A Câmara Municipal de São Paulo irá discutir a abertura da CPI das ONGs da Cracolândia depois do Carnaval. Em encontro nesta terça-feira, 6, os líderes da Casa mencionaram a denúncia contra o padre Júlio Lancellotti para justificar a decisão. A expectativa era que a pauta avançasse nesta semana.
Na reunião, o vereador Rubinho Nunes (União Brasil) trouxe à superfície o relato do jornalista Cristiano Gomes, de 48 anos, que revelou a Oeste ter sofrido assédio sexual do padre. A cena teria ocorrido em 1987, quando o então coroinha frequentava a Paróquia São Miguel Arcanjo, na Mooca (SP). Ele tinha 11 anos.
Segundo Rubinho Nunes, a denúncia contra o padre e os laudos periciais que atestam a veracidade de seu vídeo pornográfico bastariam para a abertura da CPI. “O senhor Júlio Lancellotti é uma figura ao redor da CPI”, afirmou o vereador. “As ONGs orbitam o padre.”
O presidente da Câmara, Milton Leite (União), observou que a gravidade da denúncia requer “cautela” e “prudência” dos vereadores. Nesse sentido, sugeriu aos líderes partidários que analisassem o caso nesta semana e voltassem a discuti-lo a partir da quarta-feira 14.
“Tomei as providências”, disse Leite, ao lembrar que enviou a denúncia para a Arquidiocese de São Paulo, para o Ministério Público e para o Vaticano. “Não vou segurar nada em minhas mãos. Quanto à CPI, tenho dúvida sobre o escopo dela. Precisaria de mais tempo para analisá-la. Mas a casa não vai se omitir. Não vai proteger A nem B.”
O presidente da Câmara disse que a atitude mais prudente seria aguardar o relato de Cristiano Gomes à arquidiocese. Oeste apurou que a conversa inicial ocorreu nesta tarde. “A acusação é grave, exige muita cautela e prudência”, acrescentou.
Embora a CPI ainda não tenha sido instaurada, houve indignação da esquerda com o fato de o assunto ser debatido. O vereador Arselino Tatto (PT), por exemplo, rechaçou a denúncia contra o padre e disse que “rezaria” por Rubinho Nunes. “Espero que o senhor não vá para o mármore do inferno”, debochou.
Leite rebateu a declaração do petista e apresentou os motivos pelos quais a Câmara deve promover o debate sobre a CPI das ONGs. “Não quero orar por menores e por possíveis vítimas”, afirmou. “Espero que a denúncia seja mentira. Assim, não precisaremos rezar pelos menores. Não quero inocentar nem condenar o padre.”
O que se sabe até o momento sobre o caso Júlio Lancellotti
Em 20 de janeiro deste ano, Oeste publicou com exclusividade uma reportagem sobre o padre Júlio Lancellotti. O texto informou que os peritos Reginaldo e Jacqueline Tirotti atestaram a veracidade do vídeo que mostra o pároco se masturbando para um menor de idade. As cenas são de 2019.
No mesmo dia, Reginaldo e Jacqueline divulgaram o laudo completo. Ao longo de 81 páginas, a dupla analisou o estado de conservação dos arquivos, observou os frames dos filmes, realizou os exames prosopográficos (técnica que identifica as características faciais), inspecionou os áudios e, ao fim, comprovou sua integridade.
Ao serem interpelados, os peritos reafirmaram a veracidade do vídeo e se colocaram à disposição das autoridades. “Contratem um profissional da polícia e vejam se há algo errado”, disseram aos reticentes.
Nova perícia ratifica análise de 2020
Em 21 de janeiro, Oeste informou que a perícia de Reginaldo e Jacqueline ratificam a análise do perito Onias Tavares de Aguiar, realizada em 2020. A reportagem trouxe à superfície o fato de Reginaldo já ter sido contratado pelo jornal Folha de S.Paulo e pela Veja em outras ocasiões.
As denúncias movimentaram os bastidores da política. Em virtude da gravidade do caso, a Arquidiocese de São Paulo decidiu receber a denúncia contra Júlio Lancellotti.
Em 22 de janeiro, o vídeo e a perícia chegaram ao Ministério Público, à CNBB e ao Vaticano. Ainda não há informações sobre o andamento da denúncia nesses três órgãos.
Três dias depois, a reportagem trouxe a informação de que o cardeal dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, trabalha para blindar Júlio Lancellotti.
Ex-coroinha disse ter sido assediado sexualmente por Júlio Lancellotti
Em 30 de janeiro, Oeste entrevistou com exclusividade o jornalista Cristiano Gomes, de 48 anos. Ele disse que foi alvo de assédio sexual do pároco em 1987, quando tinha 11 anos. A cena teria ocorrido na Paróquia São Miguel Arcanjo, na Mooca, bairro da zona leste de São Paulo. Na época, o jovem era coroinha.
No sábado 3, a reportagem informou que o perito Mario Gazziro, contratado pela revista Fórum para analisar as cenas pornográficas, mudou sua versão sobre o caso. A nova conclusão descarta a validade da perícia anterior, que via indícios de deepfake na gravação.
A versão atualizada do documento trabalha com a seguinte teoria: criminosos teriam contratado um sósia do padre, construído um estúdio idêntico à sua residência e gravado as cenas. “Diminuíram ao máximo a exposição do impostor no vídeo, para evitar quaisquer aspectos que possibilitassem identificar a fraude de forma simples”, justificou Gazziro.
Rubinho Nunes aciona MP contra Mario Gazziro
No mesmo dia, Oeste disponibilizou aos leitores a perícia completa do perito da Fórum. A mudança na conclusão da análise motivou o vereador Rubinho Nunes (União-SP) a acionar o Ministério Público para acusar Gazziro de falsidade ideológica. Agora, o parlamentar aguarda a análise da denúncia.
A reportagem ainda trouxe a informação exclusiva de que a arquidiocese paulista pretende ouvir ex-coroinha que disse ter sido assediado sexualmente por Júlio Lancellotti. Cristiano Gomes deve relatar sua história para a Cúria Metropolitana de São Paulo nas próximas semanas.