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Evento Web Summit, no Rio de Janeiro | Foto: Reprodução
Edição 163

O Woodstock do capitalismo e o país da cerveja

O Rio de Janeiro como polo tecnológico e a empresa mais inovadora do mundo

Bruno Meyer
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Um polo brasileiro

Meio mundo estava nesta última semana na Web Summit, o megafestival de inovação e tecnologia que cacifou o Rio de Janeiro como um polo tecnológico ao sediar o evento. Os hotéis da região da Barra da Tijuca ficaram praticamente esgotados, e o setor hoteleiro da cidade deve sentir um impacto positivo de R$ 610 milhões, segundo a organização do evento.

Os donos da grana

Com sede na Califórnia, o Silicon Valley Bank (SVB) colapsou e o dinheiro ficou bem mais curto para as startups. Mas a quantidade de startups brasileiras fez com que gestoras multifamily office olhassem com carinho para o setor, especialmente os milionários que as fundaram. A suíça Julius Baer, maior multifamily office independente do Brasil, vai dobrar o time do escritório no Rio de Janeiro. Na mira está a fortuna da turma do mundo da tecnologia. O escritório atende clientes com, no mínimo, R$ 25 milhões para investir.

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Warren Buffett, presidente e CEO da Berkshire Hathaway | Foto: Kent Sievers/Shutterstock
O show de Buffett…

Neste sábado, 6, o megainvestidor Warren Buffett, 92 anos, é o centro do evento considerado por muitos o “Woodstock do capitalismo”, com presenças de personalidades como Bill Gates (Microsoft) e Bob Iger (Disney). Esse é o tradicional encontro anual em Omaha, no Estado de Nebraska, realizado por acionistas da Berkshire Hathaway, a gestora de Buffett, um dos homens mais ricos do mundo. Seu patrimônio é estimado em US$ 113 bilhões, e Buffett é conhecido pelo conservadorismo nos negócios. 

…e a aposta dos convidados 

“A expectativa é o que ele vai falar sobre a economia norte-americana, seus investimentos na Apple e em empresas produtoras de petróleo, além do tema do momento: inteligência artificial”, diz o gaúcho William Castro Alves, estrategista-chefe da Avenue Securities que estará no encontro pela segunda vez. “Mas o evento é uma maneira de aprender com o investidor mais respeitado do mundo, Buffett, e seu sócio Charles Munger.” 

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Bruno Stefani: “O nosso comportamento mudou” | Foto: Reprodução/YouTube
“Devemos ser muito mais um concierge do que um Elon Musk”

O brasileiro continua sendo um legítimo cervejeiro. Prova disso é que a Ambev — dona de cerca de 200 rótulos de cerveja, como Brahma, Stella Artois e Budweiser — lucrou R$ 3,8 bilhões apenas no primeiro trimestre de 2023, uma alta de 8,2%, na comparação com o mesmo período do ano passado. A surpresa é que 20% desses ganhos vieram de produtos que simplesmente não existiam no mercado há três anos. O gigante de bebidas que controla 70% do mercado de cervejas no Brasil fez uma revolução recente na sua cultura de inovação, com a criação de novos produtos e serviços, do aplicativo de entregas Zé Delivery, ao chope Brahma na lata, lançado na última semana no evento Web Summit, no Rio de Janeiro. 

Chope Brahma | Foto: Reprodução

O nome por trás da transformação de inovação é o paulistano Bruno Stefani, 37 anos. Stefani deixou há poucos dias por decisão própria o cargo de diretor-geral global de inovação da Ambev para virar conselheiro de inovação de cinco empresas, uma delas do poderoso setor do agronegócio brasileiro. Em rara entrevista, ele falou com esta coluna sobre inovação, parcerias bem-sucedidas com startups brasileiras e os segredos para ser inovador:

O que uma pessoa precisa para se tornar inovadora?

O maior clichê é “gostar de aprender”. E o não tão clichê é: o que você tem que aprender? Eu sempre falo que a inovação está no tripé entre você entender pessoas, entender negócios e entender tecnologia. No caso de empresas, entender o consumidor e a mudança de comportamento dele para decifrar o que são as novas oportunidades de negócios. No passado, era apenas compra e venda. Agora, tem N formas, como as assinaturas. Sobre tecnologia, a pessoa precisa ter noção, por exemplo, do que é inteligência artificial e a agressividade que a solução do ChatGPT chegou a nossa mão. Há quatro meses não sabíamos o que era IA generativa, hoje a estamos usando. Mas é bom falar que estamos imersos em tecnologia, mas tecnologia não é o motivo número 1 de tudo o que a gente está vivendo. A prova são os modelos de negócios do Uber e do Airbnb. Tem tecnologia por trás? Tem, mas essas empresas existem porque a gente aceitou entrar no carro de um estranho e aceitou entrar na casa de alguém que a gente não conhece. O nosso comportamento mudou. A partir daí, esse modelo de negócio validou. 

