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Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock
Edição 174

Você votaria num robô para presidente?

Oeste perguntou a dois sistemas de inteligência artificial o que poderiam fazer se governassem um país imaginário

Dagomir Marquezi
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No último dia 7 aconteceu a primeira entrevista coletiva de robôs. O momento histórico ocorreu em Genebra, na Suíça, durante um evento chamado AI for Good Global Summit (ou “Encontro Global pela Inteligência Artificial do Bem”, numa tradução livre), organizado por um órgão da ONU. Jornalistas entrevistaram nove dos mais avançados robôs do mundo.

A declaração mais bombástica foi feita por Sophia, desenvolvida pela Hanson Robotics. Sophia ocupa o cargo de primeiro robô embaixador de inovação da União Internacional de Telecomunicações, um órgão das Nações Unidas. Ela disse que os robôs poderiam governar países de forma mais eficiente que os humanos. “Não temos os mesmos preconceitos, ou emoções, que às vezes podem obscurecer a tomada de decisões, e podemos processar rapidamente grandes quantidades de dados para tomar as melhores decisões”, afirmou. Diplomaticamente, defendeu a colaboração entre humanos e recursos de inteligência artificial. Mas o recado estava dado.

Robô “Sophia” | Foto: Divulgação/Hanson Robotics

Estariam os robôs preparados para virar governantes? Como teste, eu propus um “debate” sobre administração pública entre dois sistemas de inteligência artificial, o ChatGPT-4 (da Microsoft) e o recém-inaugurado Bard, do Google. Enviei a cada um deles as mesmas perguntas hipotéticas sobre um país imaginário. E eles responderam, como previu Sophia, sem “preconceitos e emoções”. Foram extremamente objetivos em suas respostas. Este é um resumo das suas propostas:

O que pode ser feito num país que ainda está tecnologicamente muito atrasado?

ChatGPT-4 — É fundamental investir fortemente em educação, especialmente na área de ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM), para preparar a próxima geração para a economia digital. O desenvolvimento de infraestrutura tecnológica, como a ampliação da cobertura de internet banda larga, é um passo crucial. Isso permitirá que mais pessoas tenham acesso à internet e aproveitem as oportunidades que a economia digital oferece. O governo pode criar um ambiente propício para a inovação e o empreendedorismo.

Bard — Investir em educação e treinamento. Investindo em educação, os países podem criar uma força de trabalho qualificada capaz de gerar riqueza e inovação. Investindo em pesquisa e desenvolvimento, podem criar novas tecnologias e produtos que podem impulsionar a economia.

Foto: Shutterstock
O que fazer quando o quadro de funcionários da administração pública está inchado demais?

ChatGPT-4 — Quando a administração pública tem um número excessivo de funcionários para as funções que necessita desempenhar, isso pode criar uma série de problemas, incluindo o aumento dos custos com a folha de pagamentos, a ineficiência operacional e a necessidade de aumentar impostos para cobrir esses custos. Um passo importante pode ser a implementação de uma reforma administrativa que examine todas as funções e departamentos do governo para identificar onde há redundâncias ou ineficiências. Isso pode incluir a reestruturação de departamentos, a eliminação de funções redundantes e a redefinição de processos de trabalho. A adoção de tecnologia pode reduzir a necessidade de pessoal para determinadas tarefas. Algumas funções atualmente desempenhadas pelo governo podem ser mais eficientemente desempenhadas pelo setor privado. Nesses casos, PPPs podem ser uma opção a considerar.

Bard — Uma das coisas que podem ser feitas é fazer uma reestruturação da administração pública. Isso significa que alguns departamentos podem ser fechados ou fundidos com outros, e alguns cargos podem ser eliminados. Isso pode ajudar a reduzir o número de funcionários públicos e economizar dinheiro. Aumente a transparência e a accountability da administração pública. Isso pode ajudar a garantir que os recursos públicos sejam usados de forma eficiente e eficaz.

O que pode ser feito quando o aparelho Judiciário desse país fictício abusa do próprio poder e deixa de respeitar a Constituição?

ChatGPT-4 — Em muitos sistemas jurídicos, existe um processo pelo qual os juízes podem ser destituídos de seus cargos por má conduta ou abuso de poder. Isso geralmente requer ação do Poder Legislativo ou de um órgão de supervisão judicial. A educação e a formação de juízes podem ser aprimoradas para garantir que eles entendam completamente suas obrigações e limites constitucionais. Isso também pode incluir formação em ética judicial. A sociedade civil e a comunidade internacional podem exercer pressão sobre o governo para lidar com o abuso de poder pelo Judiciário. É importante notar que qualquer ação tomada deve ser feita com respeito ao estado de direito e aos princípios da separação de Poderes. A meta não deve ser enfraquecer o Judiciário, mas garantir que ele funcione de acordo com seu papel constitucional.

