(J.R. Guzzo, publicado no jornal Gazeta do Povo em 13 de janeiro de 2022)
Saíram os dados da inflação no Primeiro Mundo em 2021, o segundo ano seguido de pandemia plena, e deu o seguinte: os Estados Unidos, a potência econômica número 1 do planeta, tiveram inflação de 7% no ano. É a pior desde 1982 — ou seja, a última vez que aconteceu um desastre igual a esse foi quarenta anos atrás. Os demais países ricos, medidos no conjunto da OCDE, não foram melhores. Ficaram um pouco abaixo de 6%, o pior resultado em 25 anos. Inflação desse tamanho, para país sério, é uma tragédia.
É também a consequência inevitável do que os governos dos Estados Unidos e dos ricos em geral fizeram durante o ano: socaram dinheiro nos negócios e diretamente no bolso dos cidadãos, acreditando que valia a pena fazer qualquer coisa para manter de pé os seus diversos lockdowns, e lidar com as calamidades causadas por eles. Como dinheiro não dá em árvore, tanto lá como aqui, aconteceu lá exatamente o que acontece aqui quando o governo abre o cofre na tentativa de encarar um problema qualquer: inflação adoidada.
O debate econômico deste momento no Brasil, porém, em mais um dos seus delírios regulares, decretou que a realidade internacional não existe — inflação feia, hoje em dia, só tem no governo Bolsonaro. O Brasil teve de enfrentar a desgraça econômica provocada pela covid-19 como qualquer outro país do mundo; fez mais ou menos as mesmas coisas que os demais governos, basicamente abrindo o cofre público em variadas missões de socorro. Acabou com uma inflação de 10% — e a indignação de economistas, jornalistas e banqueiros de esquerda. “Que horror”, estão dizendo todos. “Esse Guedes acabou com o Brasil”.
Queriam o que, num ano como 2021? O Brasil não fica em Marte. É óbvio que houve inflação — até porque os críticos mais excitados do governo passaram o ano exigindo mais e mais dinheiro público para “salvar vidas”. Acontece que a inflação brasileira de 10% no ano passado é um sucesso, comparada com a inflação dos países mais bem sucedidos. O reinado Lula-Dilma, sem covid-19 nenhuma, acabou com uma inflação superior a 14% em 2016. Qual o problema, então, com o número de 2021?
Não há problema nenhum; houve, isso sim, uma solução num quadro de calamidade mundial. Inflação de 7% nos Estados Unidos ou de 6% na Europa equivale a mais de 20% no Brasil, ou sabe lá Deus quanto — já se está, aí, à beira do descontrole, tanto que não acontecia por lá há 40 anos. O fato, apoiado por números, é que o Brasil teve com a inflação, no ano passado, resultados melhores que a maioria dos países do mundo.
O público não corre nenhum risco de ouvir isso. Ao contrário: todo o noticiário é sofre o “fracasso” no combate à inflação, mais as desgraças que vêm junto com ela: desemprego, recessão, pobreza. Não existe o resto do mundo, nessas lamentações; não existe inflação em lugar nenhum, nem economias paradas, nem falta de trabalho, nem perda de renda, nem nada. O único governo sobre a face da Terra é o governo “do Bolsonaro”.
É o resultado de um sistema. Jornalistas da área econômica, com suas matérias de denúncia já escritas por antecipação, vão entrevistar economistas já sabendo, também por antecipação, que eles vão dizer exatamente o que querem ouvir. Junta-se a fome de uns com a vontade de comer dos outros e o que se tem é o “escândalo da inflação” de 10% — mais a recessão, o desemprego e a pobreza causadas não pelos “lockdowns” que paralisam a produção do Brasil há dois anos, mas “pelo Bolsonaro”. Informação econômica, hoje em dia, é isso.