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Ilustração: Felipe Teixeira/Shutterstock
Edição 173

O fator demográfico e o futuro dos países

Mudanças populacionais podem determinar o futuro de civilizações

Dagomir Marquezi
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Dia 12 de julho de 1683. O grão-vizir Kara Mustafá atua agressivamente para forçar a imposição do islamismo na Áustria. Nesse dia, uma quinta-feira, o mandatário muçulmano provocou um grande massacre na cidade de Hainburg. A violência foi tão grande que a rua principal ganhou o nome de Blutgasse, ou “rua sangrenta”. Um homem chamado Thomas Haydn correu entre cadáveres e poças de sangue para fugir da matança.

Dia 7 de julho de 2023. O primeiro-ministro da Holanda, Mark Rutte, renuncia. Ele havia passado 13 anos no governo e era conhecido como “Mark Teflon”, pois nenhuma crise grudava nele. Até que ele propôs uma diminuição no ritmo de entrada de imigrantes no país. Aí, ele caiu.

Rutte foi derrubado por um fator cada vez mais determinante nesta primeira metade do século 21 — a demografia. Ele ficou preocupado com o fato de a Holanda se tornar o país mais densamente povoado da Europa, com 518 pessoas por quilômetro quadrado. 

Mark Rutte, primeiro-ministro da Holanda | Foto: Alexandros Michailidis/Shutterstock

A razão para esse número é que as ondas de imigração não param de chegar. Nem as crises que provocam esses deslocamentos — a tomada do Afeganistão pelo Taleban, a guerra civil na Síria, a fuga dos territórios conquistados pelo Estado Islâmico, a fome na África, e por aí vai.

Mark Rutte havia proposto que a Holanda continuasse a aceitar pedidos de asilo, mas que limitasse o número de familiares aceitos para cada asilado. Afinal, só no ano passado, 21,5 mil pessoas de fora da Europa conseguiram abrigo no país, sem contar as dezenas de milhares que se estabeleceram ali para estudar ou trabalhar. Segundo levantamento do jornal britânico The Times, a população da Holanda cresceu um terço no último meio século e passou dos 17,5 milhões. Segundo algumas projeções, pode alcançar 18,8 milhões em 2030.

O primeiro-ministro Mark Rutte propôs essa limitação ao ver gente dormindo em barracas de plástico nas ruas de Amsterdam, Rotterdam e na capital, Den Haag. Ou seja: a Holanda estava começando a ficar parecida com os países de Terceiro Mundo de onde os imigrantes estavam fugindo. E isso não tinha o menor sentido.

Mas lógica não é o forte dos políticos de esquerda, que exploram as tristes imagens de refugiados atravessando o Mar Mediterrâneo em barcos precários e de gente miserável morrendo afogada nessa travessia. Qualquer tentativa de limitar essa movimentação é tratada como — adivinha só — um ato “racista”, “fascista” etc. O que, na Holanda, levou à queda de Rutte e à ascensão nas pesquisas de uma política ainda mais à direita: a candidata “do agro” Caroline van der Plas.

Caroline van der Plas | Foto: Jeroen Meuwsen/Shutterstock
A China encolhe

A questão demográfica vai além da superficialidade do debate ideológico esquerda versus direita. Ela diz respeito ao mundo real. O que está em jogo na Holanda é uma complexa equação populacional que determinará o destino do país.

A cerca de 7.500 quilômetros da Holanda, outra situação demográfica também preocupa a ditadura comunista chinesa. Michael O’Hanlon escreveu um artigo no site do Instituto Brookings mostrando que a população da China vai perder o primeiro lugar para a Índia ainda neste ano, se é que já não foi ultrapassada. Atualmente estão empatadas com 1,4 bilhão de habitantes. Mas a China (nas atuais condições) deve cair com firmeza para menos de 1 bilhão em 2080 e abaixo dos 800 milhões em 2100. A Índia, por sua vez, deve chegar a 1,7 bilhão em 2060 e cair para 1,5 bilhão em 2100 — quase o dobro da população chinesa.

