Na contramão dos fanáticos pelo lockdown, a Coreia do Sul conseguiu mitigar a propagação do coronavírus sem a necessidade de realizar bloqueios rígidos como os implementados em outros países. Mesmo durante o período mais crítico da pandemia, nunca houve o fechamento total do comércio, restaurantes, bares ou cafés. O país tem uma das maiores proporções de trabalhadores autônomos do mundo — cerca de 25% da força de trabalho —, o que torna a Coreia bastante vulnerável a crises. A mensagem do governo local tem sido consistente: evite aglomerações, lave as mãos e use máscara. Ou seja, o foco permanece nas medidas de proteção, que já se mostraram eficientes no combate à covid-19, e não na restrição de liberdade da população.
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Desde o fim do ano passado, a Coreia enfrenta um novo surto de covid-19. Em dezembro, o país registrou um pico de 1.200 casos diários da doença e 40 mortes em 24 horas, o maior número de óbitos diários registrados desde o início da pandemia. Segundo autoridades de saúde locais, neste mês de fevereiro, a onda de contaminações pode ter se agravado em razão do feriado do Ano Novo Lunar, quando milhões de sul-coreanos viajaram por todo o país para visitar parentes ou locais turísticos.
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Mesmo diante do aumento de contaminações, o governo é cauteloso em adotar medidas para conter o vírus e ao mesmo tempo preservar empregos e evitar o colapso na economia. O sul-coreano Yoo in Park, de 72 anos, está em Bucheon, cidade com cerca de 850 mil habitantes que fica na região metropolitana da capital Seul. Park conversou com Oeste e contou que lojas e shoppings estão abertos normalmente e bares e restaurantes funcionam até as 22 horas. Aglomerações com mais de cinco pessoas estão proibidas e a população é obrigada a usar máscara e a respeitar o distanciamento social. “Aqui, nunca houve lockdown. Está tudo mais devagar, mas está normal”, diz Park. Ele mora no Brasil há 50 anos e viajou com a esposa para o país asiático em outubro do ano passado. Sobre o uso de máscaras, hábito que os brasileiros tiveram de aprender na marra (e ainda assim com muita dificuldade), Park conta que os sul-coreanos já estão acostumados — “o povo é disciplinado, todo mundo usa”.
Rastreamento epidemiológico do coronavírus
Uma das principais cartadas para enfrentar a pandemia na Coreia do Sul tem sido os diagnósticos massivos para a doença, obtidos por meio de uma política de testagem do maior número possível de pessoas. A liberação de testes permitiu a identificação rápida de áreas onde a doença está ocorrendo com maior frequência, o isolamento de bairros críticos, bem como a desinfecção dessas regiões. Além disso, a polícia e os serviços médicos voltaram boa parte de suas forças para fazer um trabalho de detetive na identificação e rastreio dos indivíduos com quem os primeiros contaminados tiveram contato. “Recebo mensagens no celular quase diariamente com informações sobre a pandemia, número de contaminados, bairros mais afetados, pessoas que receberam diagnóstico positivo”, explicou Park. “Em cada comércio, cada lugar que você vai, é preciso deixar o contato”.
O sucesso da estratégia se traduz em números: com 52 milhões de habitantes, a Coreia do Sul registra cerca de 86 mil casos da covid-19 e 1.550 mortes em razão da doença desde o início da pandemia. Ao percorrer o caminho do meio, a nação do leste asiático transformou-se num caso de sucesso no controle da pandemia: 30 mortos por milhão de habitantes, de acordo com os dados registrados pelo site Worldometer na última sexta-feira, 19. Uma cifra que nem se compara com as de países como Bélgica (1.878), Reino Unido (1.753) ou Itália (1.571).
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Vacinação contra a covid-19
A vacinação contra a covid-19 na Coreia do Sul está prevista para se iniciar em 26 de fevereiro. O Ministério de Alimentos e Segurança de Medicamentos, a “Anvisa” sul-coreana, concedeu no último dia 10 a aprovação condicional para o uso da vacina da Oxford/AstraZeneca. O imunizante, fabricado localmente pela SK Bioscience, é o primeiro a ser aprovado no país. Segundo a agência Reuters, o primeiro-ministro da Coreia do Sul, Chung Sye-kyun, também fechou acordos para comprar os produtos da Novavax e da Pfizer. “Só estou esperando receber a vacina para voltar ao Brasil”, diz Park.