Em 23 de maio deste ano, o Centro Nacional de Furacões dos Estados Unidos (National Hurricane Center, NHC) anunciou seu costumeiro prognóstico sobre as atividades dos ciclones tropicais do Oceano Atlântico Norte para 2024. A temporada começou em 1º de junho e vai até o dia 30 de novembro.
A primeira estimativa tem um leque de opções um pouco mais amplo devido ao longo tempo que envolve a cobertura do prognóstico. Geralmente, com o passar dos primeiros meses e com reforço das observações oceânicas e atmosféricas, um novo prognóstico é lançado, considerando-se as atividades passadas e as probabilidades de ocorrências no quadro geral.
Para este ano, os meteorologistas do NHC, um departamento da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (National Oceanic and Atmospheric Administration, NOAA), prognosticaram uma temporada mais ativa, com cerca de 85% de chances dela se apresentar acima da normal climatológica para a região do Atlântico. O prognóstico também incluiu a chance de 10% para que a temporada fique próximo da normal e apenas 5% para que todo o período dos furacões registre ocorrências abaixo da normal.
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Espera-se que de 17 a 25 tempestades tropicais, um dos tipos de ciclones tropicais, sejam moderadas. Destas, de oito a 13 poderão se tornar furacões, sendo que destes, de quatro a sete poderão evoluir para furacões de alta intensidade (CAT-3, 4 e 5), dentro de uma média de três, segundo este prognóstico.
O relatório completo da NOAA trouxe alguns indicadores que orientaram o prognóstico para este ano, sempre baseando-se em situações pretéritas. Assim, uma temporada acima da média está apoiada na mudança de sinal do fenômeno El Niño-Oscilação Sul (Enos), no Oceano Pacífico, que sairá da sua fase de um intenso El Niño, migrando para a fase de La Niña, prognosticado para ocorrer a partir da metade do ano.
El Niño
Em eventos de El Niño, os ventos em média altitude sopram de oeste para leste, na área da América Central e do Caribe, oscilando entre as latitudes de 10 a 20oN. Como os ventos de superfície são predominantes de leste, estas condições geram um cisalhamento dos ventos dentro da coluna da troposfera, a primeira camada da atmosfera de baixo para cima.
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Deve-se lembrar que na situação de cisalhamento, ou de ventos cortantes, o sentido do vento vai se alterando conforme se muda a altura dentro da troposfera. Como a evolução, maturidade e até severidade dos ciclones tropicais necessitam de uma formação bem organizada de suas células primárias, ou seja, as nuvens Cumulonimbus, se estas não atingirem a plenitude de tomar toda a extensão da troposfera tropical (que pode chegar até 18km de altitude), ou se a organização se desmantelar por causa do cisalhamento vertical, então haverá um sério comprometimento na sua formação, ou simplesmente na sua própria manutenção.
Com a mudança para La Niña, a condição de vento contrário no Caribe é bastante dirimida, tendo em vista que o quadro sobre o Oceano Pacífico tende a apresentar ventos seguindo o mesmo padrão do Atlântico, ou seja, com ventos na área tropical soprando de leste para oeste na baixa troposfera. O Pacífico, em particular, terá os ventos intensificados, levando agora, a uma maior precipitação no seu setor noroeste, atingindo o Japão, mas majoritariamente, no setor sudoeste, atingindo toda a região insular da Polinésia, Nova Zelândia e, principalmente, o leste da Austrália.
Atlântico
Voltando ao Atlântico, o NOAA elencou as altas temperaturas da superfície do oceano tropical como um dos fatores que influenciaram na decisão de se lançar um prognóstico com 85% de chances de que a temporada seja acima da média. Deve-se lembrar que o espelho d’água do oceano deve apresentar uma temperatura da superfície do mar (TSM) acima de 26,5oC e que a Camada de Mistura (a primeira camada do oceano de cima para baixo que chega até aproximadamente 100 metros de profundidade, em geral) deve apresentar temperaturas próximas à da superfície, resfriando-se muito pouco, conforme aumenta a profundidade, em pelo menos 50 metros, ou seja, quase a metade de sua extensão.
