A trinca faria bonito num filme sobre a máfia. Omar Aziz seria o chefão da famiglia, recomendam a expressão arrogante, a arroba que sobra na silhueta e os ternos mal-ajambrados que procuram escondê-la. Os óculos de primeiro da classe sugerem que Renan Calheiros iria bem como advogado e conselheiro do bando — mesmo que pareça nascido para interpretar um cangaceiro fashion, avisam os cabelos alisados à força e o implante que tenta inutilmente socorrer a cobertura capilar em retirada. Randolfe Rodrigues brilharia no papel do filho do chefão sem chances de tornar-se herdeiro: ordens emitidas com voz de castrato, ainda mais se reforçadas por chiliques e faniquitos, não são cumpridas sequer por sabujos capazes de passar a vida ajoelhados no altar do líder ladrão.
Para aflição do Brasil sensato, os três canastrões — todos especializados em cenas de cafajestagem explícita — são senadores do País do Carnaval, estão satisfeitos com a vida mansa no Congresso e, no momento, atuam em tempo integral na Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid. Presidente, Omar Aziz tem a cumplicidade majoritária de cinco dos 11 pais-da-pátria titulares. Relator, Renan Calheiros abriu os trabalhos com as conclusões já concluídas — e o parecer todo pronto, provavelmente encadernado. Vice-presidente, Randolfe Rodrigues é um esforçado ajudante de ordens dos generais de cordão carnavalesco. Em perfeita sintonia, o trio luta para provar que, diferentemente do que ocorreu no restante do planeta, não foi a pandemia de coronavírus que encurtou quase 600 mil vidas. Foram quatro surtos da variante JB.
Nessa linha de raciocínio, o primeiro surto obrigou cada nativo a engolir diariamente um barril de cloroquina. O segundo proibiu o uso de máscaras. O terceiro transformou a compra de vacinas em ameaça à soberania nacional. O quarto botou na cabeça dos nativos que é melhor morrer numa aglomeração provocada por Bolsonaro do que passar dos 90 anos sem beijos no rosto, abraços e apertos de mão. O Alto Comando da CPI tem reiterado nas últimas semanas que a luta continua. Azis, Renan e Randolfe seguem à caça da prova definitiva de que só no Brasil o vírus chinês pôde dispensar-se de matar os que morreram. O presidente genocida fez o serviço por ele.
Três farsantes insolentes às voltas com uma missão impossível — eis aí uma fórmula que decididamente não pode funcionar. Adicione-se a aproximação das eleições, a afobação dos candidatos a candidato da terceira via, a angústia dos que pretendem mais um mandato, a transmissão ao vivo das sessões por emissoras de TV e redes sociais, a polarização política, a nenhuma simpatia dos oradores pela língua portuguesa — e pronto: só podia dar no que deu. Pelo que fez e deixou de fazer, a CPI da Covid já assegurou um asterisco no capítulo brasileiro da história universal da infâmia. Nele será lembrado, por exemplo, que os filhotes degenerados do Inspetor Clouseau excluíram das investigações a roubalheira bilionária promovida por governos estaduais. Também se registrará que foi criada uma versão parlamentar para o velho “Você sabe com quem está falando?”, interrogação que escancara a arrogância de quem se julga condenado à perpétua impunidade. “Me respeite, sou um senador da República!”, exclamam agora os integrantes da CPI quando algum depoente diz ou faz qualquer coisa que a eles desagrade.
