Quando o assunto é bater no identitarismo, confesso que minha veia conservadora se aflora. Acredito piamente que o identitarismo seja essa a nova religião a ser combatida no Ocidente, a mais nefasta e perigosa dos fideísmos autoritários desde as Cruzadas medievais.
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O identitarismo, isso é, a ideologia que tenta planilhar a realidade a partir da percepção psicológica dos indivíduos com relação aos seu gêneros ‒ partindo já do pressuposto de que gênero e sexo biológico não estão ligados ‒ trata-se de um dos males que o “progressismo” imputa à sociedade contemporânea. Há outras teses que complementam e nutrem o identitarismo, tal como:
- pós-modernismo filosófico
Rejeita a ideia de verdades objetivas.
- feminismo radical
Braço direito do identitarismo, que atua a partir de um terrorismo retórico-político no meio público a fim de impor suas pautas às massas e corporações.
- construtivismo pedagógico
Afirma que a mente humana é uma espécie de papel em branco, no qual a cultura e o ambiente social são capazes de fazer e refazer padrões sem nenhum tipo de inatismo biológico a influir nesse processo.
Bons livros sobre o “progressismo”
Existem bons livros que tratam desse tema atualmente. Alguns deles até já resenhei aqui nesta coluna, talvez o mais completo deles que já li foi Teorias Cínicas, de Helen Pluckrose e James Lindsay, editado pela Faro Editorial sob o selo Avis Rara. Àqueles que têm um certo conhecimento filosófico e histórico, ali encontrarão o começo, o desenvolvimento e as perspectivas dos autores sobre até onde poderão chegar o “progressismo” e seu identitarismo autoritário. Um ótimo livro!
“A esquerda é muito mais eficiente em popularizar suas críticas do que os conservadores”
Pedro Henrique Alves
No entanto, a minha crítica aos livros sobre essa temática trata-se da robustez de conhecimento que se exige do leitor para a compreensão do problema e sua extensão. A esquerda é muito mais eficiente em popularizar suas críticas do que os conservadores. Ela pulveriza de forma simples e constante as suas ideias, suas refutações e soluções, deixando-as num linguajar claro e, por vezes, até simplório. Faltava, na minha percepção, um livro que desse conta de sumarizar o problema do “identitarismo progressista” e o colocasse numa linguajem de comum acesso ao indivíduo médio.
Pois bem, como todo bom bibliófilo, costumo comprar mais livros que minha capacidade de leitura suporta. E numa dessas minhas andanças em minha biblioteca, encontrei num canto empoeirado o livro A mente parasita, de Gad Saad, lançado pela Editora Trinitas, na segunda metade de 2021. Mais um livro que comprei depois da indicação de Jordan Peterson e, por força das demandas profissionais e leituras em andamento, ficou escanteado para um momento vindouro. Pois bem, resolvi mergulhar nele no último fim de semana — e não me arrependi.
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Resenha sobre a obra de Gad Saad
Gad Saad aposta numa abordagem direta dos problemas progressistas — pautado, principalmente, em suas experiências pessoais na academia. O primeiro capítulo do livro, e parte do segundo, aborda a problemática do identitarismo e da censura politicamente correta através de suas experiências pessoais.
O autor de A mente parasita é um judeu libanês que se refugiou no Canadá depois da guerra civil em seu país natal. A sua visceral defesa da verdade e da liberdade individual, influenciado por seu gene e experiências, fez dele — segundo ele próprio — um irredutível cruzado contra qualquer tipo de autoritarismo e censura.
Saad é mais um, podemos assim dizer, fruto de eventos de censura “progressista” nas universidades, tal como Jordan Peterson. O libanês-canadense é acadêmico de carreira, professor de psicologia evolutiva na John Molson School of Business, da Universidade Concórdia, e experimentou o silenciamento e a repressão autoritária do “progressismo” em sua cátedra. E assim sendo, desde meados de 2014, resolveu colocar sua armadura intelectual refinada e ir à guerra pública contra o “progressismo” e suas teses.
“Saad mostra-nos também que, para defender os princípios do Ocidente não necessariamente é preciso concordar com todos que engrossam essa fileira apologética”
Pedro Henrique Alves
Confesso que fico um tanto desconfortável com o excesso de autoelogios que o autor derrama sobre si próprio. Na primeira metade da obra, ele parece, muitas vezes, tentar provar aos leitores as suas virtudes e retidões morais incontestes. Pode ser, e prefiro assim acreditar, que seu estilo ensaístico de escrita, e a “pessoalização” de sua crítica passa necessariamente por essa etapa de incensamento de si mesmo.
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Gosto de escrever ensaios com tons pessoais também, mas prefiro um tom de autodegradação humorística, a sátira autodepreciativa sempre me pareceu mais eficiente no quesito “prender a atenção do leitor” do que autoelogios constantes. Ok, pode ser birra minha, apenas uma implicância de modos, então ignorem esse comentário se preferirem, mas caso leiam o livro, logo nas primeiras páginas perceberão o que eu digo.
“Brilhantismo” do livro crítico ao “progressismo” e em favor dos valores do Ocidente
No entanto, tal característica do livro não retira em nada o brilhantismo da obra como um todo. E a virtude dela frente às demais que li sobre o tema refere-se à sua capacidade de cobrir quase que inteiramente o problema teórico, a hipocrisia e autoritarismo prático do progressismo esquerdista que nos cerca.
É de fato impressionante como, com uma linguagem acessível, ele expõe de forma agradável e eloquente seus argumentos. Valendo-se de um paralelo com a parasitologia, comparando o “progressismo” com um parasita que infecta nossos cérebros e retira de nós a cara capacidade de percepção da realidade, a nossa livre escolha e até mesmo o bom senso mais basal, Saad passa o livro todo desenvolvendo tal metáfora ao qual, no final, ele conclui com louvor.
“Se você está em dúvida sobre um bom presente de Natal para seu sobrinho woke desconstruído, ou para seu tio comunista raiz, está aí uma ótima opção”
Pedro Henrique Alves
Partindo de um ponto de vista, ao que parece, ateu ou agnóstico, Saad mostra-nos também que, para defender os princípios do Ocidente não necessariamente é preciso concordar com todos que engrossam essa fileira apologética. Ao contrário de Peterson, Saad parece estar contente e tranquilo em seu agnosticismo — ou ateísmo — sincero, fazendo da defesa dos valores do Ocidente um trabalho puramente lógico e pragmático. São os valores que permitem uma liberdade real ao indivíduo, que propiciam um ambiente sadio para a busca da verdade e do desenvolvimento racional, político e tecnológico da humanidade.
Por fim, acredito que até o momento não tenha surgido uma metáfora que dê conta de expor de forma tão aguda e esclarecedora aquilo que de fato é o “progressismo” e o identitarismo na contemporaneidade: um parasita mental capaz de carcomer cérebros, corroer virtudes e envenenar legados em nome de uma ideologia totalmente inflamatória e mortal à civilização do Ocidente.
Saad tem, na minha opinião, um dos principais livros sobre o “progressismo” para quem quer entendê-lo de forma simples. Se você está em dúvida sobre um bom presente de Natal para seu sobrinho woke desconstruído, ou para seu tio comunista raiz, está aí uma ótima opção.
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Boa explanação e dicas de livros!