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A tomada de Afeganistão pelo Talibã, em 2021, provocou pavor nos moradores de Cabul
A tomada de Afeganistão pelo Talibã provocou pavor nos moradores de Cabul, que tentaram fugir do país nos aviões americanos | Foto: Divulgação/HBO
Edição 151

O Juízo Final em Cabul

O documentário Escape From Kabul mostra que a retomada do Afeganistão pelos talibãs é um dos maiores desastres da política externa norte-americana em todos os tempos

Flávio Gordon
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Sendo cada dia mais difícil encontrar conteúdo aproveitável nas principais plataformas de streaming acessíveis ao público brasileiro, convém desfrutar quando esse padrão é quebrado. É o que se passa com um documentário recém-incluído no catálogo da HBO Max, que tem por objeto a dramática evacuação do Aeroporto de Cabul, no Afeganistão, nos dias seguintes à tomada da cidade pelo Talibã. Intitulada Escape From Kabul, a produção do diretor Jamie Roberts — também autor de um documentário sobre a assim chamada “invasão do Capitólio” — mostra detalhes dos 17 dias de horror e caos que se seguiram à saída norte-americana do país, depois de um período de 18 anos de guerra e ocupação. Com base nos depoimentos de três conjuntos distintos de testemunhas oculares — os fuzileiros navais norte-americanos responsáveis pela operação, os combatentes talibãs que tomaram Cabul e os cidadãos afegãos em fuga —, o documentário evidencia quão catastrófica foi a condução do processo por parte de Joe Biden e sua equipe. Depois do vexame protagonizado por Barack Obama e Hillary Clinton em Benghazi, a catástrofe humanitária em Cabul consagra o estrondoso fracasso democrata na política externa norte-americana.

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Que se tratou de uma catástrofe humanitária, ninguém que assista ao documentário terá dúvidas. Os fuzileiros norte-americanos responsáveis pela operação de evacuação chegaram ao Aeroporto de Cabul no dia 15 de agosto. Nesse mesmo dia, sem enfrentar resistência por parte do governo afegão, o Talibã tomou a capital do país, gerando uma onda de pânico em massa. Nos instantes seguintes, centenas de residentes tomaram o rumo do aeroporto com suas famílias, desesperados para fugir do regime extremista, violento e totalitário. Em pouco tempo, as centenas converteram-se em milhares e, em mais um ou dois dias, em dezenas de milhares. Chegando ao aeroporto, a multidão apavorada — no meio da qual se haviam infiltrado combatentes talibãs empenhados em conter a fuga — saltava por sobre cercas de arame farpado, forçava a passagem pelos portões e enfrentava os tiros de alerta dos soldados incapazes de contê-la. Não demorou muito para que a massa de fugitivos tomasse a pista, impedindo pousos e decolagens, para desespero dos militares cuja função era garanti-los.

Vemos pais e mães atirando seus bebês por cima dos muros para os braços dos militares. Vemos crianças órfãs lançando olhares de pânico e súplica para desconhecidos

Intercalando filmagens de celular e depoimentos dos envolvidos, o documentário desnuda um cenário horripilante. Vemos idosos e crianças de colo imprensados contra cercas de arame farpado, gritando de pavor ao tentar se proteger dos disparos que, àquela altura, provinham tanto de dentro — partindo das armas dos militares norte-americanos que tentavam em vão dispersar a multidão — quanto de fora dos portões — dos talibãs que cercavam o perímetro do aeroporto e se imiscuíam na massa. Vemos famílias se separando, muitas de maneira definitiva. Vemos pais e mães atirando seus bebês por cima dos muros para os braços dos militares. Vemos crianças órfãs, cujos pais haviam morrido no processo de fuga, lançando olhares de pânico e súplica para desconhecidos. Vemos pessoas se agarrando na fuselagem de um avião decolando. Vemos corpos caindo. Nas proximidades de um dos portões de acesso ao aeroporto, vemos a multidão em fuga passando dias chafurdada num canal transformado em esgoto a céu aberto, passando fome, sede e calor sufocante. E vemos quando, acatando pedidos de cooperação enviados pelos militares norte-americanos, um destacamento militar afegão optou por desocupar a pista do aeroporto de maneira definitiva: disparando contra as pessoas e atropelando-as com caminhões. Para completar o espetáculo dantesco, homens-bomba do Talibã decidiram cercar o aeroporto. E um carro-bomba do Estado Islâmico explodiu no local, matando civis afegãos e fuzileiros norte-americanos.