Foi o que fez Simone Tebet, do PMDB de Mato Grosso do Sul, ao ser qualificada de “desequilibrada” por Wagner Rosário, ministro-chefe da Controladoria-Geral da União, a quem acabara de chamar de “menino mimado”. É o que vive fazendo Humberto Costa, do PT pernambucano, ministro da Saúde do governo Lula até aparecer abraçado às criaturas do pântano drenado pela Operação Sanguessuga. Anos mais tarde, quando Costa entrou na mira da Lava Jato, essa anotação na capivara inspiraria o funcionário do Departamento de Propinas da Odebrecht que o estigmatizou com o codinome agora famoso: Drácula. O timbre da voz está meio decibel abaixo dos agudos alcançados por Randolfe. Quando gritam em dueto, produzem um som mais insuportável que os conselhos oferecidos aos depoentes por Omar Aziz. Um deles foi ouvido pelo empresário Otavio Fakhoury na sessão deste 30 de setembro: “Tire o ódio do seu coração, rapaz. Você é um negacionista que matou milhares de pessoas. O amor vai fazer você sentir-se muito melhor”.
Um senador é, essencialmente, um funcionário público — e muito bem pago
Nem sempre. O amor ao dinheiro anexou o ex-governador do Amazonas à fila de investigados no Supremo Tribunal Federal, tripulando um desvio de verbas destinadas à saúde que somaram R$ 260 milhões. Envolvidos no mesmo caso de polícia, foram presos a mulher e dois irmãos do agora conselheiro. Também contém riscos a paixão por menores de idade. Em julho, Artur Virgílio Neto afirmou que Aziz só escapou de uma CPI da Pedofilia instaurada pela Assembleia Legislativa graças à interferência do ex-senador e ex-prefeito de Manaus. “A pedido de sua mãe, respeitável e querida senhora, livrei-o de uma dura condenação penal e da desmoralização completa”, contou Virgílio. Pelo que diz na CPI, o presidente é pai extremoso, marido amantíssimo e filho exemplar. A folha corrida berra o contrário.
Na melhor das hipóteses, Aziz está alguns metros menos distante que Renan Calheiros dessa adjetivação superlativa. As relações com a filha que teve com uma amante impedem o relator de frequentar clubes de pais extremosos ou associações de maridos amantíssimos. Tampouco pode considerar-se exemplar um filho que tira o sono da mãe com encrencas empilhadas no STF. Dez inquéritos em tramitação atestam que Renan ainda é o recordista na modalidade bandidagem com direito a foro privilegiado. Outros três correm em sigilo ou sob segredo de Justiça. A marca seria ainda mais impressionante se o reincidente compulsivo não tivesse conseguido arquivar dez inquéritos por falta de provas, por decurso de prazo ou por amizade incestuosa entre réu e juiz. Mas também Renan, quando contestado, recita o mantra: “Me respeite, sou senador da República!”. Se lhe parece conveniente, troca “senador” por “relator”.
“E daí?”, poderia retrucar a vítima do comentário debochado, da molecagem humilhante, da grosseria odiosa ou de outras canalhices verbais. Um senador é, essencialmente, um funcionário público — e muito bem pago. O ocupante do cargo tem direito a R$ 165.000 por mês. Mas só é tributado o salário, hoje próximo de R$ 34.000. “Você é que me deve respeito: sou um dos pagadores de impostos que bancam o dinheirão que você recebe”, precisa ouvir o prepotente que cobra submissão de quem financia o vidaço que leva. Assim mesmo: você, não “Vossa Excelência”. Agraciar anões morais com tratamentos cerimoniosos é como dar bom-dia a cavalo. Ou enxergar uma dupla de estadistas no vigarista engaiolado por ladroagem e na cavalgadura incapaz de pronunciar de improviso uma única frase com começo, meio e fim.
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Há anos, décadas, a política brasileira só faz envergonhar e estapear os brasileiros.
Do mesmo modo essa malfadada Comissão dos Palhaços Inquisidores.
Alguém já disse na música que país é esse, só posso dizer que é uma vergonha, um deboche total.
Meu caro Augusto, meu brevissimo colega da FND (“Arcádias”, deus nos livre !!!), jamais li comentário seu impregnado de tanta generosidade como esse. Bom visitar um dicionário de adjetivos de baixo calão, apesar de ser empresa difícil encontrar palavras que se encaixem no perfil do “trio ternura”.