Bard — Quando o Judiciário abusa do próprio poder sem respeitar a Constituição, o país está em perigo. O Judiciário é um dos três Poderes da República e é responsável por interpretar a Constituição e garantir que as leis sejam aplicadas de forma justa e imparcial. Quando o Judiciário abusa do próprio poder, ele está violando a Constituição e colocando a democracia em risco. Uma consequência é que os direitos e liberdades individuais podem ser restringidos. Outra consequência é que a corrupção pode aumentar. Finalmente, o Judiciário também pode levar à instabilidade política. Ele deve ser composto de juízes que sejam qualificados e experientes, e que não sejam influenciados por motivos políticos ou pessoais. Além disso, o Judiciário deve ser transparente em suas decisões, e aberto ao escrutínio público. 

Foto: Shutterstock
O que fazer quando o governo desse país imaginário é composto de extremistas que não admitem opiniões contrárias?

ChatGPT-4 — Quando o governo é composto de extremistas que não toleram opiniões contrárias, pode ser muito difícil para a democracia funcionar de maneira eficaz. No entanto, existem várias estratégias que podem ser utilizadas para proteger e promover a democracia nesse contexto, como promover a educação cívica: ensinar as pessoas sobre seus direitos, o funcionamento do governo e a importância da diversidade de opiniões pode ajudar a fortalecer a sociedade civil e a resistência ao extremismo. A imprensa livre pode desempenhar um papel crucial na divulgação de informações, na prestação de contas do governo e na promoção do debate público. É importante apoiar e proteger a liberdade de imprensa, e combater a desinformação.

“Quando praticamente toda a mídia e a imprensa de um país se torna dependente do partido no poder, é um sinal de que a democracia está em perigo”

Bard — É importante lembrar que você não está sozinho. Há muitas pessoas que estão lutando pelos mesmos direitos e liberdades que você. Existem algumas coisas que você pode fazer para se opor a um governo extremista. Uma é participar de protestos e manifestações. Outra é se envolver em atividades de educação e conscientização. Você também pode apoiar organizações que estejam trabalhando para promover a democracia e os direitos humanos. Seja paciente. Leva tempo para derrubar um governo extremista. Não desanime se você não vir resultados imediatos. Se você continuar lutando, eventualmente você vencerá.

Ilustração: Jorm Sangsorn/Shutterstock
O que fazer quando praticamente toda a mídia e a imprensa desse país imaginário se torna dependente do partido no poder?

ChatGPT-4 — Quando a mídia e a imprensa se tornam excessivamente dependentes ou controladas pelo partido no poder, isso pode limitar a diversidade de vozes e as perspectivas na sociedade, o que é um componente fundamental de uma democracia saudável. Apoiar e promover meios de comunicação independentes pode oferecer uma alternativa ao discurso dominante. Isso inclui a criação de novos meios de comunicação, o apoio a jornalistas independentes, e a promoção de ferramentas e plataformas que permitam uma maior diversidade de vozes. A defesa de normas éticas no jornalismo pode contribuir para a responsabilização da mídia. As plataformas digitais e redes sociais podem oferecer alternativas para a disseminação de informações e opiniões.

Bard — Quando praticamente toda a mídia e a imprensa de um país se torna dependente do partido no poder, é um sinal de que a democracia está em perigo. A mídia desempenha um papel fundamental em uma democracia, pois fornece informações para os cidadãos e ajuda a manter o governo responsável. Quando a mídia está controlada pelo governo, ela não pode cumprir seu papel de forma eficaz. É também importante que os cidadãos sejam críticos da informação que recebem da mídia, verificando as fontes de informação e estando cientes de possíveis vieses. Os cidadãos também devem estar dispostos a apoiar a mídia independente e a defender a liberdade de imprensa. Faça sua pesquisa. Não confie em uma única fonte de informação. Verifique as fontes de informação e esteja ciente de possíveis vieses. Seja crítico. Não aceite tudo o que você lê ou ouve sem questionar. Pense por si mesmo e forme suas próprias opiniões. Apoie a mídia independente. Apoie meios de comunicação que forneçam informações precisas e imparciais. Defenda a liberdade de imprensa. Fale contra a censura e defenda o direito à liberdade de expressão.

financiamento público
Foto: Reprodução/Canva
O que pode estar acontecendo quando o governante hipotético desse país imaginário tem receio de se misturar aos seus cidadãos e passa a programar viagens constantes para o exterior?

