(J.R. Guzzo, publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 10 de abril de 2022)
Campanha eleitoral é campanha eleitoral e, naturalmente, o eleitor brasileiro já se acostumou a ouvir durante essas épocas todo o tipo de cretinice — para não falar nas mentiras, nas promessas impossíveis de serem cumpridas e, enfim, na pura e simples estupidez. Mesmo dando este desconto, porém, o candidato que os institutos de pesquisa consideram como já eleito com 101% dos votos começa a chamar a atenção: a cada dia que passa, e a cada discurso que faz, vai ficando mais e mais esquisito. Não se entende, de um lado, por que está assim tão irado em tudo o que fala: grita o tempo todo, ameaça, dá um espetáculo permanente de ressentimento e de rancor. De outro lado, vem uma dúvida básica: por que, afinal, Lula está dizendo essas coisas?
Num curto espaço de tempo, nessas últimas semanas, o ex-presidente já disse que o MST, cujo programa oficial de atividades é invadir propriedades rurais, destruir o que encontra nelas e roubar o fruto do trabalho alheio, vai ter um “papel importante” em seu governo. Saiu de pau em cima da classe média, que, em sua opinião, é muito “privilegiada” no Brasil; disse que é um absurdo, por exemplo, alguém querer mais de uma televisão em casa. Soa estranho, para o cidadão que está se matando na tarefa de criar três filhos, ouvir esse tipo de bronca de um cidadão que parou de trabalhar aos 29 anos de idade e não faz uma fila de ônibus há quase 50. Há pouco, abriu fogo contra a família — disse que as “pautas” que defendem os valores familiares eram “atrasadas”.
Lula, na mesma toada, se declarou a favor do aborto, para proteger as “mulheres pobres” — no dia seguinte tentou voltar atrás e dizer o contrário, mas aí já era tarde demais: o que disse ficou gravado. Num tom estranhamente enfurecido, dias antes, ameaçou aos gritos o presidente Vladimir Putin, da Rússia, o presidente da Ucrânia e os “presidentes europeus”: acabem já com essa guerra. Declarou-se certo de que ele próprio, Lula, resolveria tudo com uma “garrafa de cerveja”, ou com todas as garrafas que houvesse no estoque. Em seu surto mais recente, convocou os “sindicalistas” para “mapearem” as casas dos deputados federais, em seus Estados, e fazerem manifestações na frente delas, em grupos de 50 combatentes, para “tirar a tranquilidade” dos parlamentares e de suas famílias. Na sua opinião, não adianta “gastar uma fortuna” armando expedições a Brasília para pressionar o Congresso; os deputados não ligam a mínima e, para atender o PT, precisam ser incomodados nas suas próprias residências.
Lula, é claro, pode mudar daqui a cinco minutos e entrar no papel do tiozão boa gente, todo paz e amor. Por enquanto ele está com raiva do Brasil e do mundo.
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