Não é apenas instrutivo ler a coluna do Augusto Nunes, é divertido. Descobri isso ainda em meus verdes anos. E o acompanho desde então, mas somente vim a conhecê-lo nos anos 90, no RS. Ele tinha ido para o Sul; eu, para São Paulo. Augusto era o Diretor de Redação de Zero Hora. Dez anos depois, tive a sorte de integrar sua equipe – na revista Época, no JB, na Veja on-line, e agora na Oeste. Leio o time todo. É um saboroso acepipe por semana, onde pontifica tanta gente corajosa e que sabe escrever: Guzzo, Fiuza e tantos outros. Sua Excelência, o leitor, tem boas opções no cardápio semanal. E ser editado outra vez por Branca Nunes é a cereja do bolo.
Sensacional. Que vergonha que esses três personagens causam no povo Brasileiro. Não merecemos essa gente representando o povo. Que seus estados de origem possam envidar melhores esforços nas suas escolhas
Excelente visão do Jornalista Augusto Nunes. Parabéns ao jornalismo ético e profissional desta maravilhosa Equipe da Revista Oeste. Nao desanimem. Vocês são a Esperança de muitos Brasileiros em fazer deste País uma Nação Livre.
Larry, Moe e Curly.
Larry, Moe e Curly
Jornalista Augusto Nunes, você sim é grande e nos dá voz! Obrigada, muito obrigada!
Se esses três fossem o núcleo de uma família mafiosa, pela incompetência óbvia, já teriam sido engolidos pelos competentes da área! Esse tipo de gente só se cria no serviço público brasileiro, cego, conivente, perdulário. Graças à urna eletrônica inauditavel conseguem se reeleger, é a única explicação!
Irretocável ! Essa trinca de delinquentes para nossa vergonha, são afagados pela mídia corrupta todos os dias .
Excepcional Augusto! Nelson Rodrigues ficaria orgulhoso de assinar esse texto. “Os idiotas perderam a modéstia “.
Beleza demais Augusto Nunes👍👍👍
Falou o que todo brasileiro honesto e inteligente, gostaria de publicar.
Só mesmo um texto como este para rir daqueles palhaços. Rs…
Augusto, você lavou minha alma de novo.
Dá-lhe, Augusto! Quem procura acha. Os novos inquisidores estão atirando no que viram e já acertaram o que não viram uma porção de vezes. Quem fala ou que quer ouve o que não quer. Estão exercitando um balaio de provérbios, hein! E, falando muito, já têm dado também bom-dia a cavalo.
Excelente artigo👏👏👏Esta CPI é uma vergonha nacional
Perfeito!
Brilhante artigo. Parabéns Augusto.
👏👏👏👏👏👍
TEXTO PARA SER INSERIDO NOS ANAIS DO JORNALISMO SERIO….ESSA CPI É BANANEIRA QUE NÃO DEU CACHO
Perfeito Augusto! Apenas ouso fazer uma correçao: na silhueta do asqueroso Omar devem sobrar, no mínimo, 2 arrobas, e não apenas 1, como você estimou.
Texto perfeito como sempre. Já comentei anteriormente e vou repetir, a respeito do “Me respeite, eu sou senador”: Incitatus também era senador…
Corajoso e destemido, Augusto descreve com excelente humor esses cangaceiros brasileiros que incham neste pobre pais um Congresso Nacional que nos custa R$ 12 bilhões anuais. Para que o pais precisa de 3 inúteis Randolfes por estado? Não basta 1?.
Augusto, ofereça-nos a obra legislativa desse senador nascido em Pernambuco mas com carreira politica pelo Amapá, estado com pouco mais de 500 mil eleitores e que nos disponibiliza esses inúteis Randofe e Alcolumbre. Em levantamentos que fiz, RANDOLFE votou contra as reformas trabalhista, previdenciária, MP871 de combate às fraudes da previdência, Marco Legal do saneamento básico e outras medidas econômicas desde o governo Temer. Quando perde tudo judicializa como verdadeiro despachante do STF.
