Os anos 1980 foram muito ricos para a música brasileira. Especialmente quando comparados com a miséria atual em que a nossa cultura se afundou. Em São Paulo, as casas noturnas disputavam o público com artistas e bandas que apontavam novos caminhos, obviamente sem ajuda estatal.
Uma dessas bandas foi a Lagoa 66. Ela começou no estilo funk rock do Red Hot Chili Peppers de início de carreira e foi encontrando seu caminho próprio. Seus músicos eram excepcionais: Tadeu Eliezer (guitarra), Rogerio Naccache (vocais e percussão), Sergio Bartolo (baixo), Marcelo Mulnari (guitarra) e Leonardo Giordano (bateria), com participação eventual de Fernando Moraes (percussão).
Agora a vida e morte dessa banda podem ser conhecidas no documentário produzido e dirigido por Rogério Naccache, disponível pelo YouTube. (Disclaimer: como um dos letristas do Lagoa, eu sou um dos entrevistados). O cantor Ed Motta, uma das revelações dos anos 1980, dá seu depoimento mostrando o quanto admirava esse quinteto de espírito hip-hop sem limitações de temas.
O Lagoa falava da burocracia jurídica (em “Processo”), de explosão em usina nuclear (“Nyet Tchernobyl”), do poder de sobrevivência das baratas (“Não Pise”), séries antigas (“Iabadabadu”) e do sentido da vida (“Raça Humana”). Já na década de 1980 gozava dos intelectuais que planejavam a revolução em mesas de bar.
O que deu errado com o Lagoa 66? Faltou um plano de carreira e sobraram brigas internas. Depois de uma dessas brigas, Rogério Naccache saiu da banda e eles gravaram um CD com Rick Bonadio, o produtor dos Mamonas Assassinas. Não deu muito certo.
O documentário serve como um registro histórico dessa época tão agitada e rica para a nossa música. Havia talento no ar, e praticamente todas as bandas brasileiras de rock que ficaram famosas vieram desse circuito de casas noturnas. Mas o Lagoa era especial. Fazia música de alta qualidade com senso de humor e suingue. O documentário relembra até algumas de suas brigas.