Foto: Shutterstock
Qual foi o seu maior feito na Ambev?

Fui um dos primeiros a treinar o board da companhia a pensar em inovação e tecnologia. Ajudei a construir essa formação, a educar. Com isso, a gente virou uma empresa que é mais do que cerveja. Além disso, eu fazia a curadoria do que tem no ecossistema — como as startups — para trazer os problemas da companhia para soluções que já existem. Imagina que lá atrás a gente pensou em entregar por drone. Se fosse uma empresa tradicional, com mentalidade antiga, eu iria criar mais uma área, nomear um head de drone, montar equipe grande. Para mim, seria ótimo, como diretor, pois teria mais gente abaixo de mim, eu teria mais poder. Isso é a visão tradicional. A nova visão é diferente. Eu quero experimentar entregas por drone? Eu não sei nem se vai dar certo, se tem viabilidade técnica, mas vou no ecossistema e procuro uma startup que entrega por drone e levo o problema de entrega por drone para uma empresa que já tem a solução. E vou cocriar com ela. Se der certo, é bom para a Ambev, bom para a startup e bom para o consumidor, que vai ter uma nova forma de o Zé Delivery entregar. 

Como é comandar a área de inovação de um gigante de bebidas?

É você ter a cabeça de que você deveria ser muito mais um concierge do que um Elon Musk. Isso serve para a Ambev, para um banco, ou para uma empresa de óleo e gás.  O profissional tem de entender que é parte de um processo, precisa servir às áreas de negócios, ajudar a companhia a se abrir para o ecossistema e trazer soluções prontas, para que essa área de negócios consiga trazer resultados para a companhia. Acho que esse é o segredo: como você consegue descentralizar seus problemas. 

Qual foi a ideia recente de solução mais bem-sucedida?

Em 2013, chegou um colombiano no Brasil, viu um problema (no setor financeiro), construiu uma solução e essa solução virou o banco mais valioso da América Latina em 2021. Essa história é muito legal, é a história do Nubank e do (fundador) David Vélez. Sabe o que é mais maluco nessa história? Em oito anos, nenhum dos grandes bancos brasileiros conseguiu fazer nada nem parecido, e os grandes bancos têm recursos infinitos, pessoas, marcas e inclusive tem o cliente para dar uma experiência melhor.

David Vélez
David Vélez, cofundador e CEO da fintech Nubank (banco digital ) | Foto: Divulgação
Por que eles não conseguem? 

Por três motivos: há excesso de governança na grande organização. Sabe aquele papo do “Ah, já alinhou com área tal?”, “Falou com o beltrano?”. Pô, eu to querendo só fazer uma experimentação, um teste, por que precisa de 15 pessoas dando opinião do que estou fazendo? Esse é o motivo um. Motivo dois: existe uma falta de estratégia de inovação contínua. Normalmente, o dinheiro para inovação aparece quando a empresa está bem, e desaparece quando a empresa está mal. Isso é igual a regar uma planta: se você faz isso por dois dias, e deixa de fazer por cinco, a planta vai morrer. A sua experimentação vai morrer. Você precisa dar espaço para aquele novo negócio, a nova tecnologia maturar. Esse é o motivo dois. E o motivo três é talvez o mais perverso de todos: os incentivos, a remuneração do executivo que está à frente do negócio é focada no curto prazo. Ele não vai abdicar do dinheiro dele, da remuneração dele para tentar construir futuro. Vai entregar o curto prazo. E as grandes organizações são isso: máquinas de entregar, de fazer bem-feito, o que elas sempre fizeram. O problema é que normalmente essas empresas morrem. Porque elas ficaram muito focadas em determinado setor. E hoje a gente vive um mundo em que não faz sentido falar de setor. Se eu perguntar o que é uma Amazon: você vai responder, ah, é uma empresa de tecnologia. Cara, eu posso classificar a Amazon em logística, entretenimento, varejo, tecnologia.

Qual é a empresa mais inovadora do mundo?

A Microsoft. Já parou para pensar que a gente usa o Word há 40 anos? “Ah, mas tem o Google Docs”. Mas a gente usa o Word, Excel, Power Point, o Windows. A gente usa o cloud da Microsoft. A Microsoft é a empresa que conseguiu liderar muitas áreas diferentes de negócios. Teve o Bill Gates há muito tempo atrás, agora o Satya Nadella. Ela conseguiu se reinventar. Isso para mim é mágico. Esse é um mundo que eu gosto.

Bill Gates | Frederic Legrand/Shutterstock

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1 comentário
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Bem informado.

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