bem entende, por que eu também não poderia?”, registra Guzzo. “Essa é a pergunta no STJ, em seus similares de Brasília, nos tribunais de Justiça dos Estados e em toda a magistratura.”

Ao lado do texto de capa, artigos de Augusto Nunes, Ana Paula Henkel e Rodrigo Constantino, assim como a entrevista concedida pelo advogado Sérgio Rosenthal ao jornalista Edilson Salgueiro, dão a real dimensão da gravidade do momento vivido pelo Brasil. O Poder incumbido de ser o guardião tornou-se o mais cruel algoz da Constituição.

Boa leitura.

Branca Nunes,

Diretora de Redação

Capa da Revista Oeste, edição 258 | Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock
1 comentário
  1. Luzia Helena Lacerda Nunes Da Silva
    Luzia Helena Lacerda Nunes Da Silva

    E a gente brasileira, festeira que é, vai pra rua brincar o carnaval. Quarta de cinzas vai chegar, e a gente brasileira, guerreira que é, se prepara para ir pra rua, gritar
    ANISTIA JÁ e DEVOLVE MEUS DIREITOS. 2025 se anuncia um ano crucial e repleto de riscos. Exigirá coragem da gente brasileira.

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