Continuaremos relatando as descobertas do jornalista autônomo britânico Ray Sanders, que, em novembro de 2024, tornou pública as suas indagações sobre as condições das Estações Meteorológicas de Superfície (EMS), do Gabinete Meteorológico (Met Office) do Reino Unido, especialmente quando o órgão governamental parou de lhe fornecer detalhes técnicos importantes.
A carta enviada ao secretário de Estado da Ciência, Inovação e Tecnologia britânico, Peter Kyle, questionava a ausência de 103 estações dos 302 sítios meteorológicos relatados como operacionais pelo escritório meteorológico. Devemos lembrar que são estes “dados” que são utilizados para se elaborar “políticas públicas climáticas” para a obtenção do fantasioso “balanço zero de carbono”.
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Além destes fatos, Sanders trouxe um ponto irrefutável quanto ao que chamamos de qualidade do dado coletado. Ele observou que a Organização Meteorológica Mundial (OMM-ONU) lançou um novo manual de padronização dos sítios das EMS — sejam elas manuais, automáticas, ou que coletam apenas a medição de temperaturas (as Maximum and Minumum Station Temperature) de forma que o dado coletado apresente uma qualidade satisfatória para ser utilizado em relatórios climáticos (ISO/OMM 19289:2014-E). Isso porque as denúncias apresentadas já há mais de 15 anos sobre o desleixo dos sítios continuam. O curioso foi que o próprio Met Office contribuiu para estabelecer esses padrões de qualidade. Assim, esperava-se que pelo menos dos sítios existentes de fato, as condições físicas estivessem dentro desses moldes a fim de fornecer uma coleta de dados sem interferências externas.
O dilema das estações meteorológicas
Contudo, não foi isto que se observou. Conforme as regras da OMM, só poderão entrar nos relatórios climáticos os dados coletados de estações que apresentem classificação 1 e 2, sendo que a 1 está totalmente dentro dos padrões e a 2 possua alguma fonte de calor mais próxima além de 30 metros dos instrumentos. Na prática, isso significa que as interferências ambientais não podem exceder em 1,0oC, em contaminação na obtenção da medida da temperatura do ar. Note bem, as estações de medição estão sujeitas a uma interferência externa na sua medida que pode comprometer a leitura em pelo menos 1,0oC para baixo (sombra) como para cima, sendo esta a interferência mais comum, em virtude dos objetos do entorno irradiarem calor absorvido da radiação solar — seja ela direta, em dias ensolarados, ou difusa, em dias nublados (estruturas, árvores, equipamentos, asfalto próximo, rochas próximas etc., até gelo. Tudo interfere).
Assim, as estações classe 3 já teriam fontes de calor entre 10 a 30 metros, apresentando interferências conhecidas na temperatura acima de 1,0oC. Na classe 4, as fontes de calor estão aquém dos 10 metros e interferem positivamente em 2,0oC. As de classe 5 apresentam fontes de calor entre 2,0ºC e 5,0oC, podendo exceder o limite superior. Desta forma, a OMM claramente não aceita para os relatórios dados oriundos das classes 3 a 5, sendo que as classes 4 e 5 servem meramente aos propósitos locais. Portanto, consideradas literalmente “lixo” para servirem como dados para fins de estatísticas dos relatórios de clima.
Novamente, Sanders citou que necessitou recorrer aos termos da lei de Liberdade de Informação (Freedom of Information – FOI) para acessar a lista com a localização e a classificação das estações meteorológicas do Met Office. Essas informações eram utilizadas tanto para os relatórios quanto para a geração dos dados meteorológicos sinópticos empregados para o diagnóstico do tempo. Do total das 384 estações utilizadas para os relatórios de clima, na época de sua pesquisa, em junho de 2024, somente 52 delas (13,5%) podiam enquadrar-se nas classes 1 e 2, permitindo a utilização dos dados com alguma confiança. Outras 30 estações (7,8%) entraram na classe 3, enquanto que 187 sítios meteorológicos (48,7%) foram enquadrados na classe 4. Porém, 112 estações (29,2%) estavam em sítios em piores condições. Portanto, as influências na temperatura eram tantas que foram classificadas na classe 5. Três estações não foram avaliadas.
