A graça (indulto individual) concedida na quinta-feira 21 pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) ao deputado federal Daniel Silveira (PTB) continua dividindo opiniões entre parlamentares da base governista e da oposição. Silveira foi condenado a oito anos e nove meses de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na quarta-feira 20, acusado de tentar impedir o livre exercício dos Poderes e agredir verbalmente e ameaçar os ministros. A pena incluiu multa de quase R$ 200 mil, perda do mandato e suspensão dos direitos políticos.
O deputado governista Marco Feliciano (PL) considera que o decreto presidencial está dentro da constitucionalidade. “Daniel Silveira é louco, mas é um louco nosso. A Câmara é quem tem de decidir se ele perde o mandato.”
Feliciano, que é pastor evangélico, faz parte do grupo que pede uma reunião de Bolsonaro com representantes da bancada religiosa. Ele espera que o encontro se realize ainda nesta quarta-feira, 27. “O Supremo perdeu a mão. Estive ontem [terça-feira, 26] no STF com ministros, que apontaram ter sido alta a dosimetria da pena dada ao Daniel”, disse o deputado, sem citar os nomes dos ministros.
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Também defende a legalidade do ato de Bolsonaro o deputado Marcel van Hattem, vice-líder do Novo, partido considerado de direita. “Entendo que o presidente da República agiu dentro do que a Constituição permite, concedendo graça a um parlamentar que vinha sendo vítima de um processo que desrespeitou o mais básico que existe no Direito Constitucional e no nosso ordenamento jurídico pátrio. Não me parece caber qualquer tipo de interpretação possível do STF de forma a anular a concessão de graça.”
Sobre medidas que a Câmara pode tomar para discutir o caso do ponto de vista legal, Marcel van Hattem afirma haver preocupação com uma eventual sinalização de casuísmo. Mas observa que existe margem para apresentar mudanças ao texto constitucional que se relacionam à cassação e cita uma Proposta de Emenda Constitucional [PEC] de sua autoria, que pretende apresentar se obtiver as 171 assinaturas necessárias. “A intenção é deixar mais claramente na Constituição os casos de imunidade do parlamentar, quando pode ser preso, quando não pode, citar prisões por crime contra a administração pública, por exemplo.”
O deputado Bira do Pindaré, líder do PSB, concorda com o argumento de que a discussão da cassação pode parecer casuística, mas discorda da constitucionalidade do decreto de Bolsonaro. Segundo ele, o ato é um “insulto ao povo brasileiro, que sofre com desemprego, fome, miséria, inflação”, e o presidente, “em vez de concentrar esforços para resolver problemas que afetam o Brasil, está debatendo a prisão de um criminoso.”
O líder do PSB entende que “a graça não tem de prevalecer, precisamos discutir a regulação de um decreto como esse, pois é um desvio claro de finalidade.” Acerca da análise da discricionariedade presidencial para um decreto de concessão de graça, Bira do Pindaré fala que o documento descumpriu os princípios de moralidade e impessoalidade da Constituição Federal e que um “presidente usar as prerrogativas para seus próprios interesses fere a impessoalidade.”
Líder do PTB, partido de Daniel Silveira, o deputado Paulo Bengtson é favorável ao decreto de Bolsonaro. “A Câmara hoje está aguardando apenas a decisão final. O STF tem de acatar o indulto. A partir do momento em que Daniel Silveira for perdoado da condenação, tudo de cassação que exista contra ele deixa de existir. Há um sentimento geral na Casa de que o STF esticou a corda.”
Evitar crise institucional
No STF, o clima é de tensão acerca de um possível aumento de crise institucional após a emissão do decreto. A reportagem apurou que o documento foi recebido com surpresa. A ministra Rosa Weber é a relatora dos quatro processos de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) que apontam desvio de finalidade da graça concedida por Bolsonaro, movidos pelos partidos Rede Sustentabilidade, Cidadania, Psol e PDT.
Na segunda-feira 25, ela deu prazo de dez dias para a manifestação de Bolsonaro. Na sequência, haverá prazo de cinco dias para a Procuradoria-Geral da República e a Advocacia-Geral da União. Com todas essas informações, a ministra deverá liberar os processos para julgamento em plenário.
PL sobre anistia
Na última segunda-feira, 25, a deputada Carla Zambelli (PL) afirmou que apresentaria um projeto de lei (PL) para anistiar parlamentares em casos considerados crimes políticos e de opinião no âmbito do Congresso Nacional entre 1º de janeiro e 31 de dezembro deste ano. “Sou totalmente contra o liberou geral. Vamos, sim, debater, mas nos posicionar contrários ao liberou geral,” disse Bira do Pindaré.
O deputado federal Sóstenes Cavalcanti (PL) também anunciou, no início desta semana, que apresentaria um projeto de resolução para mudar o regimento interno e aumentar o número necessário de votos para a cassação de um parlamentar na Câmara de 257 para 342.
“Quem relata projetos de resolução é um deputado da Mesa Diretora, o vice-presidente da Câmara. Mas nesse caso o projeto seria flagrantemente inconstitucional. Ele nem andaria na Casa”, explica Marcelo Ramos (PSD), vice-presidente da Câmara.