Esta é uma semana turbulenta para a Coreia do Sul. O presidente do país, Yoon Suk Yeol, decretou Lei Marcial nesta terça-feira, 3, a qual transferia o controle civil para as autoridades militares. O Parlamento sul-coreano derrubou a medida apenas algumas horas depois, mas a repercussão não acabou.
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O ministro da Defesa renunciou nesta quarta-feira, 4. Também hoje, um grupo de partidos de oposição apresentou um pedido de impeachment de Yoon. Se governar já estava difícil, agora é pouco provável que ele permaneça no cargo, disseram os especialistas ouvidos por Oeste.
Presidente da Coreia do Sul deve deixar o cargo
O cenário para Yoon, que já não era favorável, tornou-se de isolamento político diante da derrota da tentativa de Lei Marcial. Conforme a descrição de Alexandre Uehara, coordenador do núcleo de estudos em negócios asiáticos da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) de São Paulo, “o Parlamento já era opositor, a popularidade entre a população não chegava a 20%, e agora seus próprios ministros estão renunciando aos cargos”.
Dessa forma, o especialista diz ser pouco provável que o presidente permaneça no cargo. Uehara aposta em um aumento da pressão por um processo de impeachment contra Yoon, mas não descarta a chance de renúncia.
A projeção é a mesma feita pelo coronel Fernando Montenegro, professor da Autonoma Academy em Lisboa. “Provavelmente, Yoon deverá renunciar ao cargo ou ficar fragilizado politicamente, e a instabilidade interna deverá se agravar na Coreia do Sul.”
Contexto da política sul-coreana
Eleito em 2022, Yoon Suk Yoel venceu por margem apertada e enfrenta forte oposição no Parlamento desde então, explicou Uehara. O presidente, portanto, não tem conseguido implantar políticas e leis de seu plano de governo.
Além da fragilidade política, pesam ainda acusações de corrupção contra a mulher de Yoon. “Então, já havia ali no cenário uma possibilidade de ação de impeachment contra ele, em função dessa situação toda”, diz Uehara. Foi tal contexto que influenciou o presidente sul-coreano a decretar Lei Marcial.
No entanto, a tentativa fracassou devido à resistência dupla: do Parlamento e da população. Apesar de a Lei Marcial estar prevista na constituição da Coreia do Sul, ela só é aplicável quando de fato há uma situação de ameaça externa, de “exceção claramente colocada”, segundo o professor da ESPM.
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Yoon justificou o decreto com a alegação de que há uma aproximação de políticos sul-coreanos com a Coreia do Norte. O argumento, de acordo com Uehara, é frágil.
“É muito difícil de imaginar que alguém do Parlamento ali de fato estivesse se alinhando com a política da Coreia do Norte”, afirma o professor. “Não vejo que exista uma admiração por políticos da Coreia do Sul com relação à Coreia do Norte, em particular quanto ao Kim Jong-Un.”
Desdobramentos para a geopolítica global
Além do contexto sul-coreano isoladamente, Montenegro vislumbra novas tensões no Extremo Oriente diante do início do mandato presidencial de Donald Trump, nos Estados Unidos. “Tudo indica que a decretação da lei marcial na Coreia do Sul está intimamente conectada com a geopolítica internacional.”
Ele explica que, com a invasão da Ucrânia pela Rússia em 2022, a formação de blocos de países com interesses comuns se acelerou. Como o consumo de recursos de diferentes matizes é necessidade permanente para todos os lados de uma guerra, diz o coronel, “russos, chineses, iranianos e norte-coreanos aproximaram-se para fazer frente aos europeus, australianos, norte-americanos e israelenses”.
Dessa forma, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, começou a se aproximar da Coreia do Norte. O objetivo inicial, de compartilhamento de armas e munições, logo passou a abranger tropas militares.
Em contrapartida, o presidente sul-coreano entendeu que seria interessante apoiar militarmente a Ucrânia, explica Montenegro. No entanto, o atual governo dos Estados Unidos, do democrata Joe Biden, vetou a ideia.
“Tudo isso ocorre num ambiente interno de disputa de poder em que Yoon Suk Yeol, presidente conservador, acusa a oposição de traição por colaboração com a Coreia do Norte para gerar o caos na Coreia do Sul”, diz Montenegro. Assim, de acordo com ele, as implicações da crise política sul-coreana podem ser maiores que o contexto local permite mensurar.