Faltam fontes confiáveis
Acessamos o sítio de internet e constatamos as definições utilizadas pelo Met Office, que explica que as estações meteorológicas sinópticas são todas automáticas (Automatic Weather Station – AWS) e oferecem dados para a Meteorologia — mas podem também ajudar com dados para estatísticas climatológicas. Já as estações “climáticas” só medem temperaturas de forma manual, realizada por colaboradores, enviando esses registros para a confecção dos relatórios climáticos. No momento da nossa pesquisa, em dezembro de 2024, registramos 391 sítios, onde 136 eram manuais (climáticos, apenas) e 254 eram AWS. O sítio em Orlock media apenas vento.
Em resumo, cerca de 85% dos sítios meteorológicos do Met Office não são classificados como fontes confiáveis de dados para relatórios climáticos pela normatização da OMM, estabelecida pela sua Comissão para Instrumentos e Métodos de Observação – CIMO (Commission for Instruments and Methods of Observation) através do reporte OMM–nº8. Esses dados possuem pelo menos 1,0oC de interferência nas temperaturas. E a turma do alarde terrorista climático vem ressaltando a elevação de 0,8oC nos últimos 70 anos, quando não temos dados confiáveis, pois registram valores além de 1,0oC.
Os padrões próprios do Met Office
Esse assunto me fez lembrar a graduação do bacharelado em meteorologia, quando no ano de 1992 cursei a disciplina de Instrumentos Meteorológicos e Métodos de Observação, ministrada por um dos patronos da meteorologia moderna, o astrofísico e meteorologista Paulo Marques dos Santos (1927-2022), além do engenheiro e meteorologista M.Sc. Mario Festa, com auxílio do meteorologista, geógrafo e astrônomo Frederico Luiz Funari. Neste curso, um dos melhores da graduação, o entendimento da seriedade na aquisição de dados foi ministrada com a excelência devida, com metodologia doutrinária na execução dos processos, dada a enorme e vital importância da informação meteorológica de base ser registrada de forma correta. Assim, o que relatamos hoje ultrapassa qualquer noção do que é ciência, verdade etc. É simplesmente uma afronta a tudo o que se construiu por séculos.
Nestes termos, Sanders também ressaltou que o Met Office permitiu-se usar padrões próprios para as suas estações, substituindo os padrões da OMM, mas sem trazer nenhuma justificativa para isto. O pior ainda está por vir, pois, além de não manter o padrão CIMO, o escritório declarou que todas as suas estações são de classe 1 por padrão, só permitindo alterar esta classificação de forma manual:
“Ao receber a lista anexa, pessoalmente contestei a classificação CIMO do local de Hastings. O Met Office concordou com minha inspeção pessoal do local e ajustou seus registros para a classe 4. Posteriormente, contestei algumas de suas classificações CIMO de outros locais — infelizmente, um gerente sênior do Met Office (Karl Shephedson) desde então renegou qualquer oferta de discussões sobre esse assunto e o Met Office não parece mais disposto a se envolver abertamente comigo.”, relembra Sanders.
Vem mais por aí
Nas inspeções aos sítios, Sanders encontrou os costumeiros obstáculos que causam interferências. Relatou cada um deles, como subestações de energia, onde o calor dos imensos transformadores é irradiado; hortas muradas e jardins botânicos, cuja estrutura cria um microclima para produzir temperaturas mais elevadas; ambientes agrícolas de alta variabilidade térmica, como túneis de polietileno; fazendas solares, onde os painéis emitem muita energia térmica; proximidade de estruturas para contenção de animais, no Jardim Zoológico; áreas asfaltadas de estacionamentos; áreas domésticas, ao lado de galpões, churrasqueiras, casas de jardinagem; ao lado das estruturas das estações de tratamento de água; e hangares de aviação, entre muitos outros.
No capítulo final desta nossa compilação abordaremos um exemplo comparativo trazido por Sanders sobre uma estação que marca as “temperaturas recordes”, bem como as condições das novas estações abertas e se estas apresentam os mesmos problemas. Também traremos o relato sobre o histórico das estações meteorológicas que se localizam nos ambientes rurais e quais as suas condições. Será que o efeito das cidades realmente chegou a interferir em seus dados ou temos outra situação? Continue a acompanhar este longo e importante relato e as conclusões. Até lá.
Me recordo de uma palestra no Brasil em que um climatologista denunciou a desativação de inumeras estações no Brasil, nada me surpreende se a participação de FHC no Clube de Roma tenha iniciado essa estrategia pra ajudar a narrativa climatica da agenda que ocorre hoje.