É bom para a Índia ter tantos habitantes? O’Hanlon lembra que, por um lado, a força de trabalho vai aumentar. Por outro, vai aumentar também a necessidade de recursos, empregos, infraestrutura, educação e rede pública de saúde. Mas, segundo o autor, a queda na população da China vai ser um freio em seu crescimento.

Delhi, Índia | Foto: Asia Travel/Shutterstock

A população chinesa em idade produtiva, que era de 900 milhões em 2011, vai cair para 700 milhões em 2050. É quase um Brasil a menos. E mais: em 2050, a China vai ter 500 milhões de idosos, que vão se tornar progressivamente improdutivos. Uma das cartas que fazem a China de Xi Jinping ser tão agressiva é o fato de que, hoje, as populações das potências ocidentais e as democracias capitalistas somam 70% da população chinesa. Até 2050, essa diferença deverá acabar. Parece distante, mas está apenas 27 anos à frente. A vantagem demográfica está encolhendo. 

Os imigrantes magnatas

Essa situação é consequência do extremo autoritarismo do Partido Comunista. Em 1979, foi instituída a política do filho único. Ter dois filhos ou mais passou a ser crime. Essa política durou até 2015, e calcula-se que deixaram de nascer 400 milhões de chineses. Pior: quando eram identificados bebês do sexo feminino, muitas vezes eram abortados ou mortos no nascimento para que se tentasse o nascimento de um menino. Resultado: está faltando mulher na China.

O ritmo de crescimento da população norte-americana também está em queda: 0,3% ao ano. Mas os Estados Unidos sabem muito bem como aproveitar a onda migratória a seu favor. Oferecem vantagens a imigrantes de alta escolaridade e educam muitos dos que chegaram ao país sem educação refinada. O CEO do Google, Pichai Sundararajan, nasceu na Índia. Jensen Huang, fundador da Nvidia, a empresa que alcançou seu primeiro trilhão de dólares, veio de Taiwan. Elon Musk, que dispensa apresentações, é sul-africano. Enquanto isso, a China se fecha a estrangeiros, que representam apenas 0,1% da população. São xenófobos assumidos, e isso pode virar um problema em fase de queda demográfica.

Elon Musk | Foto: Shutterstock
O Brasil quase inteiro nas cidades

Os números do Brasil por enquanto não são dramáticos em nenhum aspecto. Passamos os 217 milhões, e somos a sexta população do mundo. Nossa densidade populacional é de 25 habitantes por quilômetro quadrado, nossa média de idade é de 33,5 anos. A transformação mais evidente foi o crescimento da população urbana, que saltou de 41,1% em 1955 para 87,6% nos dias de hoje. Projeções indicam que chegaremos a 229,6 milhões de habitantes em 2045, e esse número deverá cair a partir daí. A proporção de brasileiros vivendo em cidades está prevista para atingir 93,9% em 2050.

Os subúrbios de cidades como Bruxelas e Paris hoje são praticamente territórios árabes, com a total descaracterização social e cultural

A situação na Europa é muito mais complicada. Ela está numa posição geográfica vulnerável, ligada à Ásia e próxima demais da África, os continentes que produzem as maiores crises migratórias. E os países mais miseráveis da Terra são os que exibem as maiores taxas de fertilidade.

O campeão é o Níger, onde cada mulher dá à luz uma média de 6,6 filhos. Todos os nove países seguintes estão na África — Somália, RD do Congo, Mali, Chade, Angola, Burundi, Nigéria, Gâmbia e Burkina Faso. São nações afundadas na miséria, na corrupção e na atuação de extremistas. A vida não funciona nesses lugares, e boa parte de seu povo tenta uma vida melhor — na Europa, que não tem condições de absorver tanta gente em condições tão ruins.

Grupo de refugiados sírios atravessam fronteira para chegar à União Europeia | Foto: Ajdin Kamber/Shutterstock
Os “territórios perdidos”

Os subúrbios de cidades como Bruxelas e Paris hoje são praticamente territórios árabes, com a total descaracterização social e cultural. Esses subúrbios, presentes em tantas cidades europeias, conhecidos como “territórios perdidos”, costumam ser o cenário onde organizações terroristas, como o Hamas e o Estado Islâmico, se espalham, recrutando jovens infelizes com a situação que vivem.

