Com pouco mais de dois meses de trabalhos, a CPMI do 8 de Janeiro ainda parece não ter muito clara a linha de investigação que está seguindo. O presidente do colegiado, deputado Arthur Maia (União Brasil), parece estar comprometido em averiguar como se deu os atos de depredação. Já a relatora, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), — ao lado da base governista — tenta transformar a CPMI em uma comissão para apurar uma suposta corrupção no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
“Essa é a cortina de fumaça que a base governista tenta emplacar”, explicou o senador Marcos Rogério (PL-RO) em entrevista a Oeste. “Todas as vezes em que eles acusam o ex-presidente por questões que não se relacionam com a CPI, é porque eles estão tentando esconder algo que está no âmbito da CPMI.”
Com maioria no colegiado, os membros do governo emplacam quebras de sigilos fiscais, telemáticos e de relatórios financeiros relacionados a família do ex-presidente. No entanto, o objeto da CPMI são os atos de depredação que aconteceram na Praça dos Três Poderes. Mas, segundo a relatora, podem existir indícios de “financiamento” por parte do ex-presidente aos manifestantes.
A oposição, contudo, está preocupada em investigar a possível leniência do governo federal e das forças de segurança do Distrito Federal. O único problema é que eles não possuem maioria no colegiado. Nesse sentido, Maia entra em cena para equilibrar as investigações. “O presidente Maia tem agido com muito equilíbrio para que os nossos pleitos sejam atendidos”, contou Rogério.
A Oeste, o senador explicou a estratégia da oposição para continuar com as investigações na comissão, comentou sobre a ação do governo em desviar o foco da CPMI e muito mais.
Confira os principais trechos:
Como o senhor avalia o trabalho da oposição na CPMI?
Embora tenha em minoria na CPMI, a oposição tem senadores e deputados bem preparados. Nosso papel não é negar o que aconteceu no 8 de janeiro. Não queremos criar uma narrativa dizendo que o 8 de janeiro não existiu, ele existiu. Crimes e excessos foram cometidos. Mas queremos uma investigação justa que identifique quem cometeu crime. Queremos separar aqueles que fizeram atos criminosos, dos que não cometeram. Já a base governista trabalha com a narrativa de criminalizar todo o movimento, como se fosse golpista. As pessoas foram em bando para ocupar os prédios públicos e conseguiram, pois houve um apagão na segurança pública. Parece uma ação deliberada de parte a parte. O governo quer jogar a culpa da leniência na Polícia Militar do Distrito Federal (PM-DF), mas não foi apenas a PM-DF. Existe Guarda Presidencial, a Força Nacional de Segurança e a Base Militar. Todo esse aparato de segurança foi dispensado. Parece que tinha gente gostando da ideia da invasão que aconteceu no dia 8. A invasão não interessa a direita, tanto que condenamos. Aqueles que cometeram crimes, devem responder na medida da própria culpa. Mas não podemos permitir que coloquem todos na mesma vala e passe o tratoraço em cima de todos que se manifestaram. O direito a manifestação é legítimo.
Sendo minoria, qual estratégia a oposição adota para aprovar os próprios requerimentos?
A diferença entre o governo e a oposição é que nós não queremos esconder nada. A investigação não nos amedronta, pois condenamos os arruaceiros que invadiram e quebraram os prédios públicos. Não temos nada a esconder. Quem faz isso é a ala governista, que atua para esconder personagens que atuaram no dia 8. Por que eles não querem que a gente escute o comandante da Força Nacional, coronel José Américo de Souza Gaia, ou o general Gonçalves Dias, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional? No caso do Gaia, o governo rejeitou o requerimento de convocação dele. Por que resistiram em enviar as imagens do Palácio da Justiça? Quem demonstra temer uma investigação imparcial, são os governistas. A oposição aprova os requerimentos que eles apresentam, pois não temos nada a esconder. Sempre procuramos o caminho do entendimento e do bom senso. Temos dialogado com o presidente da CPMI, com a relatora da comissão e com alguns parlamentares da base para demonstrar que todos queremos uma investigação séria, imparcial e que mostre quem se omitiu e agiu deliberadamente. Maia tem agido com muito equilíbrio para que os nossos pleitos sejam atendidos.
A ala governista tenta transformar a CPMI do 8 de Janeiro em uma CPI para investigar supostas corrupções do governo Bolsonaro. Como a oposição pode combater isso?
Essa é a cortina de fumaça que a base governista tenta emplacar. Todas as vezes em que eles acusam o ex-presidente por questões que não se relacionam com a CPI, é porque eles estão tentando esconder algo que está no âmbito da CPMI. O relatório do COAF que trata dos PIX enviados a Bolsonaro não foi objeto de requerimento na comissão. Não deveria nem ter vindo, mas veio extrapolando o requerimento do senador Jorge Kajuru (PSB-GO). A base do governo está mais preocupada em desqualificar o ex-presidente. Eles olham para Bolsonaro, mas enxergam no retrovisor do tempo o que aconteceu nos governos do PT no passado. Até o momento, nunca existiu uma operação da Polícia Federal contra Bolsonaro por corrupção. Agora ficam falando de pedras, uma coisa que não vale sequer R$ 500. Eles fazem disso um Carnaval. Querem medir Bolsonaro com a mesma régua do líder deles. Não dá. Respeito quem defende o governo, embora não concorde. Mas é uma estratégia equivocada. Eles não estão satisfeitos em ter Bolsonaro inelegível. Continuam sonhando com o ex-presidente toda noite. Tinham que se preocupar em cuidar do governo.
Preso pela Polícia Federal nesta semana, Silvinei Vasques, ex-diretor da PRF, pode ser reconduzido à CPMI em uma tentativa do governo associá-lo ao ex-presidente. Isso pode prejudicar a oposição?
Não. A oposição quer a investigação sem esconder nada. Se existiram falhas, que sejam apuradas e individualizadas as condutas. Até o momento, não encontramos nenhuma evidência de que tenha acontecido uma ação deliberada no sentido de dificultar ou fraudar o acesso das pessoas a votação. Enquanto a possibilidade de ele ser reconvocado, não há nenhum impedimento desde que tenha elementos novos que apontem a necessidade. Se a oposição identificar situações suspeitas, vamos ouvi-lo. Não podemos permitir que as narrativas sejam sustentadas como verdades.
A oposição pode pressionar para agilizar a oitiva do G.Dias?
O depoimento dele é muito necessário. Contudo, quanto mais tempo ele demorar para vir, pior fica para ele. Isso pode nos dar mais elementos para inqueri-lo. Precisamos ouvir também a PM-DF. Na oitiva do Anderson Torres, ele disse que existia um plano de ações integradas articulado para conter o 8 de janeiro. Por que o plano não foi efetivado? Não é papel da oposição colocar cortina de fumaça. Precisamos entender o motivo desse apagão da Segurança Pública no DF. Foi coincidência ou induzido? A quem interessava o que aconteceu? Ao Bolsonaro e a oposição? Não. Defendo a apuração de todos os fatos. Outras figuras precisam ser ouvidas, como o comandante da Força Nacional.
O governo quer esconder a sua omissão e participação para que ocorresse a depredação. Não enxerga quem não quer.