Em 2001, o economista Jim O’Neill alertava sobre novas economias. Nascia o termo Bric. Brasil, Rússia, Índia e China entravam no radar emergente. O termo serviu de embrião para um bloco político que aos poucos vem se tornando uma estrutura robusta também na frente econômica, especialmente depois da criação do seu Novo Banco de Desenvolvimento. Ampliado e amadurecido, o desafio que se apresenta neste momento para os Brics é sobre sua liderança e também os rumos do bloco, exatamente os temas desta reunião de cúpula na África do Sul.
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A pauta se debruça sobre vários assuntos. Na frente econômica, o Brasil defende a implementação de uma espécie de moeda comum, especialmente para transações comerciais. O tema, apesar de compor a agenda brasileira, está mais sob a esfera política do que propriamente econômica. O próprio Jim O’Neill considera a ideia “ridícula” e “quase embaraçosa”, uma vez que o mecanismo também pouco interessa em termos reais a economia chinesa. A chamada proposta de desdolarização está longe de ser uma pauta uníssona e, de fato, é na verdade um mero movimento político.
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Para além disso, a ampliação do bloco tem surgido como um tema recorrente que causa certa preocupação para o Brasil. Com apenas cinco países, todos possuem certo grau de protagonismo, e a adesão de novos parceiros pode fazer com que a importância de cada um diminua sensivelmente. Haveria uma diluição de poder, com enfraquecimento da influência do Brasil, além de um claro fortalecimento da China, que assumiria de maneira informal um papel de liderança real do grupo.
Outra preocupação é a chegada de países que estão longe de serem democracias e que também serviriam simplesmente para chancelar a liderança chinesa, atuando como seus satélites políticos dentro do grupo. Entre os favoritos para uma primeira rodada de expansão estariam Arábia Saudita, Emirados Árabes e Argentina. Porém, China e Rússia tentam atrair também governos como o do Irã, Egito e Venezuela. Estão na lista de candidatos ditaduras como a do Vietnã, Bahrein, Kuwait, Belarus, Cuba e Etiópia.
A estratégia por trás do Brics — e do clube chinês
A estratégia é simples. Com decisões tomadas por consenso, os Brics têm bloqueado referências mais explícitas aos direitos humanos ou democracia por imposição da China. Acredita-se que — com a inclusão de regimes totalitários, autoritários e autocráticos — esta agenda simplesmente desaparecerá como vimos no caso da invasão russa na Ucrânia. Na realidade, os Brics se tornaram atrativo para países que carecem de abertura política e econômica, com a expansão tornando-se um simples instrumento de operação dos interesses da agenda externa da China.
“Os Brics seguem com a clara tendência de traduzir os interesses de Moscou, em menor proporção, e Pequim, de forma consistente e firme” (Márcio Coimbra)
Enquanto os Brics emergem como um bloco dominado pela China, Jim O’Neill sugeriu anos atrás a atenção para outro grupo de países: Mint — México, Indonésia, Nigéria e Turquia. Algo que poderia representar uma importante nova força no xadrez político mundial. Até que novas forças se organizem ou que os instrumentos tradicionais de poder se imponham, os Brics seguem com a clara tendência de traduzir os interesses de Moscou, em menor proporção, e Pequim, de forma consistente e firme. O clube chinês toma forma e fortalece sua musculatura para os próximos movimentos.
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Curioso. A primeira foto mostra só um ensaiando um ‘mãos ao alto’.