“Para o enfrentamento da emergência de saúde pública, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, a determinação de realização compulsória de vacinação ou outras medidas profiláticas”. Trecho do artigo 3º da Lei 13.979, sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em fevereiro deste ano.
“Uma vacina tem de ter critérios: justificativa científica; avaliar o custo benefício; faça consulta pública sobre o tema; coordenação entre pesquisadores e serviços de saúde; que a escolha de onde o estudo vai acontecer seja criteriosa; e, claro, é preciso haver consentimento”. Declaração de Mariângela Simão, vice-diretora da Organização Mundial da Saúde (OMS), em entrevista à CNN Brasil há poucas semanas.
Embora os dois argumentos sejam convincentes, ambos têm pouca validade no momento por uma razão simples: ainda não existem imunizantes contra o coronavírus — apenas protótipos de vacinas. Entre eles, o de Oxford e o da China, batizado Coronavac. Ambos estão em estágio avançado de testes e sua segurança foi constatada. Porém, a eficácia não foi comprovada. Como isso ainda não ocorreu, o tema foi politizado, — como tudo no Brasil de hoje —, sobretudo depois da queda de braço entre o presidente Jair Bolsonaro (mais simpático aos inglêses) e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que firmou uma parceria com os chineses.
Judicialização da vacina
Para apimentar o debate, Doria defendeu a obrigatoriedade da vacina — chinesa — para os brasileiros. Conforme o tucano, uma lei de 1965 possibilita aos governos estaduais, depois de audiência com o Ministério da Saúde, proporem medidas para que as vacinações sejam cumpridas. Contudo, um regulamento dessa lei, publicado no ano seguinte, determinou que cabe à pasta autorizar a obrigatoriedade da vacina. Para João Paulo Martinelli, professor de Direito do IBMEC, a questão é problemática e contribui para a judicialização do tema. “São grandes as chances de isso acabar no Judiciário, porque há várias complicações e a Corte já foi provocada nesse sentido”, disse o especialista.
Como mencionou Martinelli, partidos políticos ingressaram com ações no Supremo Tribunal Federal (STF), para que ele decida sobre a obrigatoriedade da vacina. PCdoB, Psol, PT, PSB e Cidadania querem obrigar o governo a comprar todo e qualquer imunizante em pesquisa que prometa vencer o coronavírus — principalmente o desenvolvido pela China. Já o PDT e a Rede Sustentabilidade moveram processos para garantir a autonomia de Estados e municípios, de modo que possam decidir sobre o assunto sem precisarem de aval da União. O PTB, de Roberto Jefferson, foi na direção contrária e recorreu para que seja anulado o artigo 3° da lei que trata da compulsoriedade da vacina.
O presidente do STF, ministro Luiz Fux, garantiu que a questão será judicializada. “Acho necessário, de modo a discutir não só a liberdade individual, como também os pré-requisitos para se adotar uma vacina”, declarou Fux, durante uma live. “Não estou adiantando ponto de vista nenhum, estou apenas dizendo que essa judicialização será importante”. A maioria dos juízes da Suprema Corte concorda com a compulsoriedade da medida, mas ainda não está claro como ela será aplicada. Ventila-se até mesmo hipótese de impor restrições a quem não se vacinar, como, por exemplo, proibir viagens e a entrada em determinados estabelecimentos. O cenário é nebuloso.
Flávia Bahia, professora de Direito da Faculdade Getúlio Vargas, apontou dois possíveis caminhos que os 11 ministros seguirão, caso decidam sobre o tema: determinar a vacinação compulsória em âmbito nacional ou dar autonomia a Estados e municípios. “É mais provável que o STF conceda essa responsabilidade aos entes federativos, como fez em abril, ao acolher a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6341”, explicou Bahia. A medida enfraqueceu o presidente Bolsonaro no enfrentamento à covid-19. “Entretanto, penso que haverá limitações para essa compulsoriedade, a exemplo de sanções administrativas pelo não cumprimento da vacinação”, observou a especialista.
Rota de colisão
A obrigatoriedade da vacina pôs em conflito dois direitos importantes: o coletivo e o individual. “É muito difícil dizer se um prevalece sobre o outro. Depende do caso”, afirmou Nelson Porfírio, doutor em Direito e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie. “Há pessoas que têm suas razões religiosas e filosóficas para não se vacinarem, sobretudo quando ainda há incertezas com relação à vacina”, observou Porfírio. “Por outro lado, pode ser que esse alguém contamine o seu próximo porque decidiu não se imunizar. Isso afetará a coletividade. É um assunto bem sensível”.
Porfírio acredita que algumas perguntas precisam ser respondidas: “A medida da vacinação obrigatória é adequada ao que se propõe? O sacrifício que está sendo exigido do indivíduo é proporcional ao benefício que a coletividade vai desfrutar? Há um imunizante eficaz? Tudo isso tem de ser posto na balança”, acrescentou. Para ele, é precipitado decidir agora, sem a existência de uma vacina suficientemente eficaz.
Competência do Executivo e do Legislativo
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem se posicionado contra a decisão do assunto pelo STF. E sinaliza querer dialogar com o Palácio do Planalto. “Acho que seria bom que os poderes Executivo e Legislativo chegassem a um caminho sobre este tema”, afirmou. “Para que ele não fique sem solução e o Poder Judiciário tenha que resolver e, depois, fiquem todos reclamando que o Judiciário o resolveu”.
Marcelo Figueiredo, advogado e professor associado de Direito Constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, salienta que o tema da vacina tem de ser decidido pelo Congresso Nacional. Caso o STF dê a palavra final sobre a vacina, será mais um exemplo da excessiva judicialização da política. “Isso é muito prejudicial para a democracia”, diz. “Aquilo que pode e deve ser discutido pela sociedade através do parlamento acaba sendo resolvido na base da canetada de juízes. E isso empobrece o debate”.
Figueiredo é a favor de uma campanha de conscientização por parte do governo federal em aliança com os Estados em vez de obrigatoriedade. “Além disso, é obrigação de quem fabrica a vacina comprovar a eficácia e a segurança do imunizante”, observou. “As pessoas não podem ser obrigadas a tomar algo que não conhecem completamente. Todo remédio tem um risco. E, não tendo informações suficientes, a população tem o direito de não se vacinar. É isso que está em jogo”.
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Esse merda do Bolsonaro, faz suas cagadas e depois quer jogar a culpa nos governadores. Assinou SIM, duas vezes leis que obrigam a vacinação compulsória e depois vem nas suas redes sociais arrotar valentia e jogar prá galera que não obrigará ninguém a se vacinar! Ou é um débil mental, ou cheirou algo que não devia ou já está com Alzheimer em último grau a ponto de esquecer o que fez no dia anterior.
Paulo Renato, aqui não é seu lugar. Então, vai ler a Foice de SP
Agradeço a sua preocupação em me orientar para encontrar o meu lugar; porém sinto em dizer que já passei por lá já faz muito tempo e não me senti à vontade naquele ambiente que não mais frequento. Me dou ao direito de ter minha opinião gostem alguns ou não; essa revista da qual sou assinante, me dá uma impressão de ser uma publicação que apenas cita a verdade dos fatos e com isenção, como deveria ser qualquer publicação do gênero. Agora, por acaso falei alguma “fake news”? O Bolsonaro não assinou uma lei que torna obrigatória a vacinação compulsória? Procure se informar.
Eu gostaria de entender porque dessa Lei de fevereiro ainda estar vigente. Ela precisa de aprimoramentos, pois está dando ensejo a todo tipo de arbitrariedade