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Foto: AZP Worldwide/Shutterstock
Edição 95

Covid para sempre

Ao pacote pró-covid, somaram-se a gripe comum, a influenza H1000N5000, a dor de cabeça, o bicho-do-pé e tudo o mais, de maneira que é praticamente impossível não estar doente

J. R. Guzzo

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Imagine que você é um executivo de alguma empresa rica de São Paulo, ou coisa parecida, ganha R$ 60.000 por mês e está morando, digamos, na Praia da Pipa, um paraíso perto de Natal. Recebe o salário pontualmente, a cada mês; pode até ter um aumento. Seu plano médico cinco estrelas está de pé. Continua tirando férias, com 30% de adicional, e mantém o 13º inteirinho. Só que não é mais preciso comparecer ao local de trabalho. Nada de horário para entrar, possivelmente a grande divisão diária entre quem trabalha de verdade e o resto da espécie humana. Nada de trânsito. Nada de stress. Agora você se levanta à hora que quiser, faz surfe de manhã, ou alguma outra atividade fisicamente correta, almoça coisas nutritivas e investe tempo “consigo mesmo” ou com a família, como recomendam os melhores consultores em qualidade de vida. A um momento qualquer, quando se sente preparado, senta-se na frente do computador e fica lá até julgar que terminou as tarefas do dia. Recebe então um elogio do chefe (caso tenha um chefe; é possível que seja uma empresa onde não há a brutalidade dos “níveis de hierarquia”), diz “valeu, cara” no Zoom e volta a cuidar das suas próprias coisas — até começar tudo de novo no dia seguinte. Que tal, como meio de ganhar a vida?

É melhor ainda do que parece. Preocupado, talvez, com uma possível desconfiança da empresa em relação a essa história toda? Tipo: “Será que vale a pena continuar pagando tudo isso para o sujeito ficar na Praia da Pipa? Será que esse negócio de home office vale mesmo o colosso que estão dizendo?” Esqueça. Todos à sua volta — e principalmente os que estão acima — convenceram a si mesmos, desde o primeiro dia de vida nova, que o “trabalho à distância” é puxadíssimo. Dez em dez executivos que vivem hoje na praia, ou na montanha, ou no Havaí, ou seja lá onde for, dizem que estão “trabalhando muito mais” fora do escritório. Garantem que sua produtividade “aumentou”. Que estão “mais focados”, que o trabalho está mais “intenso” e por aí afora. É claro que dizem isso. Quem fiscaliza e julga o resultado do “trabalho à distância” são os próprios executivos; são eles que medem as horas trabalhadas, os índices de produtividade e a eficácia do que fazem. São eles que atestam que assim é melhor. Ou, então, quem faz a avaliação são os dirigentes de RH, seus irmãos gêmeos; jamais diriam o contrário, até porque eles mesmos, os RHs, também estão ganhando sem ir ao trabalho. Xeque-mate.

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