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Segundo o relatório, a condição da Camada de Mistura, descrita anteriormente, apresenta-se ideal para a manutenção de grandes sistemas, tendo em vista que são as águas quentes do oceano que suprem de energia os ciclones tropicais. Este quadro é reflexo direto na redução de nuvens em boa parte da área atingida pelo anticiclone do Atlântico Norte e pela maior atividade solar do período, cuja combinação permitiu a maior incidência de radiação de onda curta na superfície oceânica, aquecendo as suas águas. A circulação dos ventos Alíseos, que está levemente enfraquecida neste ano, ajuda a concentrar essas águas quentes na área tropical, preparando o cenário da bacia do Atlântico para uma temporada que promete ser mais ativa.
O relatório apresentou um quadro analítico de todo o Atlântico Norte, elencando os principais fatores esperados para os meses de agosto a outubro, auge da temporada. Além dos valores de TSM acima da média por toda a área principal de desenvolvimento de ciclones tropicais e o baixo cisalhamento de vento na região caribenha e adjacências, a NOAA também citou o enfraquecimento dos ventos Alíseos, logo no início do seu percurso oceânico, no setor Leste tropical do Atlântico, derivado de um intenso efeito monçônico no Oeste africano (figura 1).
O relatório ainda fez uma revisão da temporada de 2023 que apresentou 19 tempestades tropicais nomeadas, das quais sete se tornaram furacões e destes, três atingiram as categorias de furacões de alta intensidade (Franklin, Idalia e Lee). Apenas o Idalia alcançou o continente nesta escala, na região do Estado norte-americano da Flórida, em 30 de agosto de 2023, diminuindo sua intensidade imediatamente ao chegar em terra. No cômputo total da temporada, foram 12 fatalidades diretas, ocorridas nos EUA, incluindo as ocorrências do “furacão” no Pacífico, o já lendário Hilary, no Estado da Califórnia. Os prejuízos materiais foram orçados em US$ 4 bilhões, acrescidos de US$ 900 milhões devido ao Hilary, na costa oeste dos EUA.
Antigos e novos furacões
Segundo a apresentação, a precisão do prognóstico do NHC continua a melhorar no tocante à projeção dos traçados dos furacões dentro do intervalo de 72 horas. Na região do Atlântico, a projeção para esse intervalo reduziu seus erros, saindo de 387 km, no ano 2000, para 75 km, atualmente. Quanto à intensidade, medida em velocidade de ventos que se mantém, os erros eram de 20 nós (37 km/h) na estimativa de 72h, em 2000, e caíram para a metade (10 kt ou 18,5 km/h), atualmente.
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O NHC também ressaltou a grande importância de exercer vigilância e manter a comunicação social bastante ativa, ajudando na prevenção, evitando a perda de vidas, especialmente por motivos banais como a exposição aos riscos desnecessários.
Embora a “coqueluche” dos ciclones tropicais seja o Atlântico, justamente por causa do seu deslocamento em sentido aos EUA, o NHC também atende à costa oeste norte-americano, exercendo monitoramento no Pacífico Leste e Central. Nestes dois imensos setores, os prognósticos são diametralmente opostos, derrubando qualquer “tese” da turma alarmista de que os “eventos extremos” (seja lá o que esta expressão represente) estejam a aumentar por causa do “aquecimento global”, “mudanças climáticas”, ou porque o papa quer.
Segundo o relatório, o setor do Pacífico Leste (costa oeste dos EUA) tem a probabilidade de 60% de apresentar uma temporada abaixo de sua média (contra 30% próximo da normal e apenas 10% acima desta), enquanto o Pacífico Central (Havaí) tem 50% de probabilidade de apresentar uma temporada também abaixo da sua normal (30% próximo da normal e 20% acima desta).
Não estranhe que a quantidade de sistemas, sua formação e adensamento geográfico se apresentem diferentes em cada bacia oceânica, ano depois de ano, porque essa variabilidade é intrínseca à verdadeira natureza da climatologia dinâmica. Qualquer conversa que afirme que isto envolve “mudança climática” causada por humanos não tem o menor embasamento científico.
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