Foi esse processo que, um dia depois da retirada das tropas norte-americanas do país, o presidente Joe Biden descreveu como “um extraordinário sucesso”. Ainda no dia 8 de julho de 2021, perguntado por repórteres sobre a possibilidade de uma nova Saigon no Afeganistão, o presidente norte-americano dissera que “não haverá cenas de pessoas sendo retiradas às pressas dos telhados da embaixada em nossa retirada do Afeganistão” e que “a hipótese de o Talibã assumir o controle de tudo e passar a comandar todo o país é altamente improvável”. Que profeta!

Vinte dias depois, o Talibã já avançava desenfreadamente rumo a Cabul, deixando para trás um rastro de violência que incluiu o massacre de crianças. E, após mais uma vintena de dias, os fundamentalistas islâmicos tomavam a capital e assumiam de vez o controle do Afeganistão, provocando as cenas terríveis registradas em Escape From Kabul. Por tornar o país um novo paraíso para o terrorismo — agora que o Talibã foi bem equipado com material militar de origem norte-americana —, a retomada do Afeganistão é um dos maiores desastres da política externa norte-americana em todos os tempos. É Benghazi multiplicado por cem. Ou, como sugeriu o senador republicano Ben Sasse à revista National Review, é pior até que Saigon.

ministério da verdade
Joe Biden, presidente dos Estados Unidos | Foto: Erin Scott/Casa Branca

A postura pusilânime de Biden, que disparou mentiras e evasivas em série nas suas coletivas de imprensa, não foi bem aceita pelo público norte-americano. Segundo uma pesquisa da época, quase 70% dos entrevistados desaprovaram a maneira como o democrata conduziu a saída do Afeganistão. Em parceria com o Trafalgar Group, The Convention of States Action (COS) publicou os resultados das entrevistas com mil eleitores. “Não há dúvidas de que a população norte-americana não está engolindo as mentiras sobre o Afeganistão. Isso é Saigon, e até pior” — também declarou Mark Meckler, da equipe do COS.

Como mostra o documentário da HBO Max, a realidade sempre se impõe, e contra ela é vã toda a indústria de propaganda democrata. E, enquanto Biden descansava e tomava margueritas em Camp David, a realidade no Aeroporto de Cabul foi bem descrita por um jovem estudante entrevistado no documentário: “Parecia o Juízo Final”.

Cidadãos afegãos amontoados em um avião de transporte da Força Aérea dos EUA | Foto: Divulgação/HBO

Leia também “O que é um terrorista?”

6 comentários
  1. Marcelo Gurgel
    Marcelo Gurgel

    O progressistas diminuindo a população mundial

  2. Olnei Pinto
    Olnei Pinto

    Quando o sistema se articula fica poderoso e seus tentáculos são praticamente imbatíveis. Para os americanos o presente foi o senil, para nós brasileiros o Larápio.

  3. Agnelo A. Borghi
    Agnelo A. Borghi

    Biden é um canalha assim como o ladrão de nove dedos que o visitou recentemente. Escorias da humanidade.

  4. Gilson Herz
    Gilson Herz

    Tudo que vem da esquerda é para ferrar com as pessoas.

  5. Otacílio Cordeiro Da Silva
    Otacílio Cordeiro Da Silva

    Muitos anos atrás li uma entrevista com um escritor norte-americano, cujo nome não me lembro mais, onde criticava, ele mesmo, o próprio povo americano. Dizia que o americano era um povo imbecil, pois quando a coisa estava boa, preferia votar em seus caprichos, suas manias, e quando a coisa estava ruim votava em qualquer um. Esse Biden foi eleito justamente em uma situação dessas. A coisa estava boa e aí não deu outra. Agora, quem p… o Mateus que o embale.

  6. Zulimar Marrara
    Zulimar Marrara

    Obrigada, Flávio; admiro vc. . Bom relembrar, com detalhes. Nem tudo está perdido; o bom jornalismo resiste.

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