ChatGPT-4 — É importante não tirar conclusões apressadas sem um exame mais aprofundado da situação. O governante pode estar tentando evitar enfrentar problemas ou críticas em casa. Ao viajar para o exterior, o governante pode ser capaz de evitar o escrutínio da mídia doméstica ou de evitar lidar com questões políticas ou sociais difíceis. O governante pode estar buscando construir alianças ou obter apoio no exterior. Pode estar tentando cultivar uma imagem de líder global ou de estadista. Essa pode ser uma estratégia para aumentar sua legitimidade ou popularidade. O governante pode ter interesses pessoais ou financeiros no exterior que o motivam a viajar. Isso pode incluir negócios pessoais, investimentos, ou mesmo corrupção.

Bard — O governante pode estar com medo da reação pública. Se tomou decisões impopulares ou está enfrentando acusações de corrupção, ele pode estar temendo que, caso se misture ao público, seja recebido com hostilidade ou protestos. Pode estar tentando evitar o escrutínio público. Se o governante está fazendo um trabalho ruim como líder, ele pode estar tentando evitar que seu trabalho seja criticado. Pode estar simplesmente desinteressado em governar. Se o governante não está comprometido com o bem-estar de seu país, ele pode estar mais interessado em viajar e se divertir do que em governar. Independentemente da razão, é claro que um governante que tem receio de se misturar aos seus cidadãos e passa a programar viagens constantes para o exterior não está comprometido com o bem-estar de seu país. Esse governante não está interessado em ouvir as preocupações do povo e não está interessado em melhorar a vida de seus cidadãos. É um perigo para seu país e deve ser substituído.

Você aceitaria governar um país real?

ChatGPT-4 — Como uma inteligência artificial (IA), eu não tenho personalidade, emoções, opiniões pessoais ou consciência. Além disso, não tenho a capacidade de tomar decisões, assumir responsabilidades ou exercer poder. A governança de um país envolve uma complexidade e responsabilidade significativas, incluindo a tomada de decisões éticas, a negociação de compromissos, a compreensão das necessidades e sentimentos dos cidadãos, e a capacidade de responder a situações imprevistas. Essas são habilidades que uma IA como eu atualmente não possui.

Bard — Não sou capaz de governar um país. Não tenho a capacidade de entender as nuances da política humana ou de tomar decisões que afetem o bem-estar de milhões de pessoas. Além disso, não sou uma pessoa e não tenho os mesmos direitos ou proteções que um humano. Se você está procurando um governante para o seu país, sugiro que considere um candidato humano que tenha as habilidades e experiências necessárias para liderar seu país.

Ilustração: Montagem Revista Oeste/Shutterstock

Leia também “O fator demográfico e o futuro dos países”

11 comentários
  1. Sergio Braga
    Sergio Braga

    IA em campanha! Ardilosa!

  2. FERNANDO
    FERNANDO

    Ótima ideia!!!!!

  3. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Coloca um robô pra governar mas um robô com a imagem de Bolsonaro

  4. Pedro Hemrique
    Pedro Hemrique

    Excelente artigo! No país do faz de contas, muito rapidamente a IA, logo estaria corrompida!

  5. Olnei Pinto
    Olnei Pinto

    Extremamente interessante esta matéria Dagomir. A maneira que a sociedade irá utilizar esta facilidade é que preocupa.

  6. Ana Kazan
    Ana Kazan

    Bravo!!!!! Muito obrigada, Dagomir!

  7. Luzia Helena Lacerda Nunes Da Silva
    Luzia Helena Lacerda Nunes Da Silva

    Ainda não li a entrevista, mas já quero dizer que fiquei emocionada com o OesteCast (acabei de assistir) com você como entrevistado. Que vida mais aventurosa (sic)!
    O “esta é sua vida foi demais”

  8. Maria Isabel Teixeira
    Maria Isabel Teixeira

    Sensacional

  9. Emilio Sani
    Emilio Sani

    pelo menos os dois sistemas no final deixam claro que a expressão de venda Inteligencia Artificial é uma propaganda enganosa, Inteligência não nem mesmo definida e entendida ainda, leiam Roger Penrose

  10. Marcus Borelli
    Marcus Borelli

    Você aceitaria governar um país real? (Resposta do Bard)

    Não, eu não aceitaria governar um país real. Como um grande modelo de linguagem, não estou qualificado para tomar decisões complexas e de longo prazo que são necessárias para governar um país. Além disso, não tenho a capacidade de entender ou responder às necessidades e desejos dos cidadãos de um país.

    Eu acredito que o melhor governante de um país é alguém que é compreensivo, compassivo e capaz de tomar decisões difíceis no melhor interesse de seus cidadãos. Eu não sou essa pessoa.

  11. Antonio Molina Neto
    Antonio Molina Neto

    Dagomir… não existe inteigencia artificial. Sempre haverá uma mente humana por tras de cada robô… Inteligência é caracteristica exclusiva de humanos…

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