Caro Augusto,
Como sempre, magistral. Mostra aos brasileiros de bem quem são esses CANALHAS.
Permita-me porém dizer que você se esqueceu de mencionar o nome do maior responsável por essa CPI. Ele é o MANDANTE desse circo de horrores. E não venham me dizer que ele não seria capaz de prever as consequências. Muito pelo contrário, sabia exatamente que tudo isso iria acontecer, por isso expediu essa ordem insana.
O nome do meliante é Luis Roberto Barroso, o famoso Boca de Veludo ou como preferem alguns, Lulu Bandeja.
É o que se pode chamar de um texto demolidor!
Brilhante
Tchê, tu tá bom de crítica. Imagine um coitado de um Delegado de Interior, ou um Juiz de primeira instância falar com um depoente, testemunha, ou até mesmo um réu, da maneira que a CPI conduziu determinados depoimentos? O Delegado e o Juiz, através da Corregedoria e da OAB seriam afastados imediatamente. Como a Rosa, mãe da CPI permite tudo, se ficar mais alguns meses chegaremos a ouvir dos membros da dita cuja expressões como você é fdp negacionista seu empresários de meia-tijela… Tudo pode acontecer.
Antológica. Arquive-se para os anais da História!
Augusto Nunes,esses senadores (com algumas exceções), não tem competência para nada,assassinam a língua portuguesa e sequer sabem pronunciar a palavra comorbidades em uma CPI que investiga a Covid.Sao ladrões explícitos, só querem desestabilizar o governo Federal.Lutam desesperadamente para manter seus salários e cargos.Vamos renovar a Câmara e o Senado,esses aí já mostraram do que são capazes.
Clouseau teve um pouco de dignidade e se matou no final. Esses farsantes, nunca e jamais terão dignidade e muito menos coragem para praticar este ato.
Excelente artigo!!
Vendo a foto voltei às minhas origens – interior de São Paulo – e dei nome às excrescências: três RONQUIFUSSA.
MAIS VERDADEIRO IMPOSSÍVEL. DESCULPEM A REDUNDÂNCIA, VERDADE É VERDADE E NADA MAIS.
A. N. Sou seu admirador e o considero um dos maiores jornalistas deste país; seu seguidor desde os tempos de Veja, quando, ao lado de outros grandes profissionais, como o próprio Guzzo, combatia a corja petista. Agora, defender o governo que aí está, também é demais. O Brasil merece coisa melhor. De qq forma, continuo a adimirar e respeitar seu trabalho, mesmo por que eu também ajudei a eleger o presidente que temos.
No entanto, adoto o lema do “nenhum dos dois em 22”. Um abraço!
Figueiredo, além da Oeste você lê o que? Me parece que anda lendo #Foice de SP, #CrusoLIXO, VEJA, #IstoEra, assistindo o JN. Meu Deus, como é facil doutrinar os tontos!
Libertadores é no SBT, Fórmula 1 na Band, covid19 na Globo, o figueiredo pelo jeito não gosta de esportes.
Perfeito 👏👏👏
Falar mais o quê? Está tudo dito.
Grande Augusto Nunes!
Maravilhoso e augusto Augusto.
Só com transparência no escrutínio que vamos varrer essa corja de micróbio e insensatez
Excepcional, como sempre.
👏👏👏👏🇧🇷
👏👏👏👏👏👏👏👏👏👏👏
Realmente a área de comentários está com erro intermitente.
Não estou conseguindo concluir meu comentário. Quando falo em classe política que enoja quem enxerga um palmo à frente do nariz, cai tudo e some meu texto. Coincidência??
Magistral, Augusto – e também hilário: “a arroba que sobra na silhueta” – hahahaha!