O Banco Central (BC) terá, na segunda metade do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), papel ainda mais crucial que na primeira. É o que afirma o jornal O Globo em editorial desta quinta-feira, 20.
A publicação destaca que, para estimular a economia, o governo expandiu sem cerimônia o gasto público. E um dos efeitos colaterais foi a inflação. Em 2023, ela ficou em 4,62%, pouco abaixo do teto da meta. No ano passado, subiu para 4,83%, acima do limite. Nos últimos 12 meses, está em 5,06% (mais de meio ponto de estouro).
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“De um lado, o governo jogava lenha na caldeira, e, do outro, o BC tentava baixar o fogo subindo os juros”, diz O Globo. “No último trimestre do ano passado, a economia finalmente desacelerou.”
“À primeira vista, poderia ser o prenúncio de menor pressão inflacionária e de política monetária menos restritiva”, acrescenta o jornal. “Mas, como mostrou nesta quarta-feira a alta dos juros — a taxa básica foi para 14,25%, nível mais alto desde outubro de 2016 —, a história não é bem assim. No comunicado, o BC acertadamente deixou a porta aberta a novos aumentos, mas previu ajustes menores. Espera-se que continue a se orientar por razões técnicas.”
Banco Central está ciente dos riscos políticos do Brasil
Se Lula privilegiou crescimento a qualquer custo nos dois primeiros anos de mandato, que esperar dos dois últimos, com popularidade em queda e uma eleição presidencial chegando? O BC se mostra ciente do risco. “Há evidências claras de que a agenda política prevalecerá em detrimento da política econômica responsável”, afirma o veículo.
No mês passado, o governo mudou as regras de saque do FGTS, com intenção de colocar R$ 12 bilhões em circulação. Na semana passada, lançou o programa Crédito do Trabalhador, um consignado para assalariados do setor privado que estimulará o consumo. Nesta semana, enviou projeto ao Congresso para ampliar os beneficiados por isenção de Imposto de Renda.
“Com tantos incentivos, é difícil prever quando a Selic voltará a cair”, afirma O Globo.
A inflação continua alta. Até 2024, o cumprimento da meta era avaliado em dezembro, quando se comparava o índice anual ao objetivo. A partir deste ano, a metodologia será diferente. Se a inflação ficar fora do intervalo de tolerância por seis meses consecutivos, a meta não poderá ser considerada cumprida. Desde outubro, o acumulado em 12 meses está acima do teto de 4,50%. É difícil acreditar que haverá queda significativa até julho.
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Com o alívio na cotação do dólar, analistas reduziram previsões, mesmo assim nada sugere mudança de rumo. Confirmado o quadro, o PT fechará o segundo ano seguido com meta estourada. Desde a criação do sistema de metas, em 1999, isso só aconteceu duas vezes. Nos governos Fernando Henrique, quando o Brasil foi contaminado pela crise em mercados emergentes, e Jair Bolsonaro (PL), com a pandemia.
“O cenário externo traz ainda mais pressão inflacionária ao Brasil”, avalia o jornal. “Desde que assumiu a Casa Branca, Donald Trump tem se mostrado um protecionista ferrenho. Para o início de abril, promete trazer novas medidas que afetarão o comércio com dezenas de países, Brasil inclusive. Elas terão o potencial de desestabilizar a economia global e o preço de produtos nos mais variados mercados.”
O Banco Central norte-americano, o Fed, manteve ontem os juros inalterados em 4,5%, apesar de ainda haver expectativas de cortes neste ano. A guerra comercial de Trump poderá, contudo, frustrá-las. “Diante de todos os riscos, o Banco Central brasileiro não poderá ceder aos apelos populistas”, conclui o texto.