Alto, magro, com passos tranquilos, voz grossa e mansa. César Luis Menotti, de conversa franca, sempre acompanhada de um cigarro na mão, morreu neste domingo, 5, aos 85 anos, na Argentina. Ele foi o técnico que transformou o futebol no país, ao comandar a seleção argentina campeã mundial em 1978. Desde março, estava internado em Buenos Aires, com anemia.
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El Flaco (o Magro), como era conhecido, nasceu em Rosário, em 5 de novembro de 1938. Apaixonado por futebol desde criança, logo iniciou a carreira no Rosário Central, como meio-campista, depois de passar pelas categorias de base do clube. Jogou no Racing, Boca Juniors e veio para o Brasil, onde atuou no Santos de Pelé e no Juventus-SP.
Ao acompanhar os treinamentos no Santos, Menotti passou a vislumbrar seu conceito de jogo, que o transformaria em um dos maiores, senão no maior, treinador de futebol argentino de todos os tempos. Sentiu-se como um emissário, na casa do adversário, o futebol brasileiro que tanto admirava.
E, ao ver as movimentações harmoniosas de Pelé, Coutinho e Mengálvio, como uma dança, se entusiasmou em buscar para o futebol argentino, que passava por uma entressafra, a reedição de um estilo similar ao dos anos 1930, 1940 e 1950, quando o River Plate, La Máquina, encantou o mundo com uma geração criativa, formada por Carlos Peucelle, Adolfo Pedernera, Nestor Rossi, Ernesto Grillo, Félix Loustau, Omar Sívori e o maior de todos até então, Alfredo Di Stéfano.
Mais do que atuar, construir uma equipe passou a ser a melhor forma dele expressar aquela paixão de menino pelo esporte. Tornou-se auxiliar técnico na equipe do Newell´’s Old Boys, rival de seu Rosário na cidade. E na temporada de 1972–73, com o Huracán, conseguiu seu primeiro título como treinador ao vencer o Torneio Metropolitano, um dos dois mais importantes na época.
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Ainda em início de carreira, ele já mostrava talento em montar uma equipe jovem e surpreendente. Deslumbrou o país ao ajudar a revelar craques como Miguel Brindisi, Carlos Babington, René Houseman, já os utilizando nas Copas do Mundo seguintes. Sim, porque em 1974, a Associação de Futebol Argentino (AFA) descobrira no jovem treinador um potencial promissor.
Em 1974, o time não engrenou como o esperado na Copa do Mundo da Alemanha, sendo inclusive derrotado pelo Brasil de Zagallo. Mas, em 1978, também enfrentando o Brasil, desta vez com empate de 0 a 0, justamente em Rosário, o time de Menotti colocou em prática toda a filosofia que ele implantou em curto período. Tática e técnica se uniram em grande estilo.
Menotti deu condições para Daniel Passarella, protegido pelo combativo volante Americo Gallego, esbanjar qualidade técnica como quarto zagueiro. Buscou em Osvaldo Ardilles o que, tempos depois, o treinador Josep Guardiola veria em Xavi, o articulador inteligente do Barcelona. E fez de Mário Kempes o falso nove, chegando de surpresa ao ataque, o que Guardiola também repetiu com Messi.
A Argentina, mesmo com a polêmica vitória por 6 a 0 sobre o Peru, equipe que teria permitido a vitória, ganhou com méritos aquela Copa, ainda superando na final a Holanda que vinha com toda aquela evolução tática, assimilada também por Menotti, do Mundial de 1974, com Cruyff no campo e o treinador Rinus Michels fora dele.
Ecos de Menotti na seleção de 2022
Em 1982, já com Diego Maradona, o sucesso não foi o mesmo. Mas Carlos Bilardo, treinador da Copa de 1986, novamente se inspirou nos conceitos de Menotti para conquistar novo título mundial para a Argentina. Muito em função das ideias do treinador, que certamente foram determinantes para Maradona atingir seu ápice e ser o jogador que foi.
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Os ecos de Menotti, que depois treinou o Barcelona, entre outros, se tornaram permanentes. Menotti inclusive, ainda em 2024, era o diretor de seleções da AFA. Toda vez que bebiam de sua fonte, as seleções argentinas se tornavam referência.
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A última delas, muito elogiada por ele, foi a campeã mundial de 2022, comandada por Lionel Scaloni e com Lionel Messi em estado de graça. Do mesmo jeito que, um dia, aconteceu com Maradona.
“Nos deixou uma grande referência do futebol argentino. Condolências a sua família e entes queridos”, afirmou Messi, reconhecendo a contribuição de Menotti também para a sua carreira.
Os maiores ídolos argentinos, Maradona e Messi, brilharam muito também porque percorreram com genialidade os espaços desenhados pelo velho mestre. Tornaram-se eternos em razão disso. Não, não se pode dizer que o futebol argentino está de luto.