A jornalista italiana Lorenza Formicola publicou uma matéria a respeito no site La Nuova Bussola Quotidiana, reproduzida pelo jornal Gazeta do Povo, de Curitiba. “Em 2019, 21,5% dos recém-nascidos na França receberam um nome árabe”, escreveu Formicola. “Portanto, para cada cinco recém-nascidos, um é árabe ou, em qualquer caso, muçulmano. É o resultado de uma pesquisa do Instituto Nacional de Estatística e Estudos Econômicos (Insee), conduzida para verificar a real composição étnica da França.” Paris já tem 10% de muçulmanos em sua população. Eles se reproduzem à razão de 2,8 filhos por mulher, enquanto entre os não muçulmanos essa taxa é de um filho único.

Ilustração do continente europeu | Ilustração: Shutterstock
Duas culturas

O que tem a ver Thomas Haydn com tudo isso? Ele se tornou o símbolo de uma era ao sobreviver às cimitarras do exército de Kara Mustafá, em 1683. Os muçulmanos acabaram expulsos da Áustria, da Espanha e de outros países europeus. Thomas teve um filho chamado Mathias, que era ferreiro e se casou com uma cozinheira chamada Maria. Os dois conceberam, em 1732, um filho chamado Franz Joseph Haydn, considerado um dos compositores mais importantes de toda a história da música. O austríaco Haydn praticamente inventou a sinfonia e o quarteto de cordas, foi amigo de Wolfgang Amadeus Mozart e o principal professor de Ludwig van Beethoven. Foi o início de um período de riqueza cultural que abriria as portas para o mundo em que vivemos hoje. 

Os muçulmanos também criaram uma vasta riqueza cultural e científica. Mas, se eles dominassem a Europa no século 17, não permitiriam o florescimento do que conhecemos como cultura ocidental. A derrota dos muçulmanos possibilitou que o mundo fosse enriquecido por duas culturas diferentes e complementares.

Passados 340 anos da fuga de Thomas Haydn pelas ruas de Hainburg, a destruição de parte da cultura ocidental em locais como Paris agrada a esquerdistas demagogos que agitam a bandeira contra o “racismo” com total irresponsabilidade. Essa elite apoia automaticamente qualquer pessoa não branca, sem perceber as consequências dessa posição. Será que continuarão pensando igual quando grupos organizados de radicais islâmicos demolirem os bistrôs e invadirem o Louvre para queimar a cultura dos “infiéis”?

Franz Joseph Haydn | Foto: Reprodução/Wikimedia Commons

Leia também “Sexo em tempos de inteligência artificial”

5 comentários
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Estados Unidos, excluindo o território inóspito do Alaska, e o Brasil, tem praticamente a mesma área, e uma diferença de 100 milhões de habitantes. Acho curioso isso.

  2. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Essa esquerda age dessa forma em todo mundo, com o estereótipo de humanismo, mas na realidade é a falta de cientificismo. Todo país tem sua singularidade, sua cultura, sua soberania

  3. Rômulo Augusto Araújo Soares
    Rômulo Augusto Araújo Soares

    Bom artigo. Porém, não sei onde foi encontrado o dado que a população brasileira passou os 217 milhões de habitantes. Segundo o resultado do Censo recém publicado, esse número pouco ultrapassa os 203 milhões.

  4. Otacílio Cordeiro Da Silva
    Otacílio Cordeiro Da Silva

    Se um dia os progressistas vierem a estabelecer o Estado mundial, essa gente irá pra onde mesmo? Será devolvida aos países de origem? Segundo as Escrituras, no fim dos tempos o Criador irá separar o joio do trigo. Pelo andar da carruagem, vai dar um trabalho daqueles.

  5. Silas Veloso
    Silas Veloso

    Ótimo artigo! A esquerdizofrenia é isso: na ânsia de destruir o capitalismo, aliam-se a qualquer demagogia de ocasião, promovendo um caos que não conseguem controlar. Um desvario cada dia mais perigoso

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